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Conheça a Erin Brockovich do stalking

Depois de ser perseguida por cinco anos pelo mesmo cara que stalkeou Ivanka Trump, Lenora Claire quer mudar o jeito como os EUA lidam com stalkers.

Esta matéria foi originalmente publicada na VICE US .

Digamos que alguém te persegue nas redes sociais, mandando ameaças de morte, depois ameaças de estupro — e parece mesmo capaz de executá-las. Você procura a polícia, mas eles te dizem para deletar sua conta no Twitter e mudar a cor do seu cabelo.

É isso que tem acontecido nos últimos cinco anos com Lenora Claire, ex-curadora de arte e atualmente agente de casting em Los Angeles, que é stalkeada desde 2011 pelo mesmo cara que virou manchete ano passado por perseguir Ivanka Trump. Diferentemente de Ivanka, Claire não podia se dar ao luxo de contratar guarda-costas, e quando pediu ajuda às autoridades, ficou claro que ela precisava cuidar do assunto por conta própria. A saga, que ainda está se desenrolando, resultou na prisão de seu stalker pelo Serviço Secreto norte-americano, e gerou um diálogo sobre leis contra perseguição, incluindo a proposta de uma nova legislação de stalking que visa enfatizar o perigo da perseguição online e ameaças pela internet.

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Conheço Claire da internet há anos, e durante nossa entrevista, fiquei surpresa com quanto sabíamos uma sobre a outra sem nunca termos nos encontrado na vida real. "Vi que você participou daquele programa semana passada, como foi?" "Você ainda está doando suas roupas velhas?" "Aquele cara parou de te responder mesmo?" Esse é o poder das redes sociais: podemos conhecer as pessoas sem realmente conhecê-las. E com toda a fama, reconhecimento e atenção que vêm sendo uma presença constante online, mulheres como Claire e eu raramente consideram os perigos que isso pode trazer.

Em 2011, Claire apareceu na lista de "Melhores de LA" da LA Weekly pela formação de sua agora extinta galeria de arte, a pop tART. Um pouco depois que seu perfil apareceu na publicação, um homem usando roupa de astronauta apareceu na galeria. "Os curadores têm uma tolerância alta para as bobagens dos artistas, então eu disse 'tanto faz'. Ele parecia estranho, mas inofensivo", ela me disse.

Mas enquanto eles continuavam conversando dentro da galeria, Claire percebeu que tinha julgado mal o cara. "Ele me disse que eu lembrava a Jessica Rabbit e que achava que eu era um ser supremo", ela lembra. "Aí ele disse que pretendia me stalkear. Ele disse isso na minha cara."

O cara, nascido Justin Massler, tinha mudado seu nome legalmente para Cloud Starchaser vários anos antes. Ele era um astro dos esportes em Harvard até ser diagnosticado com esquizofrenia, e as manifestações da doença mudaram o curso de sua vida. Ele se convenceu de que era o Super-Homem, e expressou crenças de que mulheres como Ivanka Trump e Lenora Claire precisam ser sequestradas e estupradas para coletar seus poderes.

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A fascinação dele por Ivanka vem desde 2010. Ele ameaçou se matar se ela e o marido não falassem com ele, e ameaçou empregados da joalheria dela por não entregarem brincos que ele tinha comprado para ela. Depois desse último incidente, ele acabou preso por agentes do Serviço Secreto a alguns quarteirões da Trump Tower. Segundo Claire, atualmente ele está internado no Bellevue Psychiatric Center em Nova York, sem previsões sobre o que vai acontecer com ele no futuro.

Mais de 7,5 milhões de norte-americanos são vítimas de stalking, segundo o Stalking Resource Center, mas a maioria não tem os mesmos recursos que alguém como Ivanka Trump. Claire teve sorte, de certa maneira, em compartilhar o mesmo stalker que Ivanka, e que Cloud Starchaser estava sempre postando suas intenções e paradeiro em seu site. Mas quando Claire tentou trazer essas evidências para o Departamento de Polícia de Los Angeles, ela diz que não foi levada a sério. A primeira vez que procurou a polícia — depois de receber várias cartas e e-mails de Starchaser, dizendo que eles estavam apaixonados e deviam ficar juntos — ela diz que a reação do LAPD foi culpá-la. "Eles me disseram que eu devia mudar a cor do meu cabelo para não ser um alvo", lembra. "Eles também disseram que eu tinha que sair das redes sociais. Eles zombaram de mim e me culparam. Saí de lá morrendo de raiva." (O Departamento de Polícia de LA se recusou a comentar as informações desta matéria.)

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Dizer que a pessoa precisa sair das redes sociais hoje em dia é quase o mesmo que pedir para que ela deixe de existir. "O clima hoje é que as pessoas estão conseguindo mais atenção através de autopromoção nas redes sociais, mas a maioria está despreparada para o fato de que isso traz falsas ligações", me disse Claire. "Você posta o que está fazendo e com quem está, e é muito mais fácil te stalkearem."

Mesmo se o LAPD tivesse sido mais simpático com o caso de Claire, eles só podiam agir até certo ponto. As leis de stalking nos EUA estão lentamente se adaptando aos tempos modernos — perseguição através de e-mail e nas redes sociais, por exemplo, agora é crime em estados como a Califórnia —, mas o ato de stalkear em si ainda é um crime menor, e difícil de punir. Crimes de stalking geralmente são rotulados como delitos menores que ocorrem em conjunção com o ato de perseguir, como vandalismo e ameaças verbais em pessoa. O máximo que as vítimas de stalking podem fazer legalmente hoje é conseguir uma medida cautelar contra o stalker. Mas mesmo isso pode ser difícil. Quando tentou pedir uma medida cautelar contra Starchaser, Claire diz que foi informada que como ele não tinha um endereço físico, ele não poderia ser "intimado" e receber os documentos, tornando a medida cautelar pendente em vez de permanente. Segundo ela, só quando Starchaser foi preso em São Francisco por aparecer no escritório de uma ex-colega de escola, as autoridades oficialmente o intimaram. "E mesmo depois disso, a polícia o soltou", me disse Claire. "Imediatamente depois de receber minha medida cautelar, ele entrou em contato comigo."

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Então Claire resolveu cuidar de sua proteção sozinha. Ela aprendeu a conferir o endereço de IP sempre que ele mandava um e-mail, para descobrir se ele estava entrando em contato com ela da Califórnia ou outro estado. "Se ele estava na Califórnia, eu ficava em alerta máximo porque sentia que ele podia me encontrar. Se ele estava em outro estado, eu respirava mais aliviada naquele dia", ela me disse. "Essa se tornou minha rotina normal."

Agora, depois de cinco anos de ansiedade constante, Claire diz que é hora de reexaminarmos como lidamos com stalking nos EUA. Ela já apareceu no Crime Watch Daily falando sobre suas experiências e será o tema de um episódio do programa 48 Hours em breve. Ela também está trabalhando com o congressista da Califórnia Adam Schiff, desenvolvendo uma lei que visa enfatizar a ameaça do stalking na internet. Parte dessa nova proposta de lei, que já foi apresentada ao Departamento de Justiça, inclui criar um registro nacional para listar os nomes dos stalkers condenados, independentemente do estado onde forem julgados.

Além disso, Claire e Schiff querem mudar a lei para que seja possível entregar medidas cautelares por e-mail, além de exigir o uso de monitores de tornozelo para stalkers condenados postos em liberdade. Fora as ações no governo, ela também está começando uma organização sem fins lucrativos com a advogada da Califórnia Peggy Farrell, que vai proteger vítimas de stalking e fornecer ajuda legal apropriada para casos como o dela.

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Claire é a primeira a apontar que esse não é um trabalho glamouroso, mas se isso salvar alguém de cinco anos de ansiedade constante, vai valer a pena.

"Ninguém quer ser o rosto do stalking", disse Claire. "Mas temos sete milhões de norte-americanos sendo stalkeados e não fazemos merda nenhuma por eles. Quero mudar isso."

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Tradução: Marina Schnoor

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