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Os erros fundamentais de Jordan Peterson

Uma leitura crítica do controverso livro do professor de psicologia '12 Regras Para a Vida: Um Antídoto Para o Caos'.
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Jordan Peterson. Foto: (Carlos Osorio/Toronto Star via Getty Images).

Jordan Peterson com certeza está tendo um momento. De fato, sua ascensão de professor de psicologia da Universidade de Toronto para o comandante onipresente no YouTube das Guerras Culturais foi tão surpreendente que ficamos imaginando quanto tempo vai levar para uma universidade oferecer um curso de Estudos de Jordan Peterson.

Seu livro, 12 Regras Para a Vida: Um Antídoto Para o Caos – um manual de autoajuda promovendo responsabilidade individual como um jeito navegar pelas injustiças inerentes do mundo, ancorando seus argumentos em mitos e arquétipos religiosos e científicos (cuidadosamente selecionados) – vendeu mais de 300 mil cópias nos EUA, segundo o Publishers Weekly.

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“Estou chocado em um nível de análise”, ele diz sobre sua nova fama durante uma entrevista por Skype, do que parece ser uma sala excepcionalmente arrumada de sua casa em Toronto. “É muita coisa para considerar e tenho que ajustar minha identidade como consequência.”

Mas como Jordan Peterson aconteceu, e o que sua popularidade poderosa diz sobre nosso momento cultural? Há alguma substância em sua mensagem, de que se pudermos nos reconciliar como O Mundo Como Ele É e nos adaptar às suas regras inflexíveis, podemos nos livrar dos nossos ressentimentos e buscar nosso “caminho heroico” para uma existência que seria, se não feliz – porque isso é uma ilusão – mas significativa? Ou essa é só uma filosofia insossa de individualismo paradoxalmente baseada em se conformar com uma ideia, uma tentativa equivocada de conciliar a vocação questionadora da ciência com verdades supostamente eternas de fábulas religiosas?

Dois eventos foram os catalisadores principais na ascensão improvável de Peterson à fama. O primeiro é a oposição dele à Lei C-16 do Canadá – que acrescenta “identidade ou expressão de gênero” como uma área proibida de discriminação ao Ato Canadense de Direitos Humanos – e sua recusa em usar os pronomes pessoais escolhidos por pessoas trans. É “uma questão de discurso forçado”, ele diz, sintomático de políticas de identidade promovidas pelos “SJWs” [Guerreiros da Justiça Social] e “neomarxistas pós-modernos” que colocaram os departamentos de humanas e ciências sociais “corruptos” da academia norte-americana num mata-leão.

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Isso fez dele uma causa célebre, e horas de suas palestras ecléticas, espontâneas e evangélicas no YouTube logo foram devoradas por um público predominantemente jovem e masculino, sem rumo em meio a incertezas desencadeadas por uma nova era de politicamente correto e políticas sexuais em mutação. Em Peterson, eles encontraram amarras psicológicas familiares, atraídos pelo verniz de rigor científico que ele colocou sob sua defesa dos papéis de gênero tradicionais. “Não gostar de Peterson”, tuitou o teórico da conspiração do Infowars Paul Joseph Watson, “é como não gostar de chocolate ou da luz do sol. Humanamente impossível”.

Fora o fato que esses argumentos ressoaram naturalmente com essa geração de conservadores de Reddit, não é difícil entender as razões mais genéricas para o apelo de Peterson. Os tempos estão mudando mais rápido que nunca – geopoliticamente, tecnologicamente e microbialmente – e os humanos estão constantemente em busca de um guia entre a incerteza. Você pode chamar isso de estratégia Cambridge Analytica: semear confusão e ansiedade através de desinformação deliberada, e assistir as pessoas correrem para homens fortes ou gurus. Autoajuda vende, e tanto no reino político quanto psicológico, somos suscetíveis às respostas fáceis dos autoritários. Só 12 Regras Para a Vida? Ótimo!

Aí vem o segundo evento por trás da celebridade estratosférica de Peterson: a agora infame entrevista para o Channel 4 News com Cathy Newman, no dia do lançamento de seu livro no Reino Unido, a versão completa de meia hora tendo 7 milhões de visualizações no YouTube em um mês. Aqui, segundo a reação fanática de seus devotos, Peterson encarou o artifício liberal da desigualdade de salário entre os gêneros, o patriarcado e o direito de ofender com a verdade baseada em evidências. Segundos seus fãs, foi um caso de pensamento ilusório versus ciência.

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Uma coluna no Breitbart parece ter capturado bem o clima entre a multidão alt-right de que essa foi “uma vitória fundamental para as guerras culturais”.

Mas como o próprio Peterson se sente sobre estar na frente dessas guerras culturais?

“Se pudesse, eu preferia não estar falando de política”, ele me diz. “Eu preferia continuar fazendo o que fazia antes da Lei C-16 surgir. Mas quando o processo legislativo se transforma, como no Canadá, quando os legisladores saem do seu domínio próprio de operação, isso não é bom. Então entrei no reino político, e o problema disso é que esse é um reino divisivo. Tentei contrabalancear isso com a ênfase em responsabilidade individual. Espero que essa rede de consequências seja mais boa que prejudicial.”

Claro, é mais que uma certa falsidade de Peterson dizer que está relutante em participar das políticas culturais; afinal de contas, é precisamente isso que anima sua vendetta cada vez mais obsessiva contra as “seitas de doutrinação” da academia “totalitária” de esquerda.

Além disso, por todas as afirmações de Peterson de que a política foi imposta a ele, ele com certeza carrega essa cruz com muita disposição. Seu feed no Twitter promove continuamente suas visões de dark money – think-tanks financiadas e alimentadas por lobistas – como a Human Progress de Charles Koch – que dissemina a noção deliberadamente enganosa de “riqueza absoluta”, essencialmente uma cortina de fumaça para justificar desigualdade de riqueza relativa: desde que as pessoas ainda tenham o proverbial lugar para caírem mortas, elas não devem reclamar de seu poder de compra encolhendo ou de quantos jatinhos alguém tem.

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Quando menciono para Peterson que a classe média britânica está cada vez mais dependente de bancos de alimentos, ele explica, com um ar despreocupado, que isso não é resultado de políticas deliberadas motivadas por ideologia – austeridade como um disfarce para a massiva transferência sem precedentes de riquezas para o 1%, digamos – mas sugere, meio sem vontade, que “a ascensão da classe média chinesa e indiana foi alcançada às custas da mobilidade ascendente das classes trabalhadoras ocidentais”, como se isso fosse um grande bolo de soma zero. E de fato, sempre que Peterson se aproxima de reconhecer a validade de noções progressistas básicas como redistribuição de renda ou igualdade de oportunidades – “Não sou contra a esquerda”, ele protesta, “Sou contra a esquerda radical” – ele imediatamente se esconde atrás do mantra: “Mas não sabemos quão fundo o problema vai”.

“Sim”, a lógica continua, “sabemos que há um incêndio – mas não sabemos como o fogo começou, então não devemos tentar apagá-lo”.

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Foto: Rene Johnston/Toronto Star via Getty Images

E também é assim com o próprio livro de Peterson, com suas regras banais focadas em “responsabilidade individual”. O livro é – Peterson admite livremente – uma receita para conformismo político, como se tudo que precisássemos saber sobre organizar nossas sociedades estivesse ali nas normas e códigos entregues pelo nosso passado compartilhado.

Em 12 Regras, ele conta que seu grande insight – que o indivíduo está no centro da filosofia ocidental – veio a ele num sonho (como muitas das ideias de seu herói intelectual, Carl Jung) onde ele estava suspenso sob a redoma de uma catedral, o centro de uma cruz arquitetônica, que “me colocava no centro do Ser em si e não havia como fugir. Levei meses para entender o que isso significava… [O] centro é ocupado pelo indivíduo. O centro é marcado por uma cruz, assim como um X marca o lugar. Existência na cruz é sofrimento e transformação – e esse fato, acima de tudo, precisa ser aceito voluntariamente”.

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Pode ser difícil enquadrar essa imagem de “Peterson, o curandeiro do bem” com subcapítulos que começam em “a compaixão é um vício”, mas não há dúvida que o próprio Peterson está totalmente convencido de sua missão. Portanto, o tom incansavelmente sério e pretensioso de 12 Regras Para a Vida começa a parecer o discurso pré-assassinato de Samuel L. Jackson em Pulp Fiction. Todo momento desperto nesse psicodrama de Caos e Ordem – onde o “jeito certo do Ser” é harmonizar os dois – se torna um passo potencialmente decisivo e hipersignificante, ou seja, varrer as folhas do quintal dissipa o caos; um cômodo bagunçado anuncia a angústia espiritual. É exaustivo. Depois de ler algumas dezenas de páginas do livro, você sente como se tivesse encontrado o caminho para a beirada de um prédio muito alto e agora estivessem te pedindo para descer.

Mas o principal problema com o livro não é que as regras são inúteis, banais ou vagas ao ponto de serem insignificantes (veja a Regra 3: “Faça amizade com pessoas que querem o melhor para você”). Nem que partes dele são politicamente incapacitantes – insistindo, como na Regra 6, que você “Arrume sua casa na ordem perfeita antes de criticar o mundo” (tradução: crianças não devem questionar o mundo, o que provavelmente não deve ter caído bem para os sobreviventes do atentado de Parkland e seu desejo polêmico de não serem massacrados em sala de aula por armas de classe militar).

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Não, o verdadeiro problema é como o livro usa a ciência para fins políticos mas não admite; como ele deturpa grotescamente os oponentes intelectuais de Peterson; e que o livro exige uma ginástica filosófica e lógica absurda para tornar seu ponto de vista supostamente científico compatível com suas visões religiosas (ele nunca disse abertamente se acredita em Deus, afirmando apenas que “Ajo como se acreditasse”), que ele contorna parcialmente com a afirmação que “a verdade científica é diferente da verdade religiosa” (precisamente o argumento do livro A Condição Pós-Moderna do filósofo neomarxista Jean-François Loyotard, por mais irônico que pareça).

Pegue o capítulo de abertura (“Fique em pé com os ombros retos”), onde ele se baseia na neuroquímica de lagostas e no comportamento social dos chimpanzés para fazer inferências sobre nosso comportamento humano sociocultural, argumentando que somos inevitavelmente programados para monitorar nosso status na “hierarquia de dominância” (um termo que ele adapta para “hierarquia de competência” para criaturas mais complexas que crustáceos).

“A questão fundamental com o primeiro capítulo”, me diz Peterson, “é que eu queria defender o caso de que você não pode colocar as estruturas hierárquicas aos pés do reino sociopolítico”.

Mas usar a coincidência da serotonina como a suposta base para os paralelos comportamentais entre lagostas e humanos – que ele trompeteou durante sua entrevista no Channel 4, novamente para dar a impressão de autoridade científica – já foi desmantelada pelo biólogo PZ Myers. Evidentemente incomodado com Peterson exagerando seu conhecimento intelectual, Myers afirma que Peterson “construiu um caso sob fatos falsos e distorções de observações gerais da literatura científica. Ele não demonstrou nada sobre construções socioculturais. Não só ele entendeu as evidências errado, ele não consegue construir nenhum tipo de argumento lógico…”

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Pior ainda, argumenta Myers, há um motivo ideológico para tudo isso: “Peterson está distorcendo a evidência para se encaixar numa agenda… É horrível o grau em que esse homem está afirmando absurdos com uma confiança tão presunçosa. Esse homem está mentindo pra você”.

E assim temos a Regra 8: “Diga a verdade – ou, pelo menos, não minta”.

Você nunca é tão ideológico como quando acredita que não está sendo ideológico, e portanto, quando Peterson escreve, no começo de um subcapítulo intitulado “A Natureza da Natureza”, que “é um truísmo da biologia que a evolução é conservadora”, ele está apresentando – para fins inteiramente ideológicos – um fato óbvio sobre a marcha lenta da evolução como uma verdade incontestável de como nossas sociedades funcionam, apesar de todos os detalhes salientes que tornam esse paralelo impraticável. Por um lado: animais não têm uma linguagem para mitigar o uso da força (ou seja, para contrariar a “hierarquia de dominância”). Mais importante, criaturas num ecossistema operam “cegamente”, movidas por instinto e sem um entendimento das ramificações globais de suas ações. Não é a mesma coisa com humanos pelo menos desde que colocamos satélites em órbita.

Além disso, Peterson sabe que a noção do “design mais apropriado” não é absoluto: a evolução não é linear, e algo que antes era ideal (armaduras pesadas, digamos, numa corrida armamentista com predadores ganhando presas ainda mais afiadas), pode se tornar não tão ideal (quando a armadura te deixa incapaz de escapar de outro predador). Então, aplicando esse insight para o ambiente sociopolítico, que podemos em princípio fazer mudanças globais, sistêmicas, de cima para baixo (leis de impostos, digamos) “que já existiram antes”, pode não ser mais benéfico para nós como espécie. Elas podem não ser mais modelos inquestionáveis para nossas vidas.

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Portanto, apesar do desprezo conhecido de Peterson pelos “SJWs”, pergunto a ele se – dentro de tal enquadramento evolucionário – socialismo e feminismo podem ser considerados respostas adaptativas para nossa conscientização de realidades sistêmicas como aquecimento global ou a insustentabilidade do modelo irracional do capitalismo do crescimento pelo crescimento (e o tipo de masculinidade competitiva e viciada em risco que o abastece). Ele concorda brevemente, antes de retroceder: “Não feminismo, mas o feminino”. E aí: “Mas o problema é muito mais profundo do que as pessoas pensam, e muitas das soluções geram mais problemas que soluções”. Em outras palavras: o capitalismo deveria ser considerado “natural” – porque é assim que somos. (Peterson considera a ideia do capitalismo como responsável pelas desigualdades estando “pelo menos cem anos desatualizada”, apesar de Stephen Hawking aparentemente não ter recebido esse memorando quando ele rodou pela comunidade científica.)

Tudo isso o é suficiente para fazer vários dos “neomarxistas pós-modernos” repreendidos por Peterson por não serem científicos levantarem uma sobrancelha cética. “Não se confunda”, Peterson tuitou, não totalmente hiperbólico, “o objetivo da esquerda radical é a destruição da própria ideia de competência” (ao que a resposta óbvia é: der, Trump?) Peterson deturpa tanto – e intencionalmente – seus adversários intelectuais que ele consegue tuitar, apenas parcialmente sarcástico, que “a ciência é uma construção social, lembra? É por isso que aviões voam”.

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Se fosse apenas o caso de isca de cliques do YouTube ou polêmicas para podcasts conservadores isso até seria perdoável, mas as mesmas deturpações e falsificações deliberadas aparecem nas palestras de Peterson. Esta por exemplo, que começa com um ad homiem hiperbólico descrevendo Foucault como um “desajustado vingativo”, acrescentando: “uma figura tão repreensível que seria difícil descobrir, ou mesmo sonhar”. Muito, muito moderado.

Pergunto se, não obstante seu envolvimento até o pescoço nas guerras culturais, se ele sente qualquer obrigação moral de retratar essas figuras para seus estudantes de maneira mais fiel. Ele menciona a inevitável “simplificação excessiva” envolvida em lidar com “essa bagunça de identidade política. A questão é: como você rastreia seu desenvolvimento? Então você diz, um tanto casualmente: vamos atribuir isso ao marxismo, primeiramente, e depois à união do marxismo com o tipo de pós-modernismo proposto por Derrida e Foucault. Tipo: Jesus, você está resumindo um problema inacreditavelmente complicado em 15 segundos. E a nuance vai se perder. O problema é que há um problema com políticas de identidade, e realmente acredito que esse é um problema terrivelmente divisivo”.

O clipe termina com Peterson oferecendo uma visão de caricatura do “neomarxismo pós-moderno” de que “a única razão para o Ocidente funcionar é porque ele estuprou o resto da humanidade e o planeta”, que ele segue com um silêncio pouco característico e revelador, antes de acrescentar, novamente de maneira reveladora, “quanto menos eu falar sobre isso melhor”. Talvez por isso 12 Regras Para a Vida não tenha um índex para capitalismo, ou por que a apresentação de Peterson das atrocidades históricas não aborda escravidão, sobre a qual o grande farol da riqueza e empreendimento americanos foi fundado. Um pecado de omissão, como ele poderia chamar.

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É de certa maneira curioso que a caricatura de Peterson da suposta rejeição da evidência científica por seus inimigos intelectuais é feita enquanto dando o centro do palco a Jung, um pensador cujas teorias totalmente desacreditadas e inteiramente não-científicas de arquétipos universais derivavam de sonhos pessoais e “pesquisa” fabricada. E de fato, para Pankaj Mishra no New York Review of Books, a invocação de tais argumentos pseudocientíficos coloca Peterson ao lado de outros “empreendedores intelectuais” na linha do “misticismo fascista” (essa crítica não caiu bem). Depois de tanto criticar os pós-modernistas por abandonar o Iluminismo, ele é uma figura profundamente anti-Iluminismo.

E no final, esse – não o drama eterno do Caos e da Ordem – é o conflito que o trabalho de Peterson não pode resolver: por um lado, o psicólogo é atraído para explicações científicas (aparentemente) racionais; por outro, ele promove mitos arquetípicos como “objetivamente verdade” no sentido de guias de como devemos agir, para nossas “estruturas de significado”. É como se sua própria busca heroica estivesse vasculhando por esses textos, e agora ele se sente obrigado a encaixar tudo em seus enquadramentos esotéricos e supersticiosos.

“Tudo que estou dizendo e pensando sobre religião é aninhado dentro de um ponto de vista evolutivo”, Peterson disse, provavelmente ciente de que a visão da psicologia evolutiva padrão para religião e crenças supersticiosas é que, para nossos ancestrais, encarando um universo esmagadoramente complexo e aterrorizante, atribuir agência causal a deuses ou espíritos antropomorfizados que podiam ser apaziguados (através de sacrifício, obediência e tudo mais) aliviava a ansiedade. Quanto a nós modernos e nossos homens fortes ou gurus de autoajuda, meias verdades toscas são funcionalmente vantajosas e melhores que incerteza crônica. A busca por significado – um dos “instintos fundamentais”, como ele retrata – não prova a existência de Deus; Deus é o resultado da busca por significado (ou seja, a necessidade de ter um sentido prático do mundo). E é uma necessidade relativamente primitiva. De maneira similar, nossos ancestrais retratarem o mundo como um drama de Ordem e Caos não significa que é assim que ele realmente é. Significa que essa era a melhor aposta deles, considerando a falta de entendimento científico dos processos materiais.

Bom, a solução para as dificuldades da vida não é mudar o mundo – jogue o jogo, não mude as regras! – mas os indivíduos “perseguirem o que é significativo (não o que é conveniente)”, segundo a Regra 7 de Peterson. E por “significativo”, ele quer dizer dentro da hierarquia coletiva de valores sustentando nossa ordem, que são “tribo, religião, coração, lar e país. É a sala quente e segura onde a lareira brilha e as crianças brinca. É a bandeira da nação. É o valor da moeda… É a gradeza da tradição, as fileiras de carteiras numa classe, o trem que sai na hora… Ordem é Deus, o Pai, o juiz eterno, o guarda-livros e distribuidor de recompensas e punições. Ordem é o exército dos tempos de paz de policiais e soldados. É a cultura política, o ambiente corporativo, o sistema. É o 'eles' em 'você sabe o que eles dizem'”.

Se tornem indivíduos, Peterson diz aos seus seguidores, mas de um jeito que não desafie essa ordem simbólica. É uma ideia de individualismo não muito distante do que o capitalismo de consumo sempre tenta nos vender. Pense diferente, diz a Apple.

Uma filosofia de responsabilidade pessoal é uma coisa, mas insistindo repetidamente que nosso destino como um indivíduo é principalmente uma questão de escolhas de vida melhores e se encaixar – ou seja, insistindo no mito do self-made man – Peterson não só subestima a importância de políticas e economias cruciais na formação das nossas vidas, mas também nega a maleabilidade dessa realidade: “É assim mesmo, então lide com isso”.

E ainda assim, enquanto 12 Regras despolitiza com uma mão, as ações dele dizem outra coisa.

“Entrar no domínio político é arriscar contribuir com a polarização e desestabilização”, reflete Peterson. “Mas se abster disso é arriscar as consequências do silêncio e inação. Então escolhi o primeiro risco. E com certeza é um risco. E tento ser o mais razoável possível sobre isso. E sem dúvida eu poderia ter sido mais razoável. Continuo tentando aprender a ser mais razoável. E tenho pessoas no meu círculo imediato assistindo o que estou fazendo o tempo todo e criticando o que estou fazendo intensivamente. Incluindo minha família. E estou prestando atenção no feedback e ouvindo quando dou minhas palestras. E estou tentando ser o mais razoável possível. Agora, isso não significa que posso estar me saindo tão bem nisso quanto seria esperado – com certeza.”

@reverse_sweeper

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