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Tecnologia

Como Produtos de Limpeza Enganam Seu Cérebro para que Você Queira Bebê-los

Embalar coisas que podem nos matar com a aparência de um suco de fruta não é uma boa ideia.
Crédito: Flickr/Brian Johnson & Dane Kantner

Não importa o quão esperto você ache que é: tomar um gole de detergente de limão achando que é limonada deixará seu cérebro mais tranquilo – isso é, se não te matar primeiro.

A estupidez de nossos cérebros facilmente enganados é uma espécie de grande equalizador, mas também muito perigoso quando se trata de produtos que imitam alimentos (há inclusive uma sigla, FIP, para isso: Food Imitating Products) – coisas como produtos de limpeza cujas embalagens foram feitas de forma a dar a ideia de que eles contêm algo que não irá te matar caso você os ingira. E olha, tem uma galera morrendo por isso.

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Em 2006, uma pesquisa do Centro de Controle de Venenos do Texas acusou o Fabuloso, um produto à base de sulfonato de sódio dodecilbenzeno, de estar envolvido em uma série de ingestões acidentais. Em 2011, a Comissão Europeia trouxe à tona casos de riscos infantis associados à ingestão de FIPs em um relatório sobre segurança do consumidor.

De acordo com novas pesquisas conduzidas pelo Centro de Ciência da Saúde da Universidade do Texas em San Antonio, a causa destes acidentes é neurológica por natureza. Nossos cérebros interpretam estes objetos como "metáforas visuais" para a comida, estimulando regiões associadas com o processamento visual de alimentos.

O estímulo visual no experimento com ressonância magnética (a) Gel para banho Happy Shower Tequilsa Sunrise (b) Suco de frutas Joker (c) Alvejante Visior (d) Alvejante comum. Crédito: PLOS One

Apesar de os FIPs serem bem conhecidos pelas agências reguladoras – o sistema de alerta rápido para produtos não alimentícios da União Europeia, RAPEX, tem avisado à população sobre coisas como um óleo para banho que meio que se parece e tem gosto de cerveja desde 2001 – os fatores ambientais e neurológicos que se colidem naquele momento de confusão antes de você se envenenar acidentalmente seguem desconhecidos.

Em sua pesquisa, publicada ontem na PLOS One, os pesquisadores descreveram como analisaram 30 mil ligações ao Centro de Controle de Venenos de Marselha, na França, durante um período de 14 meses, para descobrir que comportamentos levavam as pessoas a ingerirem certos produtos. Dos milhares de registros investigados, apenas 44 foram escolhidos porque o produto ingerido era um material higiênico, identificável pela marca, e ingerido em casa, por um adulto saudável.

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De acordo com os resultados obtidos, foram ingeridos mais líquidos que sólidos, e quem ligava geralmente citava a embalagem, rótulos e outros aspectos visuais dos produtos como fatores de confusão.

Porém, apesar de a maioria sugeria que a aparência destes produtos levou à ingestão dos mesmos, os pesquisadores notaram que fatores altamente subjetivos poderiam estar influenciando estas pessoas. Para descobrir exatamente o que acontecia nestes casos, em termos neurológicos, alguns exames foram feitos.

Estímulo no córtex órbito-frontal e insular em resposta à identificação visual de dois diferentes PIAs. Crédito: PLOS One

Os pesquisadores conduziram exames de ressonância em pacientes enquanto observavam diversos objetos não alimentícios, inclusive alguns que em nada lembravam comida, como um vasilhame padrão de alvejante. Outros eram mais sorrateiros, como a do Cottage Happy Shower Tequila Sunrise, um gel para banho que parece com algo cheio de açúcar que um adolescente tomaria antes de sair andando de skate por aí ou um drink que meu tio esquisitão faria depois de tomar umas e outras. O objeto de controle era uma caixinha de suco comum.

Os objetos foram apresentados em rápida sucessão pelos pesquisadores, que pediam aos pacientes para determinarem se era ou não o mesmo produto de antes. Nenhum dos participantes cometeu erros neste teste, ao menos não verbalmente. Mas as ressonâncias contavam outra história.

De acordo com os responsáveis pela pesquisa, por mais que os participantes não tenham errado ao identificar sucos e géis, ambos os objetos estimularam seu córtex insular, o giro fusiforme, e o córtex órbito-frontal – todas regiões do cérebro que já foram associadas anteriormente como importantes na identificação visual de alimentos.

Há uma lição a ser aprendida aqui. Por mais que os pacientes não tenham sido enganados pelos produtos de limpeza que pareciam comida, em algum ponto, seus cérebros foram.

De acordo com os pesquisadores, isto serve de ímpeto para mais pesquisas no caso de ingestão de FIPs por adultos saudáveis.

Também pode ser um indicador de que embalar paradas que podem te matar como se fossem suco não é uma ideia das mais brilhantes, já que nossos cérebros são meio burros.

Tradução: Thiago "Índio" Silva