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'Far Cry 5' precisa confrontar o passado de violência e ganância de Montana

A Ubisoft tem uma ótima oportunidade de usar o estado norte-americano tanto como uma alegoria quanto um playground.
Imagem: Ubisoft/Reprodução

Esta matéria foi originalmente publicada no Waypoint.

Atenção: Contém spoilers de Far Cry 2 e 3.

Com o estado norte-americano de Montana como pano de fundo, o inédito Far Cry 5 dá aos seus criadores da Ubisoft a oportunidade de contar uma história que difere da obsessão da série com riquezas e colecionar objetos só para aumentar o status do protagonista, ou apenas para mudar os rumos da narrativa, pro bem ou pro mal.

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Até agora, o jogo que mais se destaca na série é Far Cry 2, de 2008, em que o jogador encarna um mercenário, completando missões por dinheiro – e quanto mais se enrique, pior fica a situação em torno do personagem. Cada recompensa, uma tragédia. A ações do jogador perpetuam uma guerra civil – até o ponto em que, em uma treta por conta de diamantes, o personagem mata seu melhor amigo.

Far Cry 3 trouxe ainda mais armas (que não travavam, o que é importante), mais habilidades, mas que se tornam inúteis, uma vez que o personagem – depois de juntar milhares de dólares e capturar um monte de terras – é consumido pelo seu próprio poder, mais uma vez matando seus amigos próximos em um dos finais opcionais do jogo. Já o personagem mais materialista de Far Cry 4, um cara doido que vive em um palácio, também é o principal antagonista do game.

A série parece criticar o acumulo de riquezas e aquisições, sugerindo que ter posses e um desejo irrefreável de auto-enaltecimento, correm a alma. Mas, ao mesmo tempo, coletar itens, terminar missões, criar equipamentos e acumular poderes é algo intrínseco à experiência Far Cry.

Montana pode servir como uma alegoria natural e geográfica no quinto jogo da série principal de Far Cry.

De várias maneiras, a força-motriz desses jogos é Acumular Coisas. E é por isso que os games sofrem com uma contradição – que é diferente de ter uma ambiguidade – porque eles criticam a moral dos personagens malvados, enquanto permite que o jogador façam exatamente a mesma coisa que os vilões.

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Mas Far Cry 5, por acontecer em Montana, tem a chance de ser bem mais coerente. Aquelas terras foram palco da corrida do ouro e da expansão da costa oeste dos EUA, e o estado vizinho ao Canadá representa, historicamente falando, tanto o apetite pelo acumulo de riquezas quanto os efeitos desse sentimento – que é exatamente o que a série Far Cry vem tentando criticar convincentemente.

Depois que foi descoberto ouro em Grasshopper Creek em 1862, a Trilha de Montana foi criada e várias pessoas migraram pro estado e região. Juntando a busca pelo enriquecimento com seus efeitos desumanizantes, os mineradores de ouro inevitavelmente entraram em conflito com a tribo Shoshoni. O Massacre do Rio Urso, no Território de Washington, terminou com a morte de quase 250 nativos norte-americanos. Uma história que vai da descoberta à destruição – um assunto que a série Far Cry aborda há quase uma década.

Talvez você se lembre de Ghost Recon: Wildlands e seu retrato efêmero da América do Sul, e conclua que a Ubisoft não se interessa por respeitar a complexidade de qualquer lugar ou época.

Mas existem outros exemplos bons, como Watch Dogs 2, que se passa em São Francisco, feito pela mesma publisher, e que conseguiu com sucesso abordar privilégios sociais e os problemas da cultura do Vale do Silício. Esse jogo tinha uma representação mais fiel da realidade e da história recente. Ou seja, existe um precedente na história do estúdio em que eles acertaram os elementos de um jogo de mundo aberto, mesmo que tenha sido criado em volta de assuntos gerais o suficiente para não serem ofensivos.

Se a crítica de acumulo e ganho material pareceu sem sentido nos games da série até então, não há dúvidas que Montana pode servir como uma alegoria natural e geográfica pro quinto jogo da série principal de Far Cry. Se mais uma vez encorajar alegremente o jogador a, mais uma vez, Acumular Coisas, o game passará uma impressão de ignorar a história da região que está tentando retratar e que funciona perfeitamente como uma metáfora para o momento histórico atual.

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