Fazia pouco tempo que o José Henrique tinha voltado do trabalho, em um escritório de design de games, quando toquei a campainha de seu apartamento, uma quitinete na região central de São Paulo. Ele abriu timidamente a porta; um homem de pele clara e cabelo escuro ondulado, ainda de camisa, sapatos e com óculos de armação redonda que ressaltava os grandes olhos negros. Até ali, nada fora do comum para um filho de militar que, após morar em diversos lugares por conta da profissão do pai, decidiu fincar raízes na maior metrópole do país. A razão da minha visita, no entanto, era sobre suas noites de sexta-feira. Em uma ocasião como essa, o José costuma se distrair dentro de casa e, quando a madrugada se aproxima, ele troca a timidez e as roupas do dia a dia por vestes coloridas, muita maquiagem e trejeitos carregados de glamour. "É raríssimo encontrar uma drag queen de dia. Somos um povo da noite", ele disse, prestes a se transformar na Amanda Sparks, uma das personagens mais icônicas da cena LGBTT de São Paulo. A partir daquele momento, fiquei em silêncio, enquanto aquele demorado e cuidadoso ritual de metamorfose terminaria por nos levar onde só ela, a Amanda, saberia chegar.
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Inicialmente, as fotos que fiz eram apenas para ilustrar uma entrevista concedida pelo meu anfitrião que, nas horas vagas, desenvolve games onde os heróis são drag queens lutando contra os poderes políticos e religiosos. O que eu não contava era com o que aconteceu depois que a Amanda estava incorporada e o lugar onde ela me levou. Meses depois, revisitando o material que sobrou daquela noite, percebi que elas dariam neste ensaio. Chega junto:
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