Demi Lovato quer provar que canta muito

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Demi Lovato quer provar que canta muito

Depois de uma indicação ao Grammy e o fim de um relacionamento, a compositora volta com novo disco que pode ajudar a firmar seu lugar entre as melhores vocalistas do pop.

Matéria originalmente publicada no Noisey US.

Quando Demi Lovato encerrou a turnê de seu disco Confident, de 2015, ela já estava de saco cheio de cantar pop. Em termos de carreira, porém, ela estava no auge. O disco, seus singles de sucesso "Confident" e "Cool for the Summer" renderam à Lovato sua primeira indicação ao Emmy por Melhor Disco Pop. Ainda assim, faltava algo. "Quando saí em turnê e só cantei músicas pop, simplesmente não era divertido pra mim", comentou Demi, de 25 anos. "Não tinha alma, eu não estava entrando no clima das músicas. Eu só fazia o que tinha que ser feito e quando a turnê chegou ao fim, pensei 'Quer saber? Quero compor coisas que possa me divertir cantando todas as noites'."

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Lovato está empoleirada em um sofá tomando chá, em uma sala de espera nouveau-barroca de um hotel de Manhattan. Três lustres de cristal estão dependurados sobre nossas cabeças. O cabelo de Demi preso em um rabo de cavalo alto. Ela usa um macacão xadrez preto e branco por cima de uma cropped preta; além disso, um blazer preto grande — de seu guarda-costas, que nos observa do outro lado da sala — está sob seus ombros. Suas pernas estão descruzadas e seus pés encostam no chão, ao lado de um par de saltos-agulha Jimmy Choo amarelos que acaba de chutar pra escanteio. Ela dobra suas mãos mais à frente e inclina-se. "Então, mesmo que meu último disco tenha dado muito certo — estou orgulhosa dele e amo todas as músicas ali", complementa rapidamente, "ele só não representa quem sou hoje e nem a artista que quero ser."

Em 2017, duas das maiores estrelas pop do mundo, Katy Perry e Taylor Swift, voltaram com novos discos, ambas lidando com esse lance de A Artista que Querem Ser — e porque essa artista ainda é relevante. Com Witness, Perry fez algo relativamente inusitado, se relançando como uma artista consciente politicamente — ou desconstruidona; já os singles de pegada EDM e hip-hop de Swift em seu vindouro Reputation parecem uma tentativa de fazer parecer que a menina de ouro do pop se rebelou. Em contraste, em Tell Me You Love Me (que sai nesta sexta, 29 de setembro, via Safehouse/Island Records), o objetivo de Lovato pouco tem a ver com sua imagem — em vez disso, ela busca provar-se como uma das mais ferozes vocalistas de sua geração.

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O primeiro single do disco e também sua faixa de abertura, "Sorry Not Sorry" dá o tom. Na pedrada de toques R&B, Lovato salta da confiança para a bravata: " Now I'm out here looking like revenge / Feeling like a ten / The best I ever been / And yeah, I know / How bad it must hurt to see me like this / But it gets worse". Com letras diretas assim, a artista precisa mesmo passar credibilidade ao cantá-las. Mas quando chega o refrão (especialmente o trecho " Baby, I'm sorry / I'm not sorry") Lovato manda um vibrato tão pauleira que é bem capaz que ela te convença de qualquer coisa. (Sua apresentação da música no VMA de 2017 talvez seja ainda mais eletrizante).

A própria Lovato sempre considerou "Sorry Not Sorry" uma escolha clara como single de Tell Me Youve Love Me — uma faixa que melhor representasse sua sonoridade atual, seu eu hoje. Mas em um primeiro momento, as pessoas mais próximas à Demi não concordavam. "Me diziam que 'Tell Me You Love Me' é um excelente primeiro single por ser emocional — vulnerável", disse a cantora. "E eu continuava esperando que alguém me falasse de 'Sorry Not Sorry' só pra que eu pudesse falar é isso aí", comenta, com um sorriso ao final.

O que os fez mudar de ideia? A insistência de Lovato junto do apoio de um dos chefões. "Mostrei as duas faixas pro Jay-Z", comenta, "E ele disse que 'Sorry Not Sorry' era a certa por ser mais leve. Ele disse algo como 'Muita gente te vê fazendo essa parada mais emotiva o tempo todo, mas ninguém te vê se divertindo' e eu disse 'É um bom argumento'. No final [a opinião dele] meio que convenceu as outras pessoas também."

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Há diversos momentos em Tell Me You Love Me em que Lovato parece estar se divertindo como nunca — e todos eles tem algo em comum: o produtor nascido em Istambul Warren "Oak" Felder, que também trabalhou com Kelly Clarkson, Kehlani e Khalid. "[Felder] foi uma pessoa com quem senti uma ligação e realmente me dei bem", disse Lovato. "Ele entendeu meu som de verdade". E ela está certa: assim como Taylor Swift encontrou sua alma gêmea no super-produtor sueco Max Martin, Lovato parece ter passado pelo mesmo com Felder. Os dois trabalharam juntos em cinco faixas - "Sorry Not Sorry", "Sexy Dirty Love", "Daddy Issues", "Only Forever", e "Games"— no geral, as mais fortes do álbum.

Cada uma destas canções é uma obra de pop cheio de alma, sensual: Lovato soa como se estivesse em chamas e sem amarras. Em "Sexy Dirty Love", faixa altamente dançável que remete aos sons disco e funk de outrora, ela não se furta em deixar claro do que espera de uma troca de mensagens na madrugada. " Lord knows I am sinning, please forgive me for my lust", canta no primeiro verso, " Sending pictures back and forth / Babe, I'm craving your touch". Já em "Daddy Issues" — uma das poucas referências à EDM do disco, marcada por sons de videogame — Lovato alerta um possível amante de seus pontos fracos românticos.

Certamente o outro lado de Lovato se faz presente em Tell Me You Love Me: aquele que consegue levar uma faixa lenta, introspectiva, com emoção e facilidade. E dessa vez, ela tinha bastante material pra isso: em 2016, a cantora se separou de seu namorado de quase seis anos, o ator Wilmer Valderrama.
"Sinto como se fosse uma pessoa completamente diferente [ao longo do ciclo deste disco]", comenta. "Passei por alguns fins de relacionamento e agora vivo só. Tenho 25 anos e estou solteira. Quando lancei Confident, estava em um relacionamento sério e não era independente com o sou hoje. E não era tão sincera, acho… Tinha medo de escrever canções sobre outras pessoas, porque não queria ofender ninguém". Ela faz uma pausa e então prossegue: "Quando se está num relacionamento, você não quer escrever sobre alguém com quem não esteja em um relacionamento com você — você não quer machucar os sentimentos daquela pessoa."

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Por mais que Lovato não dê detalhes, ela diz que duas faixas de Tell Me You Love Me — "Ruin the Friendship" e "Only Forever" — são sobre a mesma pessoa e esta pessoa não é Valderrama. Ambas falam sobre fazer da amizade algo mais, e sua conclusão em ambas é que sim, ela quer mesmo aquilo. Ao observarmos as letras, tudo indica que se trata de seu amigo de longa data (e co-fundador da Safehouse Records) Nick Jonas. "Ruin the Friendship" começa com um flerte de leve, " Put down your cigar and pick me up". Sabe-se que Jonas curte um charuto; há até mesmo um Tumblr dedicado a fotos dele fumando-os. Mas, cá estamos apenas palpitando — e como Freud já pode ter dito: "tem vezes que um charuto é só um charuto mesmo".

"Fiquei frustrada com uma situação em específico", diz Lovato. "E eu fiquei tipo 'Quer saber, vou escrever sobre isso aí'. E o fiz e mandei [as músicas] para a pessoa e foi" — ela pausa e escolhe as palavras cuidadosamente — " interessante. Sempre que você manda uma música sobre alguém para aquela pessoa — tem que ter coragem. É como se você gritasse 'Ei, aqui está o que sinto por você!'. A pessoa sabia do que eu sentia, mas nunca tínhamos falado sobre isso. E aí que ela tinha escrito sobre mim também, e acabamos trocando músicas". Quanto à reação recebida? "Ela disse 'Essa é uma música incrível' e eu disse 'É, se liga!'". Ela deixa as palavras no ar por um instante. "Ela teve suas razões, mas tudo bem."

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Lovato também tira um tempo em Tell Me You Love Me para refletir sobre sua relação em constante mutação consigo mesma. Após o single-balada "You Don't Do It for Me Anymore", ela diz, séria e sem interromper o contato visual — que a música é uma maneira de lembrar de sua batalha contra o vício. "Cantei com muita emoção porque a música me lembra da relação que tinha comigo mesma e com a qual não me identifico mais". Ela então reformula o que disse, de forma a deixar as coisas mais claras pra mim: "Como eu era antes simplesmente não funciona mais pra mim mesma."

Lovato passou grande parte de sua carreira falando de seus momentos mais difíceis em entrevistas. Aos 18 anos, a cantora — que ganhou fama ao estrear o filme Camp Rock, da Disney, junto dos Jonas Brothers — começou tratamento para lidar com a bulimia, automutilação, além de vício em álcool e drogas. Ela também foi diagnosticada com transtorno bipolar. Dali em diante, haviam dois caminhos à sua frente: lidar de forma aberta com seus problemas, ou não. E ela escolheu o primeiro. Sóbria há mais de cinco anos, Demi Lovato é defensora de diversas causas, desde conscientização quanto à doenças mentais até a luta por direitos iguais para a comunidade LGBT.

Assim sendo, uma certa autenticidade e abertura se tornaram parte de quem ela é — o que nos tempos filtrados em que vivemos, parece impossível para quase todo mundo, quanto mais uma celebridade como Lovato, que anda com um guarda-costas desde os 15 anos de idade, como a própria revelou. Mas ultimamente a cantora parece cansada de falar de sua vida pessoal. Neste mês, ela foi fotografada de mãos dadas com uma mulher na Disneyland e a mídia caiu matando em cima de sua sexualidade. A cantora, por sua vez, tuitou: "Se você quer saber mais sobre minha sexualidade, assista meu documentário. Não devo nada a ninguém."

O que Lovato acredita dever aos fãs é sua voz. E nesse sentido, Tell Me You Love Me, entrega o prometido. De qualquer forma, o fato é que Lovato sempre se expressou melhor pelo o quê e como canta. A balada piano "Skyscraper" (de Unbroken, lançado em 2011), um mergulho aos pontos mais baixos de sua vida, por exemplo, teve duas versões — uma pré e outra pós-tratamento — e ela preferiu lançar a primeira por acreditar que esta refletia seu estado emocional na época. A Demi Lovato de 2017 segue o mesmo esquema — só que agora ela tem 25 anos, está no ápice da voz e pronta para dominar o mundo pop.

Após terminamos nossa conversa, a maquiladora de Lovato faz um rápido retoque antes de batermos uma série de fotos. Radiante, ela me pergunta se tem folhas de chá nos dentes (não tinha). Ela calça seus Jimmy Choos, levanta — mesmo tendo 1,60 sem salto, sua presença é marcante — e então senta-se em uma poltrona que é quase um trono, olha bem pra câmera, cerra os olhos e sorri.

Avery Stone é jornalista em Nova York e está no Twitter.