Entro no vagão do metrô e dou uma breve olhada ao redor para saber quem está ali e se tem lugar para sentar, afinal a viagem será longa. Muitos olhares voltados aos celulares, outros para o nada e outros devolvem meu olhar preto curioso. Ao longo do caminho, percebo algumas pretas de cabeça baixa, cansaço, indiferença, não sei.É semana da Consciência Negra e as reflexões em torno sobre ser negro vêm à tona. Sigo andando pelas ruas do centro de São Paulo, entre as estações República, Sé e Luz do Metrô. Observando e deixando ser observada, conversei com algumas pretas e pretos, na tentativa de compreender a sutileza urbana do se olhar sem se conhecer.
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Pois, também sendo negra, sempre tive a curiosidade e a sensação de que, por algum motivo, ou vários, pessoas negras têm sentimentos em comum quando cruzam olhares com outras pretas e pretos. E em meio à correria e anonimato do dia a dia, se reconhecem.Logo na Praça da Sé, cruzei olhar com a jovem Gabrielle, que trabalha em uma bilheteria. Para ela, as pessoas negras compartilham de muitos sentimentos em comum; mas fala que receber elogios é algo que lhe faz muito bem. “Às vezes percebo uma outra preta passando, a gente se olha e sorri, isso é bem legal. Não é muito comum, mas quando acontece essa troca de olhar me sinto maravilhosa; a gente que é preto se identifica e se reconhece na hora. Mas não é sempre assim, tem gente que não está nem aí, sendo branca ou negra”.Caminhando na estação da República, sentada ao canto, troquei olhares com Mônica, de 16 anos. Ela me disse que se sente poderosa quando é olhada por outras pessoas pretas e acredita que há relação de cumplicidade nesses olhares. “Acho que há uma relação entre as pessoas negras que se olham, você se identifica com as outras pessoas negras. Parece que você consegue ler a mente dela, ela lê a sua e vocês percebem que têm uma relação mesmo estando distante ou sendo desconhecidos."Logo com alguns minutos de conversa, já estava sentada ao lado de Mônica e não à toa ela comentou que quando troca olhares com outras pessoas pretas logo sente vontade de conversar com elas. "Sinto que estamos juntos no mesmo grupo e que se um sofrer preconceito, sofreremos juntos", conta.
“Não é muito comum, mas quando acontece essa troca de olhar me sinto maravilhosa; a gente que é preto se identifica e se reconhece na hora” - Gabrielle, 20 anos
“Parece que você consegue ler a mente dela, ela lê a sua e vocês percebem que têm uma relação mesmo estando distante” - Mônica, 16 anos
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“Eu sento numa boa do lado de outra pessoa preta, mas muitas pessoas brancas não fazem o mesmo” - Kaique, 23 anos
“Sinto a cumplicidade muito mais de mulher preta para mulher preta, é quando ela entende que estamos na mesma conjuntura” - Laísa, 32 anos
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