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Censura e o futuro da internet segundo Yasmin Green

A desenvolvedora iraniana que trabalha em parceria com o Google explica por que o acesso à informação é um direito humano fundamental.
Imagem principal por Shaniqwa Jarvis.

Retrato por Shaniqwa Jarvis.

Entrevista originalmente publicada na edição impressa de junho da VICE US.

Dois terços da população do mundo não têm acesso à internet, e com o ambicioso plano de Mark Zuckerberg de conectar os cinco bilhões restantes ao Google, empresas privadas e governamentais estão trabalhando pesado para expandir o acesso à internet.

Mas simplesmente ter uma conexão de internet não é garantia de acesso à informação. Isso porque com a censura se espalhando por países repressores, a liberdade da internet está em declínio pelo quinto ano consecutivo em 2015, segundo um relatório da Freedom House. Como chefe de pesquisas e desenvolvedora da incubadora tecnológica Jigsaw, uma subsidiária da Alphabet, empresa parceira do Google, Yasmin Green cria produtos para ultrapassar essas barreiras. Falamos com ela sobre os problemas mais urgentes que enfrentamos para conectar o resto do mundo.

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VICE: O que a Jigsaw faz, e o que torna sua abordagem única?
Yasmin Green: Usamos a tecnologia para resolver problemas geopolíticos, mas o que há de especial na nossa abordagem é de onde tiramos inspiração: diretamente das pessoas que estão na linha de frente de conflitos e opressão. Todos os nossos produtos começam com uma viagem de campo para entender a experiência humana e o papel da tecnologia dentro dela.

Você pode falar um pouco sobre o uProxy?
É um dos projetos que estamos desenvolvendo como parte de nosso objetivo geral para acabar com a censura repressiva. É essencialmente um túnel construído através dos firewalls nacionais — as fronteiras invisíveis que os governos erguem — para que essas pessoas possam ter acesso à internet aberta. Há outros proxies por aí, mas o uProxy tem uma característica especial: é um projeto de código aberto, o que significa que qualquer pessoa no mundo pode contribuir com o código, e ele é ponto a ponto, o que significa que você ganha acesso à internet livre diretamente de alguém que conhece, como um amigo ou familiar, o que significa que ela é confiável. O uProxy é descentralizado, então não aparece em nenhum radar. É uma questão de dar acesso à internet aberta com apenas alguns cliques.

"Tiramos inspiração diretamente das pessoas que estão na linha de frente de conflitos e opressão."

Vocês têm alguma população específica em mente?
Queremos construir as ferramentas para realizar uma internet que não tenha fronteiras. Hoje são três bilhões de pessoas usando a internet, e os outros três bilhões não virão do mesmo ambiente — eles não vão estar em Palo Alto, na Califórnia, por exemplo. Essas pessoas estarão em lugares onde o conflito e a repressão são severas. Então nossa função é pensar como desenvolver produtos para que esses três bilhões restantes entrem na internet, porque a vida deles está escondida sob conflito e opressão no mundo físico, mas essas ameaças também se manifestam online. Na Jigsaw temos o privilégio de levar essas perspectivas únicas para o desenvolvimento de produtos.

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Ter vivido no Irã ajudou no seu trabalho?
Já vivi em alguns ambientes repressores, mas ser iraniana deu a esse trabalho um sentido intensamente pessoal, porque já vi o que um governo repressor pode fazer com as pessoas. E isso significa tudo. Essa repressão tem um impacto não só na capacidade de acessar informação, mas acessar cultura, se comunicar e mesmo na subsistência dos cidadãos — então é uma questão muito pessoal para mim.

"Acesso à informação é um direito humano fundamental, e todo mundo merece ter esse direito."

Como vocês identificam que regiões visar ou que conflitos priorizar?
Viajamos pelo mundo todo para entender o que está acontecendo em diferentes ambientes, mas a tecnologia não conhece fronteiras, então posso ajudar a desenvolver um produto para um usuário do Irã, e se esse produto for bom, ele vai rodar o mundo. Essa é uma das coisas gratificantes em desenvolver tecnologia: você pode vê-la se espalhar.

Onde a Jigsaw se encaixa nos esforços do Google para fechar a brecha digital?
Há muito trabalho em torno de dar acesso ao mundo desconectado. A pergunta que fazemos — que é igualmente importante — é o que acontece quando o acesso estiver lá. As pessoas estarão a salvo? Elas terão acesso a uma internet livre? Ou veremos o mundo offline repressor e perigoso se manifestar online também? Na Jigsaw atuamos numa função complementar, que é dar acesso livre e seguro à internet aberta.

Com mais pessoas se conectando, qual a grande mudança que você espera ver?
Acho que vamos ver mudanças profundas em como a internet é usada. Veremos todos esses desafios geopolíticos antigos, como terrorismo, misturados à tecnologia e ao uso da internet, e temos que garantir que nossa resposta a essas coisas incluam a internet; ela precisa estar tanto online como offline.

Qual o próximo grande desafio para a liberdade na internet?
Reconhecer que a internet é um direito humano básico. Acesso à informação é um direito humano fundamental, então todo mundo merece ter esse direito. E precisamos trazê-lo até as pessoas.

Tradução: Marina Schnoor

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