casal lésbico na cama
Foto por Cavan Images via Getty Images.
Sexo

Aprender a fazer sexo sóbria foi mais complicado que apenas 'estar presente'

Eu achava que o álcool me ajudava a me curtir e relaxar, até perceber que nunca tinha aprendido a fazer nenhuma das duas coisas.

Passei os últimos três anos no meu primeiro relacionamento longo com alguém que amo. Não vou ficar falando como tem sido ótimo – mas, às vezes, o sexo tem sido um desafio.

Sinto atração pela minha namorada. Gosto de sexo. Transei razoavelmente bastante antes do nosso relacionamento. Ainda assim, quando estávamos na cama juntas, eu estava sempre pensando demais, sofrendo pra relaxar e curtir o que estava acontecendo. Eu estava consciente demais de cada movimento que fazíamos, e estava tão focada nas mecânicas da coisa toda que parecia que não estava realmente me conectando. Um dia, enquanto eu pensava demais durante o sexo, me ocorreu que eu não conseguia me submeter ao prazer porque não estava intoxicada. Talvez eu não pudesse relaxar porque, antes desse relacionamento, eu não tinha feito muito sexo sóbria – na maioria das interações sexuais do passado, eu precisava beber mesmo só pra flertar.

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Quando cheguei na idade adulta, beber era parte integral da socialização. O álcool me libertava, me fazia espairecer, e me dava confiança para paquerar a pessoa em quem eu estava interessada. Beber era um precursor da intimidade física, mesmo eu não percebendo na época. Eu não pensava em nada antes de beber alguns dedos de uísque antes de introduzir alguns dedos, e não reconhecia que eu realmente precisava beber para curtir o sexo. Mesmo quando eu estava saindo consistentemente com uma pessoa, eu ia pro bar ou tomava algumas cervejas na casa dela antes de qualquer coisa acontecer.

Antes de começar a entender a fonte dos meus problemas sexuais, consultei algumas amigas heterossexuais sobre como facilitar o sexo. Elas me aconselharam a dividir uma garrafa de vinho com a parceira antes. Mas ela bebe muito pouco. E mesmo que eu beba, depender de um intoxicante para encorajar o sexo num relacionamento apaixonado de longo prazo não parecia a resposta holística para nossas questões de intimidade.

Além disso, muitas pessoas LGBTQ têm uma relação problemática com substâncias. Gays e lésbicas têm duas vezes mais chances de ter transtorno de uso de álcool e tabaco que heterossexuais, e bissexuais têm três vezes mais chance de ter transtorno de uso de uma substância.

Então, reconhecendo que eu dependia do álcool para evitar me sentir constrangida enquanto entrava no clima, decidi encarar meus medos diretamente e treinar ser mais presente. Fácil.

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Com uma meta tangível em mente (sexo melhor!) e um método prescrito para atingi-la (estar presente!), mergulhei em todas as coisas de atenção plena. Comecei a meditar, contemplar como eu sentia o prazer e como cultivá-lo, e me sintonizar com os pequenos prazeres físicos do cotidiano. Andrea Glik, terapeuta e educadora especializada em trauma e transtorno de estresse pós-traumático para pessoas queer e trans, disse que esse é um trabalho altamente relevante. Segundo Glik, prestar atenção em sensações físicas que trazem boas sensações, como um banho quente de banheira ou o gosto da comida na sua boca, pode levar a sexo melhor. “Quanto mais prestamos atenção, mais conseguimos notar quando nos sentimos bem”, ela disse. “As pessoas dizem 'Quero curar meu relacionamento com prazer, como desfruto do sexo?' E eu digo 'Bom, você curte estar no seu corpo fora do sexo?'”

A resposta foi se tornando cada vez mais “SIM”. Li Pleasure Activism: The Politics of Feeling Good de adrienne maree brown, uma antologia que ilumina as conexões entre prazer, cura e justiça social. Ouvi podcasts sobre somáticos, um campo de estudo e conjunto de práticas relacionadas com experimentar completamente o eu dentro do seu corpo. Fiz trabalho corporal – que pode tomar muitas formas, mas, nesse caso, era similar ao reiki – com a minha terapeuta. Ela também me encorajou a experimentar aulas de dança, e mesmo ainda não tendo experimentado (essas aulas são caríssimas em L.A.), dancei na minha sala, sem álcool e sem julgamento, e tive uma ótima experiência sexy.

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Eu estava muito orgulhosa do meu mergulho no prazer, meu sucesso em estar mais presente, com as sensações no meu corpo. Eu tinha certeza que estava Resolvendo o Problema Com o Sexo Sóbrio. Aí eu desassociei na cama. Era como se eu estivesse flutuando sobre a cena, vendo tudo mas não sentindo nada. (Acho que minha parceira não notou, porque meu corpo é excelente em manter as aparências.)

Para alguém com muitos sentimentos, posso ser muito fechada na hora de revelá-los. Seja sendo sarcástica ou voltando a questão para quem perguntou, faço qualquer coisa para não me mostrar. Álcool ajuda muito com isso, tanto em ser mais “aberta” como em me fechar do que estava acontecendo. Ele me permitia me arriscar. Eu podia atrair pessoas enquanto criava uma distância. Desse modo, eu mantinha o controle – e continuava sem ser vistas.

“Álcool e outras substâncias baixam as inibições”, diz a Dra. Christina Nelsen, CEO do San Francisco Intimacy and Sex Therapy Center. “Substâncias expandem nossa lista de 'sims' e entorpecem nosso desconforto. O problema é que isso impede intimidade real.”

Uma maneira como comecei a pensar sobre o papel do álcool no sexo, pelo menos pra mim, é que isso é como uma capa da invisibilidade cobrindo seu corpo nu. O álcool elimina algumas inibições e te dá uma sensação de liberdade (“Estou arrasando!”) enquanto te protege de ser vista (“Sou invisível!”). Ele também é como um escudo para quaisquer sensações ou sentimentos de conexão física e emocional – intimidade – que você pode experimentar se está realmente exposta. (“O vento está soprando meus cabelos? O sol está brilhando em parte tipicamente escondidas pelas sombras? Não sinto nada.”)

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Como Nelsen e Glik apontaram, não ter inibições não é um sintoma de intimidade. Intimidade real exige presença. E presença, quando você está nua com a pessoa que ama, requer vulnerabilidade. Todo o trabalho que eu estava fazendo com prazer levou a uma consciência maior do meu corpo e menos constrangimento durante o sexo. Mas mecanismos de defesa são astutos. A sensação de estar fora do corpo não era só uma resposta a me sentir conscientes demais sem substâncias, mas ativamente dissuadir a proximidade – evitando ser vista. Desassociando, meu cérebro adaptativo muito inteligente entrou na história para criar distância e me proteger de ser vulnerável, do mesmo jeito que o álcool fazia no passado durante meus encontros mais casuais.

Eu nunca tinha experimentado intimidade real dentro do contexto de um relacionamento estável com uma parceira com que eu me importava profundamente, e isso me assustava pacas. “Duas pessoas se apaixonam. Há um laço acontecendo. Agora você tem algo a perder”, disse Nelsen. “É muito assustador… se revelar, especialmente para alguém que você quer muito ter na sua vida e não quer perder. Ficar nua metafórica e literalmente. Ser vista. E se você for abandonada, criticada, rejeitada ou ignorada?”

Trabalhar intimidade no quarto exige muito trabalho fora dele. Uma coisa é ficar mais confortável literalmente se desnudando com a pessoa que amo. Mas para fazer sexo bom sem álcool – me permitir sentir sexy, conectada, vista – eu tinha que confrontar a questão: “E se eu for abandonada, criticada, rejeitada ou ignorada?”.

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Essa questão tem guiado os últimos anos da minha vida. Na terapia, em conversas com amigos e em dolorosas reflexões depois de crises de desespero, desenterrei algumas das crenças-chave, padrões de pensamento e hábitos que desenvolvi. Me abri para meus medos negligenciados, minha vergonha, meu valor próprio – coisas profundas e aterrorizantes que emergiam, inesperadamente, em momentos de vulnerabilidade – tudo o que moldou e interferiu minha abordagem para intimidade, seu eu saber.

Teve vezes na cama que minha namorada olhou nos meus olhos e tive que desviar o olhar. Ela estava perto demais. Mas quando fiquei consciente de que estava me segurando por medo de abandono e rejeição, comecei a me arriscar mais dentro do relacionamento. Expressei necessidades que geralmente reprimia. Comecei a aceitar ajuda sem questionar. Agi como se ela sempre fosse estar ali, independente do que acontecesse, como ela sempre disse que estaria. E ela está. Durante alguns meses, me tornar vulnerável foi de angustiante para desconfortável para… não tão ruim assim. No espaço antes ocupado por ansiedade, senti uma parceria e segurança que nunca experimentei antes.

Me abrir emocionalmente, e abraçar a sensação de segurança que minha namorada me dava, levou a uma abertura maior para o sexo e intimidade física também – sem qualquer intervenção química (ou desassociação). Descobrimos uma nova facilidade entre nós. Claro, intimidade sempre será uma conversa em andamento, e inevitavelmente outras coisas vão entrar no caminho, das duas partes. Mas há uma liberdade em descobrir e manifestar o que seu corpo é capaz de fazer sozinho, sem intoxicantes – e assim, se abrir para uma pessoa te ver mais completamente.

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