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relatos

O que você fazia com o troco do pão?

Jovens adultos de hoje contam o que faziam com aquelas moedinhas que sobravam da padaria ou do mercado.
Imagem: Arquivo pessoal/Lucas Veloso (da esquerda)

Fim de tarde e aquelas filas lotadas do caixa rápido do supermercado que só pode passar até 10 volumes mas todo mundo carrega a compra do mês no carrinho. Você era só uma criança, e claro, as prateleiras lotadas de doces eram feitas especialmente pra você. É sempre uma tentação. Até quando você é um jovem adulto e está preso naquele limbo de espera diabético e repleto de lindas composições de gordura trans, se pega repensando no que fazer com uns trocados.

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Eu, você e todo mundo que foi criança já passou por isso. E a galera de menor está vivendo nesse lance agora. A fase do administrador mirim é algo que todos deviam viver para ter, pelo menos, uma simples noção de economia. Afinal, isso ajuda bastante na fase +18, em que depender da sua mãe já não é tão legal assim.

Pensando nisso, recolhemos alguns relatos de quem guardava aquele dinheiro precioso ( vindo do patrocinador mais amado para realizar singelos sonhos) que sobrava depois de ir à padaria ou ao mercadinho. Sonhos que poderiam ser uma bicicleta, um geladinho, cards do RBD ou até 15 dias de geladinho Ki-suco de uva ilimitado pra você e seus amigos.

"Tava mais caro do que quando a senhora viu"

Pra começar, sempre que minha mãe pedia pra eu ir na padaria ou no mercado comprar alguma coisa, eu torcia, por dentro, pra que ela desse mais grana do que realmente ia gastar, pois assim eu podia ficar com a gorjeta. Mas acontece que a gente era muito pobre, e isso não mudou, então, na maioria das vezes era o dinheiro certo pra comprar certa coisa, que provavelmente tava numa promoção mesmo. Tinham uns dias que o universo conspirava a favor, e sobrava uma grana, que eu nunca trazia de volta pra casa, porque comprava algum doce no mercado mesmo ou guardava pras próximas idas à mercearia.

Em casa, quando minha mãe perguntava, a desculpa era quase sempre a famosa: "tava mais caro do que quando a senhora viu". Não sei se ela caía ou tinha certeza absoluta que tava mentindo. Outro plano que eu tinha era o de sempre guardar o dinheiro e juntar pra comprar alguma coisa que quisesse, tipo sorvete. Mas nunca rolou, de qualquer forma.

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Hoje o jogo virou. Quando ela precisa de grana, eu dou a mais e quando ela vem devolver o troco, coloco minha voz num tom mais grave e digo "pode ficar com o troco, mãe". E assim a gente segue o baile. - Lucas Veloso, 23

100 reais só em geladinho de Ki-suco de uva

Eu sempre soube que a gente não tinha muito dinheiro. Sempre ouvi meus pais conversando sobre como fariam para pagar o aluguel. Por isso, quando sobrava alguns trocados das compras que me pediam para fazer no mercadinho, eu devolvia para eles. Nunca parei para pensar sobre o destino desse dinheiro — eu só sabia que era pouco, mas que seria necessário para pagar as contas que eles precisavam pagar. Acabei descobrindo meses depois que eles guardaram as moedinhas em um cofrinho de lata. Abrimos no final do ano. No cofrinho devia ter quase uns R$ 100 em moedas. Lembro de ter achado um máximo! Eu nunca tinha visto tanto dinheiro junto. Mas o mais incrível aconteceu depois: meu pai me falou que aquele dinheiro todo era meu, que ele e minha mãe guardaram para eu poder gastar na nossa viagem de final de ano para a Bahia, que é de onde nós somos.

Passei a viagem de ônibus (que dura 24h) só pensando em mil possibilidades de compra com aquela fortuna. Cheguei na Bahia, em Palmas de Monte Alto, reuni toda uma galerinha e passei os 15 dias da viagem comprando geladinho de Ki-suco de uva para todos. Sim, eu gastei os quase R$ 100 só em geladinho de Ki-suco de uva, que na época não custava mais que R$ 0,20.

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Foi tanto geladinho, mas tanto geladinho, que voltei para São Paulo vomitando roxo pela janela do ônibus. - Paula Rodrigues, 25

Pururuca e afta

Na minha época o pastel era 50 centavos, então eu usava o troco pra comprar pastel depois da aula. Ou comprava salgadinho de amendoim (aquelas bolinhas brancas). A doceria vendia salgadinho por quilo, então eu chegava e falava: "moço, quero R$ 0,50 desse!" E ele pesava pra dar o valor que eu tinha.

Uma época era pururuca (eu amava pururuca), mas comecei a ter afta, aí troquei pelas bolinhas brancas. Também comprava docinho de amendoim, babaloo ou pirulito de coração.

Essa doceria existe até hoje no Jardim Maria Sampaio, no Campo Limpo, em São Paulo. Só mudou de lugar. - Karol Coelho, 27

Financiadores do RBD

O ano era 2005. Éramos jovens, iniciantes na internet e só um pouquinho estudiosos. A rotina era bem organizada: acordava às 10h, às vezes tomava café, assistia muitos desenhos e ia para escola. Entre eu e meus amigos, o assunto que não faltava era o grupo pop mexicano RBD.

Nunca fomos aqueles alunos ricos que todos os dias compravam lanche na cantina, mas quando sobrava um dinheirinho, a lei era comprar cards, revistas e tudo que remetia ao sexteto mexicano. A tarde, nos encontrávamos para trocar as figurinhas compradas, ouvir muita música e conversar sobre anseios da idade. - Renan Gardenal, 26

Tudo pela ficha de fliperama

Quando eu ia comprar alguma coisa para casa, arroz, frango na granja, aproveitava que qualquer trocado eu gastava por ficha de fliperama.

Às vezes o dono do bar falava para comprar copo, alguma coisa para o bar e dava a ficha como pagamento. Isso, dos oito aos 12, porque eu era muito viciado nisso. Todo dia eu jogava fliperama. Qualquer dinheiro era revertido nisso.

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Minha mãe e ninguém mais em casa gostava disso, por mais que fosse um bar do vizinho. Eu me escondia atrás da máquina, no banheiro, só para poder jogar fliperama. Até o troco de escola, em vez de de comprar doce, chiclete, eu sempre comprava ficha. Minha economia girava em torno de ficha. - Danilo Oliveira, 32

O troco do cigarro Free em Kinder Ovo ou amendoim

Quando eu tinha uns cinco ou seis anos, lembro que o maço de cigarro Free era R$ 3,50. Minha mãe mandava eu comprar e voltava com um Kinder Ovo, dois gibis (doce de amendoim) e dois chiclete Big Big. Com o tempo troquei o Kinder pelo salgadinho Fofura.

Também comprava amendoim japonês. Na época era R$ 0,25 o copinho. Eu juntava R$ 1,50 e vinha muito. Amava. - Leonardo Lopes, 26

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