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Por que adolescentes estão fazendo cyberbullying com eles mesmos?

A “autoflagelação digital” existe e pesquisadores tentam entender o comportamento autodestrutivo.
Jill Chen/Stocksy.

Matéria publicada originalmente no Tonic .

Cyberbullying é um grande problema. Reconhecemos isso como parte de uma percepção maior de que o mundo “virtual” é real, e as coisas que acontecem lá têm consequências também reais. Um novo estudo, no entanto, sugere que tem outro fenômeno menos conhecido relacionado ao cyberbullying: adolescentes compartilham anonimamente conteúdo prejudicial sobre si mesmos – o que os pesquisadores estão chamando de “autoflagelação digital”.

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O estudo, publicado no Journal of Adolescent Health, examinou a abrangência da autoflagelação digital, definida como o ato de postar, enviar ou compartilhar material negativo sobre si mesmo. Numa postagem de blog que acompanhou a pesquisa, um dos autores, Justin W. Patchin, especialista em cyberbullying, descreve ter sido contatado por autoridades sobre mensagens postadas num aplicativo anônimo. Todas encorajavam o suicídio, e eram dirigidas a um usuário específico. “Se você não se matar hoje, faço isso por você”, dizia uma. A polícia começou a investigar o caso, mas depois de contatar a empresa do aplicativo, descobriu que as mensagens tinham sido mandadas pelo próprio destinatário.

Para quem não é adolescente, esse tipo de comportamento pode parecer um problema raro e estranho. Por que alguém enviaria mensagens prejudiciais para si mesmo? Mas Patchin descreve casos recentes que receberam bastante atenção. Hannah Smith, uma garota de 14 anos de Leicestershire, Inglaterra, se matou em 2013. O pai disse que ela recebeu mensagens de bullying anônimas no Ask.fm por meses antes de sua morte. Investigadores do site logo descobriram que 98% das mensagens que ela recebeu vinham do mesmo IP, o computador dela, o que sugere que ela mesma teria mandado as mensagens. E novembro passado, em Hebbronville, Texas, Natalie Natividad, de 15 anos, tirou a própria vida; mensagens de bullying sugerindo que ela “deveria se matar” foram postadas por ela mesma.

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O fenômeno não é inteiramente novo. Em 2010, a pesquisadora de redes sociais Danah Boyd escreveu uma postagem num blog sobre o assunto, na qual apontava várias motivações possíveis para o comportamento: parecer legal (quando ser criticado é um sinal de popularidade), esperança de desencadear respostas positivas de amigos e colegas, ou um pedido de ajuda. Um estudo de 2011 tentou quantificar quanta autoflagelação estava acontecendo, e descobriu que 9% dos universitários admitiam ter feito isso quando estavam no ensino médio.

Mas o novo estudo é o primeiro sobre estudantes de ensino médio. Ele se baseou numa pesquisa realizada em 2016 com 5.593 adolescentes norte-americanos entre 12 e 17 anos, que responderam sobre uma variedade de comportamentos, incluindo autoflagelação digital. Cerca de 6% disseram já ter postado alguma coisa má sobre si mesmos online. Os meninos tinham significantemente mais chances de fazer isso, 7,1% comparado com 5,3% entre as meninas. Certas características se relacionavam com a tendência de autoflagelação digital, incluindo ser não-heterossexual, sofrer bullying na escola e cyberbullying, uso de drogas ou comportamento prejudicial, ter pensamentos depressivos e se autoflagelar offline.

Quando os pesquisadores perguntaram aos estudantes o que motivava sua autoflagelação digital, alguns temas emergiram. Parte deles testavam os amigos para ver como (ou se) eles responderiam. Outros fizeram por piada ou para chamar atenção. Outros citaram baixa autoestima e sentimentos de ódio por si mesmos: “Como eu já me sentia mal, eu só queria me fazer sentir pior ainda”, como um deles colocou.

Patchin aponta que o assunto precisa ser mais estudado, que esse é um fenômeno pouco compreendido – mais pesquisas são cruciais para entender isso melhor. Mas, como ele escreve, pais devem estar conscientes de que casos de cyberbullying podem, na verdade, ser autoflagelação digital. Autoridades também devem considerar a ideia, e responder apropriadamente. Isso não deve ser descartado como mentira ou algo pensado para chamar atenção. É preciso reconhecer que, mesmo em casos de autoflagelação digital, há um adolescente precisando de ajuda.

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