As artistas que resgataram imagens banidas do Instagram
Foto principal: @aleia / Aleia Murawski / Prestel

FYI.

This story is over 5 years old.

Viagem

As artistas que resgataram imagens banidas do Instagram

Falamos com Molly Soda e Arvida Byström sobre seu novo livro, 'Pics or It Didn't Happen'.

Este artigo foi originalmente publicado na VICE UK

As tuas imagens apagadas do Instagram não são apagadas simplesmente por capricho. Quando acontece é porque alguém deliberou sobre o assunto e decidiu que a fotografia não estava de acordo com as "Community Guidelines" da plataforma. Ou seja, alguém real, pessoas - conhecidas como trabalhadores do sector de "moderação de conteúdo comercial" - que tomam decisões sobre se a tua selfie de mama tem demasiada mama. Imagens banidas deste género, que vão do nu explícito, a grandes planos de alguém de roupa interior com pêlos púbicos à vista, foram agora compiladas pelas artistas Molly Soda e Arvida Byström, num novo livro chamado Pics Or It Didn't Happen.

Publicidade

Em conjunto, ambas têm mais de 220 mil seguidores no Instagram, pelo que decidiram lançar um apelo na rede social para quem quisesse enviar-lhes fotos que tivessem sido denunciadas. A obra final contém cerca de 250 imagens retiradas da plataforma e, ainda que muitas sejam NSFW, levantam uma questão pertinente: porque é que alguns corpos - a maioria brancos, magros, depilados e cisgénero - são aceitáveis nas redes sociais e outros não.

Desta forma, Soda e Byström criaram um arquivo - ou um memorial - para as nossas fotos banidas. Liguei às artistas para descobrir mais sobre o projecto.

@isaackariuki / Isaac Kariuki / Prestel

VICE: Porque é que decidiram fazer este livro?
Molly Soda: Reparámos num padrão na forma como as pessoas reclamavam pelo facto de verem as suas imagens removidas do Instagram. Nós próprias já tínhamos reclamado também, por isso decidimos fazer alguma coisa em relação ao assunto. sentimos que era importante que Pics Or It Didn't Happen desse alguma elevação a essas fotos banidas das redes sociais.

É óbvio porque é que algumas imagens foram banidas, mas há outras - como a da mulher a usar o hijab para segurar o telefone junto ao ouvido - que nem por isso. Onde é que se define a linha?
Arvida Byström: Depende do contexto. Estas pessoas - os moderadores de conteúdos que têm como função decidir o que é removido - olham para o que se passa no feed da pessoa responsável pela imagem. Há quem tenha contas em que publica imagens de nudez parcial durante meses, um dia, uma das imagens é denunciada e, de repente é do género: "Bem, agora isto pode ser visto como uma conta porno". E a conta é simplesmente encerrada.

Publicidade

Molly: Também julgo que tem a ver com a quem o corpo pertence. Há corpos que são mais sexualizados que outros, apenas por causa da forma como estamos habituados a olhar para eles.

@bloatedandalone4evr1993 / Molly Soda / Prestel

Como assim?
Arvida: O Instagram define o que é seguro, certo? Mas há muitos coisas que são vistas como sexuais. podes ter uma foto em que usas uma cueca muito pequenina e estás depilada e a coisa passa, mas, de certa forma, culturalmente isso é mais sexual do que teres uma zona púbica não depilada. Portanto, acho que o que acaba por acontecer é uma mistura de o que as pessoas acham que é nojento assim de caras e o que é sexual. Tivemos mais pessoas brancas  a enviarem-nos imagens, mas julgo que isso se deve ao facto de as pessoas brancas se sentirem mais livres em mostrarem os seus corpos desta forma.

A escritora norte-americana Chris Kraus – de I Love Dick  – escreveu o prefácio do vosso livro. Porque é que a escolheram?
Arvida: O nosso editor queria que tivéssemos alguém de fora do nosso círculo para escrever o prefácio. Pensámos em Chris Kraus e sentimos que era estranhamente relevante. Em I Love Dick ela fala bastante sobre o facto de as mulheres no meio artístico não serem levadas a sério. Há muitas diferenças entre nós, mas, definitivamente, partilhamos terreno comum com a Chris. Sinto que tanto eu como a Molly temos tido pouca representação em livros e, no entanto, os livros são vistos como arte clássica e história da arte.

Publicidade

Molly: É isso. Esta coisa toda de ser vista como uma "internet girl" e não ser respeitada. além disso, I Love Dick não foi muito bem recebido quando foi editado. Nessa altura não era relevante, mas agora, para a nossa geração, é extremamente relevante. portanto, fez muito sentido.

@appropriatingwhiteculture / Bea Miller / Prestel

A maior parte das imagens do livro são de mulheres. No banho, na sanita, em roupa interior. O que é que isto diz sobre a nossa atitude em relação ao corpo feminino?

Arvida: Esta é a forma como a sociedade trata os corpos das mulheres, portanto não seria de esperar que o instagram fosse diferente.

Molly: Basta ler comentários em publicações de pessoas que mostram o corpo de uma forma mais ou menos desviante, do género pêlos no sovaco. É de loucos. E é desconcertante que pêlos no sovaco ainda seja sequer um tema de discussão hoje em dia.

Temos evoluido para melhor, no entanto? Há coisas que hoje não seriam banidas, mas que há dois anos não teriam qualquer hipótese, por exemplo?
Arvida: Sim, agora só recebo um comentário por causa do meu sovaco peludo, enquanto antigamente recebia centenas.

Molly: Acho que estamos a evoluir. Também ainda recebo comentários desse género, mas já não é tão mau. Todavia, qualquer corpo socialmente desviante, seja de que forma for, vai ter repercussão. Faz sentido, porque o Instagram não é diferente do resto da sociedade. Eu podia estar vestida com um vestido totalmente sem formas  e uma touca do banho e, ainda assim, iria ser sexualizada.

Publicidade

@verajorgensen / Vera Jørgensen / Prestel

Se pudessem mudar as regras do Instagram, o que é que lhes diriam?
Arvida: O Instagram tem de ser mais coerente em relação aos corpos. Precisam também de parar de remover coisas só porque socialmente podem ser vistas como um bocadinho nojentas. Como os pêlos púbicos, por exemplo. Neste momento, os corpos são tratados de forma diferente e isso é perigoso.

Molly: Mas não descartaria todas as regras. É preciso que existam. Não quero ver fotos de pilas e de decapitações.

O que gostariam que as pessoas entendessem ao verem o vosso livro?
Arvida: Que a censura é um assunto muito complicado. É interessante fazer esta espécie de arquivo de pensamentos e do momento que vivemos hoje em dia. Daqui a 20 anos, pode ser que isto pareça apenas verdadeiramente antigo e estúpido. Se calhar já há pessoas que acham que é, mas o que é que podemos fazer?

"Pics Or It Didn't Happen: Images Banned from Instagram", de Molly Soda e Arvida Bystrom é editado pela Prestel.

@louisedonovan_

Vê mais fotos abaixo.

@c.har.lee / Lee Phillips / Prestel

@ser_sera / Ser Brandon-Castro Serpas / Prestel

@stinawolter / Stina Wolter / Prestel