Mato sem cachorro ou rio sem peixe, seja como for, José da Silva Filho vê-se preso à uma situação que nunca imaginou passar antes do rompimento da barragem de Fundão há dois anos em Mariana, Minas Gerais. O rio que era doce ficou amargo para José e a sua família que viviam e se sustentavam, há 12 anos, da pesca no Rio Doce em Governador Valadares. Tilápias, Cascudos e Traíras, assim como José, Marcelo Tomaz ganhava de R$ 3 mil a R$ 4 mil por mês pescando no Rio Doce. Hoje vivem com o cartão de indenização da Samarco no valor de R$ 1.300 mensais. E não podem trabalhar, porque se o fazem perdem a remuneração da empresa. Começar um outro trabalho agora, na situação atual do país, dizem, seria improvável e depois de uma vida inteira dedicando-se à pesca, não teriam êxito.
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Outra situação complicada vivem os pequenos agricultores às margens do Rio Doce. Joelma Fernandes veio de Governador Valadares assistir a missa do padre Geraldo Barbosa da Arquidiocese de Mariana, no distrito de Bento Rodrigues. Ela conta sobre a situação de antigos moradores das ilhas do Rio Doce: “Os pequenos agricultores que vivem nas ilhas do rio estão lá, alguns há mais de 60 ou 70 anos. Agora perderam o sustento e seguem vivendo num lugar contaminado sem poder produzir sequer para comer. O pior é que segundo a Samarco, eles não têm direitos a nenhuma reparação já que estariam ocupando áreas da Marinha Brasileira e não detém a propriedade destas ilhas”.
Weberson Arlindo dos Santos de Bento Rodrigues, o primeiro povoado destruído com o rompimento da barragem de rejeitos de minérios da empresa Samarco, comenta que apesar de ele estar trabalhando desde antes da tragédia, outros vizinhos de Bento estão sem trabalho desde então, e acrescenta que com o desemprego atual em Mariana, será difícil encontrar trabalho tão logo. O município de Mariana, impulsionado pela atividade mineradora e também pelo turismo, jamais havia visto a taxa de desemprego alcançar o índice atual. Hoje, segundo o IBGE, o desemprego no município e respectivos distritos ultrapassou 20% da população ativa.
Em homenagem à memória dos 19 mortos em Bento Rodrigues, passados dois anos da maior tragédia socioambiental da história do país, celebrou-se uma missa nos escombros da antiga igreja de São Bento. O padre Geraldo corrige, ao todo são 20 mortos, “contamos o vigésimo desaparecido também”. E milhares de afetados. Ao final dizem e portam as 19 cruzes dos 19 mortos confirmados: “Não foi acidente! Foi crime!”.
Diferentemente do primeiro aniversário da tragédia, desta vez o distrito de Bento Rodrigues estava ocupado quase que tão somente por seus moradores originários. Os “Loucos por Bento” eram maioria. Esse grupo de moradores que resiste a deixar o povoado, segue nas festas, nos aniversários, Natal ou ano-novo.
Ainda sem reparações e vivendo de aluguel em Mariana, os moradores do Bentinho esperam por decisões judiciais nesse imbróglio que já dura dois anos. Dois anos de vidas estagnadas diz o Sr. Francisco antes da Missa: “Estamos esperando e nem sabemos o quê. Seguimos na luta pelos nossos direitos”. Weberson, que agora tem a filha gravemente doente, explica o que sofrem em Mariana: “As pessoas pensam que nós estamos ganhando milhões com a catástrofe. Nem sequer fomos reparados. Tivemos nossas vidas destruídas, mas em Mariana todos pensam que somos aproveitadores”. A Fundação Renova, entidade criada pela empresa Samarco para ocupar-se das consequências da tragédia segue prometendo a entrega das novas casas para o primeiro semestre de 2019.Siga a VICE Brasil no Facebook , Twitter e Instagram .