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Entenda por que fundos de investimento do Brasil estão proibidos de investir em bitcoin

Uma coisa é certa: essa é só a pontinha do iceberg na treta da regulamentação da criptomoeda no nosso país.
Crédito: BTC Keychan com montagem do autor.

Se você não esteve em uma caverna nos últimos dois anos, a essa altura já deve ter vaga ideia do que é bitcoin. São muitas notícias sobre a moeda digital e, sejamos francos, pouquíssimas certezas. Lemos, todo dia, sobre especulação, gráficos inconstantes, explicações quase técnicas e valorizações que chegaram a mais de 1000% nos últimos meses. Para muitos economistas, o cenário é da mais óbvia bolha desde a crise das hipotecas subprime que assustou o mundo em 2008.

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Em meio a tantas notícias e opiniões, a verdade é que não há consenso sobre como definir o bitcoin. Por mais que os adoradores dela não admitam, há quem diga que não se trata de ação nem de moeda. E, ao que tudo indica, algumas instituições do governo brasileiro concordam com a posição. Na última sexta-feira, a Superintendência de Relações com Investidores Institucionais da Comissão de Valores Mobiliários(CVM) divulgou ofício em que reafirma a proibição da aquisição e negociação de criptomoedas por fundos de investimento.

Segundo o texto, assinado pelo superintendente Daniel Maeda, “as criptomoedas não podem ser qualificadas como ativos financeiros para os efeitos do disposto no artigo 2º, V, da Instrução CVM nº 555/14, e por essa razão, sua aquisição direta pelos fundos de investimento ali regulados não é permitida”. Certo, mas e daí? O que muda?

Antes de responder, vamos às definições básicas. Fundos de investimento são um dos tipos de investimento mais comuns no país. Eles funcionam como uma grande vaquinha em que os investidores compram a cota de determinado título e dividem lucros e prejuízos. A analogia mais comum para explicar a modalidade é um condomínio: os apartamentos seriam as cotas e o síndico seria o administrador do fundo. Para o funcionamento da boa vizinhança, existem, claro, diversas regras que tanto o administrador quanto os cotistas devem obedecer. Todas elas são reguladas pelo governo, mais especificamente pelo CVM.

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Para o economista e CEO da Bit.ONE, Thiago César, a proibição da CVM não é nova pois o texto que define quais ativos um fundo pode investir ou não é bastante claro. O bitcoin não é e nunca foi um ativo listado internacionalmente. Em outras palavras: todo mundo que era do mercado já sabia que não era possível investir na moeda por esse meio. “Se o fundo quer investir em commodity, milho por exemplo, ele não pode, pois não é um ativo listado internacionalmente. A mesma regra vale para o bitcoin.”

Ele destaca que o maior problema não está na proibição em si, mas na forma como ela foi noticiada na última sexta-feira. “Quem é do mercado já sabia disso, agora para o usuário leigo ficou parecendo que investir em bitcoin passou a ser proibido pela CVM”. Respondendo a pergunta, então: não muda muita coisa para quem já está no jogo das criptomoedas.

Ainda assim, o assunto é interessante por marcar o rígido posicionamento da CVM contra o bitcoin. Em dezembro do ano passado, o órgão considerou ilegal a venda de cotas de poder de processamento para mineração na nuvem. O texto divulgado na última sexta-feira destaca que ainda há “muitos outros riscos” associados às moedas, entre eles a segurança cibernética e a forma de armazenamento. Destaca também infortúnios ligados à “legalidade futura de sua aquisição ou negociação”.

Neste momento, o governo brasileiro ainda não chegou a um consenso de como proceder com relação às criptomoedas. Nas discussões em torno do PL 2303/2015, que visa regulamentar a moeda no Brasil, duas posições ganharam destaque no debate: a primeira do autor do projeto, o deputado Áureo (SD-RJ), que defende uma linha mais branda de regulamentação; do outro lado está o relator do projeto, o deputado Expedito Netto (PSD-RO), que defende a proibição e criminalização da negociação de bitcoin no país.

“Em termos de regulamentação, não vejo sintonia entre nossos representantes e as autarquias que regulam as criptomoedas”, comentou Thiago Cesar. Ele destaca que, enquanto a discussão na Câmara dos Deputados é motivada por argumentos mais políticos do que técnicos, outras instituições do governo federal tomam suas próprias decisões — muitas vezes contraditórias. A proibição reforçada pelo CVM parte do princípio que o bitcoin não é um ativo financeiro, enquanto isso a Receita Federal reconhece e tributa as criptomoedas nesta mesma categoria.

Apesar do clima de descompasso institucional em torno da questão, há otimismo por parte das corretoras. O economista Luiz Roberto Calado, da Mercado Bitcoin, crê que o cenário internacional influenciará o Brasil a rever suas políticas. “Considerando o acolhimento internacional da criação do mercado de derivativos de bitcoin em duas das principais bolsas de mercadorias e futuros do mundo, e os avanços da regulação do assunto do Japão, uma das maiores economias mundiais, podem ser sinais de que o diálogo irá evoluir no Brasil”, escreveu, em nota.

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