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Na Dornelândia, o skate experimental vira beat

Desvendamos o projeto que compõe músicas a partir de sons de manobras numa pista de ferro velho.
Foto: Shiozaki Shinji

Projeto que reúne instalação, skate, música experimental e performance de maneira nada ordenada, a Dornelândia surgiu da junção de três das mentes mais inquietas do skate brasileiro. Durante um mês, Alexandre Cotinz, Murilo Romão e Renato Custódio ocuparam a Sala Esquesso da Void General Store, em São Paulo, com uma pistinha pouco convencional. Construíram tudo com achados de ferro velho, microfonaram os obstáculos e passaram a captar os sons produzidos pelo skate para fazer música a partir desses barulhos.

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Isso foi só o começo da Dornelândia. Agora o projeto chega a mais uma etapa, com esse inusitado material sonoro disponibilizado pelo trio pra que você e quem mais quiser possa baixar, ouvir e transformar em beats. O link pra download chega em primeira mão aqui na VICE.

Além de skatistas com nomes estampados em produtos como shapes e tênis, o trio também tem em comum o fato de serem nomes da cultura do carrinho por um viés mais artístico no Brasil. Cotinz e Murilo estão por trás de vídeos como Doppelganger e Flanantes, respectivamente, e Renato aborda o skate em diversos suportes visuais, da fotografia a esculturas de azulejos. É ele quem explica como dessa vez resolveram produzir algo sonoro. “Eu tinha feito um workshop com uma baterista americana chamada Kelly Rauer sobre como construir um drumsynth, que é um sintetizador de vibrações, e ela me falou também dos microfones de contato”, diz. “Aí eu já quis experimentar isso com skate e achei foda porque ficou outra coisa, mais abstrata, você não sabe bem que tipo de ruído é aquele. No dia seguinte mostrei a ideia pros caras e todo mundo curtiu.”

Murilo acrescenta que primeiro eles pensaram mais visualmente em como ocupar o espaço. “Antes até de pensar em fazer os sons a gente logo pensou em usar materiais achados em ferro velho e depois isso casou legal porque são materiais que fazem bastante barulho”, contou. “Nenhum de nós já tinha trabalhado com música e a gente foi desvendando, aprendendo, errando.” Com as buscas desses descartes que funcionassem como obstáculos sonoros veio também a placa que deu nome ao projeto - Dornelândia é o nome de uma rua da capital paulista, o que bateu bem com a ideia de espaço físico que eles queriam desenvolver.

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Foto: Renato Custódio

“A gente pegou coisas que já estavam meio sem uso, coisas que ninguém queria mais e isso reflete um pouco o jeito que o skate de rua é visto também. Esse lado de ressignificar as coisas, dar outras funções ao que não serve mais pro cidadão comum”, afirma Renato. Alguns obstáculos foram feitos com arduíno, um hardware programável que os caras usaram pra ativar os sensores quando o skate entrava em contato. Esse som sintetizado era “tocado” com o skate mas não era exatamente o ruído do atrito e sim da passagem dele acionando o arduíno, o que trouxe mais melodia pro banco de samples. “A ideia também era dar fluxo ao lugar, de você poder dar voltas no pico fazendo barulhos, uma performance ao vivo de ativação dos sons do espaço mesmo”, completa.

Com o espaço ocupado e obstáculos conectados, começaram a captar os barulhos das sessões de skate e convidaram artistas/skatistas do universo da música experimental para apresentações ao vivo que reuniram bastante gente na caótica pista-laboratório. As DJs/produtoras Acaptcha e Raquel Krügel e os músicos M Takara, Sesper e Rick estiveram no espaço sampleando e levando os sons das ma

Foto: Renato Custódio

nobras a outros timbres. “Teve a apresentação com o Edgar, que é um músico que a gente já curtia muito o trampo e que abraçou total o projeto, tinha dia que colava no pico só pra curtir e se divertir com a gente e foi nessa que rolou também uma transmissão ao vivo pelo projeto Quartinho”, comenta Cotinz.

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Dos que também estavam manobrando ali na pista vieram os amigos Daniel Marques (Efeito Horizonte) e Klaus Bohms, nomes bastante frequentes nas legendas de vídeos de skate. “Eles são skatistas profissionais mas já faziam música e tinham uma certa experiência com produção de beats. Cada apresentação dessas foi um esquema, umas tinham ensaio e outras foram mais no improviso mesmo”.

Como a loja fica no Largo da Batata (pico bem frequentado pelos praticantes de skate de rua em São Paulo), muita gente acabava subindo lá só pra ver qual que era e até esse momento das apresentações muita gente ainda não tinha entendido direito o que tava acontecendo no pico. Cotinz conta que “muita gente perguntava ‘quando é que vai abrir a pista aí?’, a maioria achava que era só uma pistinha com um som rolando. Depois que foram entendendo que os sons tocados vinham dos próprios obstáculos.”

Foto: Renato Custódio

Assim como todo o resto, a dinâmica de composição dos beats também rolou de forma experimental, apoiados num sampler SP e diversos pedais de efeito que conseguiram emprestados de amigos. Nisso a Dornelândia contou com elementos como um tonel conectado a um pedal superfuzz e um trilho na parede com delay. Quando pegaram uma certa intimidade com os equipamentos, começaram a fazer uns lives enquanto a galera preenchia o espaço andando de skate, filmando e trocando ideia.

Os beats eram compostos basicamente em dois esquemas, uma parte feita previamente a partir do banco de samples e outra fazendo tudo na hora. Cotinz conta que “ligava a mesa inteira num pedal de loop, aí dava uma manobra e gravava o loop do som dela, depois outra manobra em outro obstáculo e acionava o loop novamente. Com isso, as camadas iam formando um beat”.

Passada essa primeira etapa do projeto com a instalação na Void, a ideia agora é ocupar outros lugares, olhares e ouvidos com a pista-sistema de som, além de expandir as experimentações com os obstáculos sonoros. “Isso que rolou agora foi um teste, nós queremos experimentar mais coisas, talvez fazer uns ao vivão mesmo, sem sampler até, tocando com skate nos obstáculos e fazendo as músicas, sons, ruídos… Seja lá o que for interessante de ouvir e fazer”, conclui Renato.

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