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Foto: Amazonia.org

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Garimpo ilegal avança na Amazônia e você pode ser afetado

Estudos evidenciam os perigos do mercúrio na mineração de ouro ilegal na floresta amazônica. E sabe aquele seu anel ou sua correntinha de ouro? Eles têm responsabilidade nisso também.

A garimpagem está prevista na Constituição Federal, mas a ilegalidade cresce cada vez mais como uma verdadeira ‘epidemia do garimpo’ em toda a floresta amazônica. A região está sendo afetada de forma quase que irreversível por conta da utilização do mercúrio. Rios, peixes e centenas de comunidades indígenas e ribeirinhas estão ameaçadas. E você também.

Você pode até não se importar num primeiro momento, mas o perigo da contaminação do mercúrio em nossas vidas é muito maior do que possamos imaginar. Do simples açaí natural, passando pelo peixe fresco e indo até aquele seu anel de ouro, tudo pode ser afetado pela substância.

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Metal pesado, líquido na temperatura ambiente e altamente tóxico, o mercúrio se acumula ao longo da cadeia alimentar. Utilizado na garimpagem do ouro, ele contamina o rio, que contamina o peixe, que é ingerido por outro peixe e depois consumido pelo humano e segue no organismo desse humano. É um ciclo tóxico.

Independentemente de onde é lançado, o mercúrio viaja por uma grande distância por meio dos oceanos e da atmosfera, chegando a ser transportado de um continente para outro. A contaminação de mercúrio causa sérios danos na saúde humana, principalmente no desenvolvimento de crianças.

Até o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) já declarou em vídeo ser filho de garimpeiro e simpático à atividade. E como se não bastasse, nomeou para ministro do Meio Ambiente um réu que responde processo por fraude ambiental. Conversamos com alguns especialistas para analisar o problema e a proporção em que ele se encontra.

Quando inalado na forma de vapor, danifica os sistemas imunológico e nervoso central, tireóide, rins, pulmões e olhos. Os sintomas incluem tremores, insônia, perda de memória, dores de cabeça, disfunção motora, distúrbios neurológicos e comportamentais. Poden causar, inclusive, demência, depressão, ansiedade e falhas de memória.

Muitas empresas de alimentos apostam na biodiversidade da floresta amazônica e fazem dela sua fonte de matéria-prima para seus produtos. Plantas e frutas são coletadas diariamente na Amazônia, convivendo com o risco iminente da contaminação do mercúrio, como o açaí.

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Segundo um artigo sobre os níveis de mercúrio em peixes consumidos pelas comunidades indígenas no Pará, cerca de 60 a 95% do mercúrio total, em tecido muscular, ocorrem na forma de metilmercúrio, uma das formas mais tóxicas para o ser humano.

“Entre os metais lançados no meio ambiente, o mercúrio é considerado o de maior potencial tóxico e o único que, comprovadamente, sofre biomagnificação ao longo da cadeia trófica, sofrendo ainda organificação e atingindo sua forma mais tóxica (metilmercúrio) no sistema aquático”, diz Maria Amélia Estrela, doutora em química pela Universidade de Brasília, .

Mapa garimpo ilegal na Amazonia

Pontos de garimpo ilegal na floresta amazônica. Foto: Raisq

Perigo social e ambiental

A Rede Amazônica de Informação Socioambiental Georreferenciada (Raisg) realizou um estudo que mapeia os pontos de garimpo ilegal na floresta amazônica, formada por nove países. Foram encontrados pelo menos 2.312 pontos ao longo de todo bioma amazônico e o Brasil conta com 453 garimpos ilegais, em quase 7 milhões de km².

O mapa foi construído por meio da junção e cruzamento de diversos dados sobre a região da floresta amazônica, que vai além do Brasil, como explica a geógrafa no Instituto Socioambiental (ISA) e na Rais, Julia Jacomini Costa. “A ideia do mapa é trazer uma visão panamazônica para o tema porque, quando se fala em Amazônia, já vem em mente a Amazônia brasileira, mas pouco se considera que esse bioma é transfronteiriço, assim como a atividade garimpeira”.

Além dos estragos ambientais, o garimpo ilegal traz consigo uma série de outros crimes interligados. Eles provocam uma grande desorganização do modo de vida local. “Há também um grande estrago social na região, como toda a logística de transporte clandestino de combustível e de alimentos, altos índices de violência e a prostituição”, diz Julia.

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Ela conta que, na maioria dos casos, a mineração ilegal está associada à prática legal. É como se aproveitassem a fachada para extrapolarem. "Por exemplo, muitas vezes se tem uma empresa explorando legalmente o minério e, no seu entorno, existem pontos de mineração ilegal", conta.

Para Nilo D’Ávila, diretor de campanhas do Greenpeace, o acúmulo do mercúrio causa um impacto de difícil reversão. “O garimpo ilegal é a atividade que vai mais profundamente na floresta, pois, além da retirada da vegetação, tira-se camadas do solo, que, por sua vez, custa muito tempo para se recuperar”, diz.

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“Um estudo dos peritos da Polícia Federal que estiveram envolvidos numa ação de combate ao garimpo ilegal este ano calculou que em sedimentos, os garimpos da região dos Tapajós produzem um desastre de Mariana por ano. Isso é muito assustador”, comenta Nilo D'Ávila.

Nilo ainda alerta para a responsabilidade do cidadão. Ele é categórico. “2019 está aí e nós não precisamos de ‘brinquinho e correntinhas’ de ouro, que muito provavelmente vêm de um garimpo ilegal, que está destruindo a floresta, então acho que o cidadão tem um papel fundamental nesse processo por conta do consumo do ouro”, diz.

Ainda pode piorar

A preocupação de entidades ambientais é de que esse cenário possa piorar diante da gestão do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL). Entre as tantas afirmações polêmicas, Bolsonaro declarou que em seu mandato os índios receberão royalties para a “exploração da biodiversidade”.

O presidente eleito ainda declarou que retiraria o Brasil do Acordo de Paris, documento firmado em 2015 com 195 países, incluindo o Brasil, e tem como um dos principais objetivos o controle do aquecimento global, além de outras medidas que cada país se comprometeu e que precisam ser adotadas.

Para o cargo de ministro do Meio Ambiente, Bolsonaro anunciou o advogado e administrador, Ricardo de Aquino Salles. Ele é réu de ação civil pública ambiental e de improbidade administrativa quando era secretário estadual do Meio Ambiente do governo de Geraldo Alckmin (PSDB).

De acordo com o processo do MP-SP, Salles e outros envolvidos “agiram à sorrelfa (às escondidas) e com a clara intenção de beneficiar setores econômicos, notadamente a mineração”, durante a elaboração do Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental da Várzea do Rio Tietê, no ano de 2016, quando foram cometidas diversas irregularidades.

O fato é que dados estatísticos, pesquisas, estudiosos no Brasil e no mundo alertam a todo o momento sobre o risco que a região e a população da Amazônia estão correndo. Parece que a cultura da desimportância para com as questões do meio ambiente assim como para as populações indígenas, somadas à falta de compromisso por parte do legislativo, gera uma enorme cegueira diante dos problemas da maior floresta tropical do planeta.

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