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Politică

Os jovens nacionalistas estão putos com Bolsonaro

Fãs de Enéas Carneiro e contrários à política liberal, os ultraconservadores brasileiros rejeitam os acenos do futuro presidente de extrema-direita aos EUA.

Nos meses que antecederam as eleições, discursos inflamados em nome da nação brasileira deram o tom da campanha do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL). Frases como “meu partido é o meu país” foram estampadas em camisetas em verde e amarelo; o próprio candidato apelou para o amor à nação para tirar o Brasil do Acordo de Paris; e até mesmo o ex-líder da Ku Klux Klan exaltou o nacionalismo do político brasileiro de extrema-direita.

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A questão é que, para muitos jovens militantes do ultraconservadorismo nacional, o militar da reserva não representa em nada o nacionalismo. Para eles, os primeiros passos de Bolsonaro eleito são contrários aos lemas que pregava no começo da campanha. “Um nacionalista jamais seria amante dos EUA e de Israel, nem defenderia Estado Mínimo, colocando-se ao lado de representantes do Sistema Financeiro Internacional, como Paulo Guedes”, diz José Calasans, 25 anos, presidente estadual do Partido de Reestruturação da Ordem Nacional (Prona-BA).

Calasans é um fã declarado de Enéas Carneiro, político que ficou marcado nos anos 90 por suas ideias radicais expostas em berros graves, autoritários e raivosos. Calasans não tinha idade para ter votado ou acompanhado de perto as ideias de Enéas, mas, como muitos jovens, conheceu o falecido político por meio do YouTube. A admiração fez com que ele se dispusesse a ressuscitar o partido, extinto em 2006, ao lado de outros jovens.

Em teoria, Calasans teria motivos para gostar de Bolsonaro. O presidente eleito, afinal, já declarou diversas vezes sua admiração por Enéas, tendo, inclusive, adaptado algumas de suas pautas, a exemplo da melhor exploração do metal nióbio e da demarcação de terras indígenas. As diferenças ideológicas, porém, são maiores. “É bem mais provável existir um marxista-burguês que um 'nacionalista-liberal', posto que o nacionalismo, por essência, é antiliberal, não apenas anticomunista”, comenta. Outra diferença que pesa é a postura de Enéas contra a ditadura. Ao contrário de Bolsonaro, que relativiza e nega os crimes ditatoriais, o fundador do Prona costumava falar dos malefícios da falta de liberdade de imprensa.

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Chamando Enéas de "visionário", Calasans conta que tem adotado uma "estética fashwave" e propõe uma revolução artística tradicional-futurista. "A ideia é trazer o passado ao futuro que nos foi roubado. Queremos um futuro tradicional! Lutamos contra a modernidade, mas não negamos os avanços tecnológicos", explica. "O Estado a que nos referimos não é o Estado que aí se encontra, fraco, inerte, propriedade dos políticos, sem nenhuma função social. O Estado que nós preconizamos é um Estado forte, técnico e intervencionista, que privilegie o trabalho e a produção, em detrimento do capital especulativo."

Ainda que a maioria dos defensores do nacionalismo contemporâneo não articule bem seus ideais, eles são claros quanto ao que defendem. Lutam a favor do civismo, da identidade nacional, dos valores e tradições, da honra e glória dos heróis do passado. Para o presidente nacional do Partido Nacionalista do Brasil, Marco Antonio, de 48 anos, Bolsonaro não se encaixa nesses moldes. “Um verdadeiro nacionalista entende a valorização da integração do povo e para que seja respeitado e forte como um todo”, explica. "Esse senhor [Bolsonaro] nunca foi, não é e nunca será um nacionalista; pode até ser um patriota por ter servido as forças armadas, mas isso não é referência para ser um nacionalista!"

O jovem Leonardo Sinigalhia, de 20 anos, o fundador da Legião Nacional-Trabalhista, concorda com Marco Antonio: para ele, Bolsonaro é um falso nacionalista. "Ele não é um nacionalista. É um neoconservador, nada além disso. Um liberal na economia e conservador nos costumes", diz.

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Para Sinigalhia, o avanço do neoliberalismo é um das dificuldades da adoção do nacionalismo no Brasil. "Em um mundo caracterizado pela globalização, a propaganda neoliberal se dissemina como música para os ouvidos pelo discurso do Estado inchado, corrupto e cobrador de impostos, e que deve ser substituído pelo mercado, o que ganha a atenção de políticos, economistas e também dos centros acadêmicos", diz. "Uma perfeita armadilha para as nações em desenvolvimento."


Embora esteja em crescimento entre jovens as ideias nacionalistas, o número de adeptos não é tão alto. O Prona, por exemplo, tem nove mil curtidas no Facebook. Já a Legião Nacionalista não ultrapassa os sete mil e o Partido Nacionalista do Brasil, os dois mil. Ultraconservador, Calasans crê que se trata de alienação. “Muitos jovens estão demasiadamente hedonistas e alienados às questões políticas, vivendo de vícios e festas. É a decadência pós-moderna!”.

Na decadência ou não, o fato é que todos concordam que Jair Bolsonaro não se caracteriza como nacionalista verdadeiro. Parece que na histeria do "meu partido é minha pátria", alguém mentiu. Ou, na melhor das hipóteses, sua inaptidão fez com que todos os jovens que se politizaram por YouTube se enganassem.

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