— Você pode conversar com "O Porco".A frase causa estranhamento por não ser algo que se espera ouvir, assim, a sério, de um robô. Mesmo incomum, o convite é feito a quem visita a Pinacoteca do Estado de São Paulo e se depara com a obra "O Porco", de Nelson Leirner. Ao passar em frente à obra com os fones de ouvido e o app da exposição no celular, ouve-se uma voz robótica que chama para trocar uma ideia sobre o que está exposto na parede. É, a bem dizer, um guia artificial que não vai chiar quando você fizer uma pergunta estúpida ou quiser sair correndo dali enquanto ele fala alguma coisa.
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Engana-se, porém, quem acha que se trata de uma conversa engessadona como aquela que tínhamos com o Robo Ed e o saudoso clipe do Word. O objetivo, reforçado pelo programa do museu, é que o público possa perguntar qualquer coisa sem vergonha alguma e role alguma troca. Na prática, o app usa o poder de processamento do supercomputador Watson da IBM (aquele que conseguiu vencer humanos no programa Jeopardy) e consegue responder a perguntas complexas como relações com outras obras, dados biográficos e outras ainda menos óbvias, como a proferida por uma criança que questionou se "O Porco", na verdade, era parente da Peppa Pig. "Nunca ensinamos o sistema sobre este personagem, mas ele respondeu dizendo que a Peppa Pig é mais nova e se aquele animal estivesse vivo ele seria muito mais velho", me contou, com humor, o diretor de relações institucionais do museu, Paulo Vicelli, enquanto eu olhava para o quadro em questão.O jogo de cintura da máquina traduz bem o que a inteligência artificial será capaz de comunicar daqui para frente. Se a máquina é capaz de fazer isso em museus, poderá ser usada também em outros setores da sociedade que precisem de respostas rápidas e com muitas variáveis, a exemplo de guias turísticos. No caso do museu, o Watson começou a ser "treinado" em outubro de 2016. Na preparação, além de alimentá-lo com materiais e textos sobre as obras de arte, foram levantados possíveis questionamentos do público. Devido à limitação de tempo, apenas sete obras foram selecionadas. Segundo o Vicelli, a aplicação da IA foi motivada pelo baixo número de frequentadores museus: cerca de 70% dos brasileiros nunca foram a uma exposição de arte.
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O raciocínio dos donos do projeto, conforme me explicou Vicelli, é incentivar uma maior interação por meio do diálogo entre os visitantes e a inteligência artificial. O diretor explica que a iniciativa é apenas uma de várias outras que visam tornar o museu um espaço relevante para as novas gerações. Em março deste ano, o museu do futuro também foi tema de discussão no festival de cultura e tecnologia South by Southwest(SXSW). A preocupação era a mesma: como não perder a relevância em meio a tantas opções virtuais, a exemplo de museus interativos no computador e sites com obras em altíssima resolução? Apesar de não existir unanimidade quanto ao que um espaço expositivo deve fazer para se adequar à nova realidade, algumas ideias vão ganhando contorno neste horizonte: a experiência e imersão do visitante começa a ser mais importante do que o objeto exposto.
A questão é mais delicada do que parece. Enquanto artistas têm a possibilidade de nadar a braçadas largas nesse mar ao explorar novas formas de interação, o desafio maior fica na mão de museus tradicionais. A pergunta de como fazer com que uma exposição de arte do século XIX possa ser interessante para um público mais jovem parece encontrar parte da resposta na aplicação de tecnologia computacional de ponta. "A interatividade, sobre tudo com essas experiências de computação cognitiva dão esta nova roupagem para este material. É uma forma de sim atrair público, mas também conversar com essas novas gerações", comentou.
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