Foto: Caetano e Chico via Facebook ; ACM Neto, foto de Valter Campanato/Agência Brasil.
Já é carnaval em Salvador há alguns dias, mas esse ano a maior festa da cidade da música (assim eleita pela Unesco) chegou acompanhada de um impasse que tem exigido explicações do prefeito ACM Neto (DEM) e seus secretários. Uma campanha iniciada pelo músico e conselheiro da União Brasileira de Compositores (UBC), Manno Góes, e endossada por nomes como Caetano Veloso, Chico Buarque e Marisa Monte ganhou as redes reivindicando o pagamento da dívida milionária que a prefeitura tem com relação ao pagamento de direitos autorais dos compositores. A cobrança, feita pelo Ecad — instituição responsável pela arrecadação e distribuição de direitos autorais no Brasil —, é referente aos direitos não pagos pela execução de músicas em eventos como o Carnaval, São João e Réveillon.O valor da dívida, que tem origem em 2006, é de aproximadamente R$ 40 milhões. O texto da campanha informa que há dois anos o débito era de cerca de R$ 30 milhões e que foi proposto o pagamento de R$ 8 milhões, proposta recusada pelo prefeito ACM Neto. “Eu já acompanhava a inadimplência e indiferença da prefeitura, além da contínua prática de fazer eventos sem o menor constrangimento e passei a chamar atenção de outros artistas e compositores”, revelou Manno em conversa com a VICE. Em nota oficial, a prefeitura reconheceu que há um processo judicial movido há dez anos para discutir o pagamento dos direitos autorais e que aguarda uma posição do judiciário sobre o assunto.No comunicado, o órgão também argumentou que “os eventos são gratuitos, onde não há cobrança de ingressos, sendo liberado o acesso da população e o papel da Saltur (empresa pública ligada a Secretaria Municipal de Turismo e Cultura) tem sido o de proporcionar apoio técnico e operacional”, ao que os compositores responderam o que parece óbvio para qualquer produtor de eventos que sabe como funciona essa máquina de grandes festivais abertos. “Com ou sem a cobrança de ingressos, existem produtores, patrocinadores, vendas e serviços de todo tipo. Isso gera dinheiro, mesmo em um evento da prefeitura existe sempre uma empresa contratada para realizar o evento que lucra com isso e a maior parte deste dinheiro de qualquer forma jamais vai para os artistas e criadores”. O Ecad reforçou ainda que “qualquer pessoa, local ou até mesmo órgão público que utilize música publicamente deve pagar direitos autorais. Quando não há cobrança de ingresso, o valor do direito autoral é calculado com base no custo musical do evento, ou seja, os custos envolvidos em sua realização”.Nessa semana, em meio a todo esse empurra-empurra e pré-carnavais, foi inaugurada na capital baiana a Casa do Carnaval, uma espécie de museu dedicado à cultura da folia na Bahia. A Associação Procure Saber, presidida pela empresária Paula Lavigne, é uma das maiores apoiadoras da campanha e comunicou que vários de seus artistas membros vetaram o uso de suas músicas no museu. Segundo o secretário municipal de Turismo e Cultura, Cláudio Tinoco, apenas Caetano vetou a participação de suas obras no projeto, que conta com ingressos sendo vendidos a R$50. “A casa foi inaugurada com um conteúdo bastante diverso. Caetano foi o único que se opôs, com uma notificação extrajudicial solicitando que não fosse exposto na casa nenhuma música ou produto de sua composição”, afirmou o secretário. O secretário defendeu ainda que esse é um litígio que já vem de outras gestões municipais e que ainda não se tem um parâmetro objetivo de mensuração do valor dessa licença autoral”.Mesmo não estando sozinha quando se trata de desrespeito aos direitos dos artistas (só no Nordeste, o Ecad lista ainda Fortaleza, São Luís e Recife como inadimplentes), a capital baiana é a que acumula o maior valor e tempo de débito. “Sem falar que Salvador tem em sua musicalidade um de seus maiores cartões postais. Negligenciar os direitos autorais é uma grande contradição”, destaca Manno Góes.As reivindicações parecem começar a surtir efeitos, pelo menos na esfera do diálogo. Após a polêmica, o secretário Cláudio já se reuniu com o Ecad, que revelou ter chegado ao acordo de que o prefeito ACM Neto fará uma análise da situação do carnaval de 2018, mas “ainda não temos uma resposta definitiva sobre o pagamento e os débitos passados”. Segundo Tinoco, as instituições estão próximas de um entendimento para se estabelecer “um novo marco para o direito autoral em eventos públicos de Salvador”.
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