Privacidade Hackeada / Netflix.
“Quem já viu um anúncio que te convenceu que seu microfone está ouvindo suas conversas?”, David Carroll pergunta a seus alunos no começo de Privacidade Hackeada, o novo documentário da Netflix sobre privacidade de dados e desinformação na internet. Carroll ri nervoso quando quase todas as mãos da classe se levantam.A resposta é perturbadora, mas não uma surpresa – uma boa introdução para uma história sobre a Cambridge Analytica, a empresa agora infame que forneceu dados de segmentação de anúncios para a campanha de Trump na eleição de 2016. A empresa, como sabemos agora, peneirou os dados de questionários do Facebook para construir milhões de perfis psicográficos, depois os usou para hiperdirecionar anúncios para os eleitores com campanhas publicitárias personalizadas. Como o homem que fez a denúncia, Christopher Wylie, diz de maneira sucinta mais tarde no filme, a Cambridge Analytica não é uma empresa de ciência de dados, mas uma “máquina de propaganda”.
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Mas mesmo que a narrativa de Privacidade Hackeada sobre a guerra de privacidade e informação possa abrir os olhos de muita gente, o documentário não consegue mostrar o grande panorama das coisas. O “grande hack” não foi o uso mal-intencionado de dados pela Cambridge ou o fracasso do Facebook em proteger esses dados. O hack é todo o modelo de negócio do Vale do Silício, que incentiva o uso de dados pessoais para manipular o comportamento humano em grande escala.*Alguns anos antes de todo mundo ouvir o nome Cambridge Analytica, a ex-professora da Escola de Administração de Harvard Shoshana Zuboff cunhou um termo para esse fenômeno: Capitalismo de Vigilância. Como ela define, Capitalismo de Vigilância é uma “lógica de acumulação” econômica que envolve extrair dados pessoais de maneira muitas vezes irreconhecível, criando “novos mercados para previsão, modificação e controle comportamental” que exploram esses dados como seu principal recurso.Em outras palavras, esse é o modus operandi de empresas como o Facebook e Google, que dependem dos usuários fornecendo um fluxo constante de fotos, likes e outros dados úteis que podem ser usados para mapear relacionamentos, medir respostas emocionais e sim, direcionar anúncios. E quando se trata de publicidade, o santo graal da propaganda é conseguir prever o comportamento das pessoas – e assim manipulá-lo.Considere essa citação do artigo de 2015 de Zuboff, atribuída a um cientista de dados anônimo de uma empresa do Vale do Silício:
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Na conclusão de Privacidade Hackeada, ironicamente é Julian Wheatland, ex-CEO da Cambridge Analytica, que toca no que deveria ser a tragédia central do filme: que esse desastre estava codificado no próprio sistema que deu à luz ao Vale do Silício moderno.“Sempre haverá uma Cambridge Analytica”, ele confessa para a câmera. “Só é uma merda pra mim que ela tenha sido a Cambridge Analytica.”Siga a VICE Brasil no Facebook, Twitter, Instagram e YouTube.