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O Super-Homem não deveria ser branco

Isso nunca fez muito sentido pra começo de conversa.
Imagens via Wikipedia Commons.

Vou dizer uma coisa aqui. E você pode até discordar se quiser. Mas se você quiser mesmo brigar por causa disso – e eu prefiro não brigar – não vai tornar a declaração que estou prestes a fazer menos verdade.

O Super-Homem não devia mais ser branco.

Pronto, falei. Já passamos muito do ponto cultural “woke” onde precisávamos admitir isso. Claro, sabemos a história de origem do Super-Homem, quem vem lá dos anos 1930 – a mesma época em que apresentava um Jesus deficiente em melanina andando pelo deserto. Mas já superamos isso, né? É hora de parar de fazer o impossível para conservar uma história anos 80 do cânone da DC. Ninguém deveria ser tão ingênuo para acreditar que um forasteiro de outro planeta faz mais sentido como um cara branco de olho azul, certo? Claro que não.

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Mas por que estou escrevendo isto agora? Segundo a Variety, a Deadline e outros, a Warner Bros. não vai mais ficar com Henry Cavill interpretando o Super-Homem/Clark Kent. Os rumores giram em torno de questões de salário e falta de direção, mas o grande nome mencionado na conversa vermelha e azul é que Michael B. Jordan pode pegar o papel no próximo filme. Um homem negro. E olha, faz muito mais sentido.

Vamos realmente pensar sobre o que o homem de colant representa hoje em dia: uma presença branca, forte, bonita, masculina e jovem fisicamente – exemplo do que ele realmente é – um ideal norte-americano. Um herói romântico do século 20/21 que é incorruptível. Ele pousou num mundo numa espaçonave além do seu controle. Ele foi obrigado a se assimilar numa sociedade enquanto faz seu melhor para não ser visto como uma ameaça. E dentro do contexto da história de origem dele, isso não parece nada com um cara branco comum.

Os criadores originais do Super-Homem, Joe Shuster e Jerry Siegel, filhos de imigrantes judeus, pintavam uma imagem diferente. O objetivo era não só criar um herói pálido e cristianizado. Era criar tipo um Moisés que seria rotulado como um estrangeiro em seu tempo dentro do contexto norte-americano. A caracterização do Super-Homem era um ideal embalado numa possibilidade – que qualquer um poderia se tornar algo grande nos EUA.

O Super-Homem como conhecemos tem o benefício de esconder seu "outro" de um jeito que derruba o propósito de ser um alienígena.

Ser qualquer tipo de imigrante é uma mistura de felicidade por ser aceito e o estigma durador de ser diferente daqueles te cercam. Não consigo comprar a ideia de um alienígena que tem o benefício de esconder seu lado alien simplesmente colocando óculos. Meu homem pode ser um jornalista estrangeiro por um lado, usar um terno, e ter pessoas que o amam sem ser visto como uma ameaça pelo pessoal obediente às leis – sua cara branca, olhos azuis e maxilar de ferro perfeitamente esculpido garantem a ele o privilégio da consideração. Um Super-Homem negro nunca seria tão bem-aceito. Ele se encaixaria mais na linha da visão original de Shuster e Siegal, de ascender sobre o status de “alienígena” para se tornar algo maior – uma esperança que os EUA diz promover desde sua fundação. Esse ideal tem mais verdade sem essa fundação branca.

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O pretexto, contexto e qualquer maldito texto racial para quem é contra um Super-Homem negro deveria ser óbvio pacas agora (preconceito racial). Claro, no lado válido da discussão, entendo o problema comum com troca de raças. Se alguém decide tirar o tempero do Pantera Negra e transformá-lo num cara branco grisalho, isso arrancaria a própria coisa que o torna um personagem extraordinário do cânone. Seu reino foi construído sobre uma fundação de excelência negra que cospe na cara da colonização branca. Esse é o ponto. Também entendo por que o público prefere que um homem negro tome posse de um personagem originalmente negro, em vez de só pegar carona na história de um cara branco (na verdade já tivemos um Super-Homem negro de outro universo e até kriptonianos negros).

O super-homem “branco”, no entanto, é só um cara que foi sendo embranquecido e tornado messiânico com o tempo. Ele não tem mais nenhuma conexão com sua intenção original. O que aconteceu foi que cada vez mais ele foi se tornando um modelo cansado e datado – uma propaganda fictícia pensada para prolongar a crença cor-de-rosa de que branco é igual a grandeza, bondade, inocência e sorte.

Em se tratando disso – colocando de lado a ideia básica da “ciência de absorção de sol da melanina” – quero o que parece real nessa história de origem. Quero ver a arte refletindo a vida do jeito como nossa natureza humana é ter medo de pessoas que não entendemos. Quero um Lex Luthor estilo skinhead dizendo ao Super-Homem negro que ele teme tudo que ele também não entende.

Mas dane-se a cor do próximo Super-Homem. Só estou cansado de fingir que ele é melhor quando é branco.

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