'Bleach' prova que é possível fazer bons live-actions de animes
Imagem: ©Tite Kubo/Shueisha ©2018 “BLEACH” Film Partners. Composição via YouTube.


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'Bleach' prova que é possível fazer bons live-actions de animes

'Bleach' estreou nos EUA semana retrasada, e pode abrir caminho para uma melhor representação do anime nas telonas.

Gostar de anime é legal agora, mas com sua ascensão na cultura ocidental uma tendência constrangedora se seguiu, com Hollywood tentando capitalizar sobre os fãs com remakes de grande orçamento das franquias mais amadas. As ruas de Los Angeles ainda estão sujas do sangue fiscal de fracassos de público e crítica como Dragon Ball Evolution e A Vigilante do Amanhã: Ghost in the Shell. O remake de M. Night Shyamalan de Avatar, O Último Mestre do Ar – em si um desenho animado americano em estilo anime – é sinônimo de filme ruim.

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Com isso quero dizer que adaptar o meio dinâmico, criativo e que distorce a realidade do anime para um formato live-action é difícil pacas. Mas tenho que dizer que no final de semana assisti a estreia nos EUA da nova adaptação live-action de Bleach, uma das séries de anime e mangá mais populares de todos os tempos, e o filme é bom mesmo.

A graça de Bleach são as lutas artísticas e altamente conceituais entre personagens absurdamente teimosos usando espadas enormes. A história acompanha Ichigo Kurosaki, 15 anos, que é jogado num mundo mágico quando uma Ceifeira de Almas fantasmagórica chamada Rukia Kuchiki fica ferida e transfere seus poderes para ele. Os ceifeiros guiam os mortos para o próximo mundo e impedem espíritos corruptos chamados Hollows de infestar as almas dos vivos. Eles treinam por séculos para desenvolver reflexos sobre-humanos e transformam suas espadas em armas altamente customizadas chamadas zanpakuto. Ichigo usa os poderes de Rukia para proteger a ela, sua irmã e seu pai solteiro de um Hollow ensandecido, mas a Ceifeira não consegue recuperar seus poderes depois. Ela está presa no mundo humano, mascarada como uma colegial normal, o que dá início à série.

O novo filme do diretor Shinsuke Sato comprimiu toda essa informação, mais eventos básicos de 19 episódios do anime, num filme facilmente digerível de 90 minutos. E incrível de assistir. Os figurinos são foda, a ação é surpreendentemente crível considerando as armas, e a atuação espelha de maneira excepcional a variação entre passividade estoica e emoções extrapoladas.

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E essa não é só minha opinião. Observei a reação de um cinema lotado de fãs que riram das piadas, se impressionaram visivelmente com as lutas e comemoraram quando Ichigo e cada um dos seus amigos – e inimigos – eram introduzidos. Todo mundo com quem falei depois da exibição estava animado. “Todas as reações que eu queria que a audiência tivesse, eles me deram”, Sato disse através de um tradutor na sessão de perguntas depois do filme no festival anual da Japan Society, o Japan Cuts.

©Tite Kubo/Shueisha ©2018 “BLEACH” Film Partners

Sato e o roteirista Daisuke Habara passaram mais de um ano imaginando como encaixar o enredo numa única experiência em filme. “Colocar algo tão grande – o mundo de Bleach – em algo tão compacto foi uma tarefa bem difícil”, ele disse. É um processo que Sato aperfeiçoou durante anos de carreira adaptando animes, como o igualmente famoso mistério de assassinato sobrenatural Death Note – não a versão da Netflix e Willem Dafoe – além de séries de ação absurdistas como Inuyashiki e I Am a Hero. “Eu tinha uma imagem na minha cabeça de todas as coisas que queria incluir, mas não queria copiar exatamente o anime ou o mangá, eu queria fazer outra coisa”, disse Sato. É uma linha que todo artista tenta trilhar quando adapta qualquer texto para um novo meio.

O moderador Peter Tatara, ex-diretor de conteúdo da Comic Con de Nova York e fundador da Anime NYC, disse a VICE que é particularmente desafiador para um cineasta ocidental adaptar desenhos japoneses. “Uma equipe criativa japonesa entende as nuances e tem um respeito por como o original funciona – coisas que uma equipe ocidental pode não entender totalmente. Parte do apelo do mangá e anime é seu estilo japonês único, e uma equipe japonesa pode conseguir preservar isso inerentemente.”

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©Tite Kubo/Shueisha ©2018 “BLEACH” Film Partners

Kim Kindya, jornalista e editora freelance de 49 anos que sentou atrás de mim durante o filme, concorda com o sentimento de Tatara. “Bleach capturou o espírito do anime e do mangá. É uma adaptação respeitosa”, ela me disse.

Um bibliotecário de 27 anos chamado Chris, que preferiu não dar seu sobrenome, disse: “Certos riscos criativos, seja no elenco, roteiro ou direção, podem estragar a experiência para um fã. Você não tem que manter 100%, mas Bleach conseguiu manter muita coisa”.

Noelle Webster, uma funcionária da Marvel de 28 anos que assistiu a exibição, disse: “Passar de um anime para live-action é uma questão de tornar as coisas mais realistas. Você tem que ancorar a história em algum tipo de realidade. Pegar uma história fantástica e a tornar mais crível, mas também manter a vibe divertida estilo super-herói, é difícil, então nem sempre é algo bem feito”.

Kristina Winters, uma consultora de vendas de 37 anos, acrescentou: “Eles conseguiram manter o cerne dos dois personagens principais e as coisas simples”.

Fora do cinema, meios de comunicação voltados para o público nerd disseram que o filme não era só bom, mas bom para todo o mundo do anime em live-action. Mesmo o criador do mangá Bleach original ficou feliz com a adaptação.

Um grande contraste com Ghost in the Shell, por exemplo, que recebeu críticas por não ser autêntico além do pecado capital do whitewashing da fonte original. Emily Yoshida escreveu para o Vulture que o filme “é obcecado com a ideia que a Major 'Mira' precisa destravar sua verdadeira identidade para derrotar o sistema, uma narrativa muito americana encaixada de qualquer jeito na história original… Os cineastas não levaram em consideração a conexão emocional e intelectual que os fãs já tinham com essa propriedade, e colocaram todos seus pitacos na estética. É exaustivo assistir eles tentando fazer a curadoria das partes do original japonês que achavam dignas de manter e quais descartar”.

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Há oito longa-metragens de animação de Ghost in the Shell, quatro videogames, três séries de animação e três livros. Apesar da riqueza de inspiração, ninguém está pedindo uma sequência da adaptação do live-action. Mas uma das perguntas mais aplaudidas para o diretor de Bleach foi “Vocês querem fazer uma sequência no futuro?”

“Quero muito fazer uma sequência, e é algo que os fãs estão esperando, eu adoraria falar com meu produtor sobre isso”, disse Sato. Os fãs foram à loucura.

Futuras exibições do filme distribuído pela Warner Bros. Japão ainda não estão confirmadas, mas você pode assistir o anime Bleach na Netflix, Hulu, Crunchyroll e mais.

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