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Drogas

Para este médico brasileiro, canabidiol pode substituir o Rivotril

Neurologista que estuda o uso do CBD, substância derivada da cannabis, defende que a produção em larga escala diminuiria os custos da saúde pública.
O neurologista Eduardo Faveret
O neurologista Eduardo Faveret. Foto: arquivo pessoal

A promessa de uma vida sem estresse fez com que, nos últimos anos, os brasileiros se apegassem a medicamentos à base de clonazepam, sendo o Rivotril o mais popular deles.

Para se ter uma ideia, de outubro de 2017 a setembro de 2018 foram comercializadas 26,7 milhões de caixas de medicamentos com essa composição, um crescimento de 4,07% em relação ao volume dos doze meses anteriores. Há 10 anos, eram vendidas só 29 mil caixas por ano. Os dados são da auditoria de mercado Pharmaceutical Market Brazil (PMB), feita pela IQVIA, responsável pelo levantamento oficial de vendas no Brasil para a Anvisa.

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Até pouco tempo, o medicamento tarja preta figurava entre os 20 mais vendidos nas farmácias brasileiras, segundo a Associação Brasileira da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), mesmo sendo controlado – ou seja, que só pode ser vendido com prescrição médica. A Roche, fabricante do Rivotril, não quis se pronunciar sobre esse crescimento astronômico.

O Rivotril que vem da maconha

O canabidiol (CBD - que é uma das substâncias da cannabis sativa, nome científico da maconha) poderia, no futuro, substituir o Rivotril, segundo Eduardo Faveret, médico neuropediatra e coordenador do centro de epilepsia do Instituto Estadual do Cérebro Paulo Niemeyer (IEC), do Rio de Janeiro.

Tramita no Senado atualmente um projeto que visa mudar dois artigos da Lei nº 11.343/06, conhecida como Lei de Drogas: autorização para importação de plantas e sementes, o plantio, cultura e colheita de cannabis sativa, apenas para fins medicinais ou científicos e a permissão para semeio, cultivo e colheita por associações de pacientes ou familiares de pacientes que fazem uso da planta, mediante prescrição médica.

A VICE conversou com o neurologista, que conduz estudos com o uso do CBD em pacientes, para entender como essa substituição seria possível. Confira:

VICE: O senhor pode explicar um pouco como funciona a pesquisa que vem conduzindo?
Eduardo Faveret: Até agora fizemos testes individuais em 300 crianças e adultos que representam diversos casos, com a sistemática de colher exames. Vamos começar três pesquisas no IEC, controladas com placebo, até para eventual registro de medicamentos na Anvisa. Os projetos devem iniciar em março.

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Quais são os resultados das pesquisas já realizadas?
Nos testes que fizemos em pacientes com autismo, notamos algo em torno de 80% de melhora bem significativa. A experiência que temos até agora bate com a literatura. Em 85% das pessoas com epilepsia de difícil controle, mais de 50% respondem com redução das crises, sendo que 40% têm melhora de 80%, e quase 20% podem ter as crises totalmente controladas. No entanto, esses resultados são em pessoas refratárias, que já tomaram diversos remédios, fizeram cirurgias, dietas ou outros tratamentos.

É possível substituir medicamentos como o Rivotril pelo CBD?
O CBD tem propriedades naturais que substituem o Rivotril. Não há relatos de dependência e tem efeito positivo sobre atenção e memória. Também não há efeitos colaterais graves e, nesse sentido, torna-se uma substância com capacidade de substituir diversos outros medicamentos neurológicos, não só o Rivotril. O CBD tem um espectro de atuação amplo na psiquiatria: diminui os déficits de atenção e de memória, bem como os sintomas depressivos ou psicóticos que possam existir. O CBD tem esse potencial, mas isso não foi testado.


Assista: 'Baseado em Fatos: a legalização da cannabis no Brasil'


Quais os benefícios dessa substituição?
Ele diminui a vontade de fumar, de usar maconha. É um antídoto perfeito para o Tetrahidrocanabinol (THC – a parte alucinógena da cannabis sativa). Tem um potencial para que isso aconteça, mas não é algo que formalmente foi atestado em estudo controlado. É uma experiência ainda pequena, mas tem potencial e, na prática, a gente conseguiu trazer alguns pacientes.

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Então não causa dependência e nem dá barato?
Não, muito pelo contrário, ele trata essas ações psíquicas e diminui a onda do THC, eventualmente corta por completo, dependendo da proporção. Alguns estudos mostram que, dependendo da dosagem, já não tem efeito nenhum.

Quais outros remédios poderiam ser substituídos?
O CBD tem vários componentes bons, reduz resistência periférica, aumenta colesterol bom, diminui aquele apetite ansioso, controla questões metabólicas de quem está próximo à diabete e ajuda a tratar doenças autoimunes, além de um efeito potente anti-inflamatório. Os efeitos globais dele na pessoa são bastante interessantes, pois tem efeitos protetores antioxidantes como vitamina C e E, mas sem aqueles efeitos colaterais. Outra coisa interessante é o combate à osteoporose, pois firma e consolida a estrutura óssea.

Qual seria o impacto dessa substituição na saúde pública?
Rivotril é uma droga barata, mas no sentido qualitativo, (o CBD) trata-se de uma melhora interessante. Na saúde pública, quando pudermos produzir em larga escala no Brasil, reduzirá significativamente o custo da saúde, pois substitui anti-inflamatórios, remédios para dor, como morfina, tratamentos para osteoporose, artrites etc. Às vezes, a pessoa toma um remédio para cada problema desses, aí vem uma substância que equilibra o corpo e pode reduzir ou retirar diversos desses medicamentos. Pode ocasionar, também, uma redução de internações e do uso de outros medicamentos que têm diversos efeitos colaterais que seriam evitados. Seria um impacto significativo.

As pessoas podem fazer essa substituição por contra própria?
Depende da razão pela qual está usando o Rivotril, e a suspensão precisa ser gradual, ajustando uma série de questões. Pode trocar, aos poucos, por meditação ou ioga, para ajudar a equilibrar. Idealmente, ela deve ser assistida por alguém. Até porque se ela está tomando Rivotril, algum médico deve estar prescrevendo para ela. O profissional vai avaliar o que substituiria melhor a medicação para aquele paciente: medidas ambientais e fitoterápicos ou o próprio CBD.

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