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Música

A História do Dohrn, ou Como Kate Nash Começou a Curtir Death Metal

A Alicia Warrington já tocou com todo mundo, desde Kelly Osbourne até a Selena Gomez. Ouça sua nova faixa "Levels of Hate", de seu novo projeto de death metal, Dohrn.

Crédito: Dohrn

Um dos mais doces prazeres que um fã dedicado de música pode ter é aquele momento quando você descobre que conseguiu fazer com que aquela pessoa querida se interesse por uma de suas bandas favoritas. É um triunfo – “Viu, eu disse que eles eram demais!” – e uma experiência de ligação, algo que tem um peso todo especial para nós que passamos nosso tempo ouvindo música as quais os outros teriam dificuldade. E foi assim que Kate Nash começou a curtir death metal.

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“É engraçado porque ela nunca tinha ouvido death metal na vida até me conhecer”, conta o cérebro por trás do Dorhn, Alicia Warrington, em meio a risadas. Alicia tocou bateria na banda de Kate no ano passado. “Tocamos em São Francisco e tínhamos um dia livre. Estava chovendo e ela quis ficar no hotel e alugar um filme… Então fiz ela assistir a Until the Light Takes Us. Estamos ali aninhadas no sofá, está chovendo e estou mostrando à esta estrela pop britânica o mundo do black e death metal. E ela estava tipo ‘mas peraí, por que eles estão queimando igrejas? Não entendo!’ [risos] E diz: ‘Você é maluca! Você cresceu com isso? Era isso que fazia na adolescência?’ Agora estou compondo e gravando o EP do Dohrn sozinha e tenho mandado coisas pra ela, no esquema ‘ei, pode ouvir isso aqui antes de eu finalizar?’ e ela responde ‘olha só, agora sou especialista em death metal!’

Continua…

O novo projeto de Warrington tem pouco a ver com as batidas que toca para Nash e para uma constelação de clientes de alto nível. Ela já apareceu no American Idol, The Tonight Show, MTV, Top of the Pops, The Ellen DeGeneres Show, em filmes, rodou o mundo, e tocou em outras bandas próprias também. Seu currículo é um verdadeiro quem é quem do estrelato pop — Kelly Osbourne, Selena Gomez, Tracy Chapman, Dawn Robinson da Wn Vogue, um monte de vencedores de reality shows como Colton Dixon do American Idol e Chris Rene do The X Factor e até mesmo uma jovem Miley Cyrus, na época de Hannah Montana. Inclusive, ela sacou que a metamorfose de Miley aconteceria.

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“Previ que ela ficaria meio doida. Quando trampei com ela, até comentei que era uma garotinha, mas espere mais uns dois anos e ela vai pirar!”, ri Warrington. “Cantei essa pedra mesmo. Rebolando pra cacete. É engraçado, trabalhei dois anos com ela fazendo as paradas da Hannah Montana. Acho que ela tinha uns 15 anos ou algo assim na época, e é engraçado ver ela explodindo assim. Eu sabia que ela seria grande, e ela tá fazendo o lance dela. Eu não curto muito não”. Warrington nunca conseguiu fazer com que Miley pirasse num metal e ela não fala muito de seus gostos musicais para grande parte dos seus clientes na Poplândia, mas diz ter criado uma amizade com Kelly Osbourne por meio de seu background metálico, e claro, temos aí também a recém-descoberta apreciação do death metal de sua empregadora. “Fiz a Kate Nash ouvir metal, é tudo que você precisa!”

Dohrn, o novo projeto de death metal de Warrington, é old-school sem soar regressivo, inspirado pelas bandas que cresceu ouvindo enquanto adolescente metaleira em Saginaw, Michigan. Ela começou a fazer turnês aos 15 anos de idade, tocando em bandas como Purgatory, Consumed, e Dropping the Messiah, com quem lançou um disco em 1995 e ganhou alguma notoriedade nas revistas Metal Maniacs e Sounds of Death. Ela também era uma trocadora de fitas ávida, citando joias raras de bandas como Amputus e Sarcophagus (cujos integrantes acabaram tocando em uma impressionante série de grandes bandas underground, de Broken Hope e Krieg a Dying Fetus) entre suas valorosas posses, e descreve ter crescido em um lar onde seus discos do Mortician e Immolation ficavam de boas ao lado das fitas do Quiet Riot da sua irmã e discos de R&B da sua mãe.

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“Comecei a tocar bateria ouvindo Queensrÿche e Dokken”, lembra. “Pirando num Dokken! Sempre ouvi de tudo, de Dolly Parton a Suffocation, mas metal é o que eu curto mesmo. Fui meio que criada com base nisso aí – metal. Toco bateria há 20 anos, mas no Dohrn faço tudo. Odiava aulas de guitarra. Só queria parar e tocar todos os solos do Testament, e quando eu não conseguia fazer isso, me desmotivava. Então meu tio – que era um desses caras do metal brega oitenta, construiu um palco na casa dos meus avós. E aos 11 anos, desci lá um dia e era tipo um show – tinha uma máquina de fumaça, um PA, uma bateria Ludwig de 16 peças com bumbos de 28 polegadas e eu pensei ‘mas que porra’. Tinha ido lá pra tocar com ele e deixei a guitarra de lado. Ele botou uma fita pra rolar. Aí começamos a tocar junto daqueles sons e eu tirei de cara. Aí implorei um ano inteiro pra que mamãe me desse uma bateria. E com 12 anos descobri Obituary e Cannibal Corpse!”

Sua mãe ainda é uma grande influência – e uma baita headbanger. “Ela sempre escuta a Liquid Metal, rádio favorita dela. Ela também curte thrash das antigas, Sepultura, Six Feet Under. Ela passou por aquela fase de ‘isso é do mal, não quero na minha casa’ e aí começou a frequentar os shows e tal, sempre lá na frente com sua câmera”, conta Warrington. “Então mandei os últimos sons que compus pro EP pra ela, e ela disse que soa tudo meio assustador, o que interpretei como elogio [risos]. Ela disse que meus vocais soam mais aterrorizantes do que nunca. E eu respondi algo como ‘ótimo! Está perfeito”.

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Demorou alguns anos para que a jovem Warrington dominasse o blastbeat, mas agora ela faz parecer fácil. O som do Dohrn remete à metade dos anos 90, com mais influências de Six Feet Under e Amon Amarth que as bandas com –tion no nome que caracterizam o som “death metal da velha escola”.

“É cheio de riffs, tem muita guitarra. Sou muito influenciada por Bleed For Us To Live do Gutted e Left Hand Path do Entombed, além de coisas antigas do Hypocrisy. Tenho ouvido muito disso e acho que isso transparece nas próximas faixas. Queria fazer um disco que eu quisesse ouvir, como as coisas de metal que sinto falta”, disse. Dohrn soa exatamente como se espera de uma banda de alguém que trocava fitas de death metal nos anos 90, voltou à ativa e eventualmente cita Hacked Up For Barbecue no meio de uma conversa. A faixa que estreamos pelo Noisey, “Levels of Hate”, tem uma pegada mais black metal, mas as duas fazem parte do EP de estreia da banda, End of Days.

Warrington tem brincado com a ideia de sair de trás da bateria e lançar sua própria banda há mais ou menos um ano, mas uma folga na turnê de Kate Nash lhe deu a oportunidade certa para que ela pudesse trabalhar.

“Estava ficando cada vez com mais raiva da música e do estado da indústria musical e do mundo – racismo, sexismo, anti-feminismo. Queria representar alguma dessas coisas e trazer um pouco de feminismo no metal, que é algo que falta no gênero”, explica. “Quero ver mais mulheres fazendo isso. Você vê um monte de meninas pop e tal, mas no metal não vejo nada, ainda mais garotas negras. Quis me expor e ficar na frente, e ser uma voz positiva, por assim dizer. Alguém tem que dar as bases, e acho que a mídia tem que ajudar. Participei recentemente de um debate sobre mulheres na música em geral, e a grande questão era ‘como fazer mais mulheres tocarem?’. Bom, o público com o qual falei era 90% feminino, então claro que tem público; as revistas grandes não dão o espaço necessário, porém, então as pessoas não creem que estamos presentes em locais que estamos”.

Como comentado pela própria, faz muito sentido ter raiva agora, e querer fazer algo com isso. “Com toda essa loucura rolando – a polícia distribuindo porrada, eles sempre fazem isso, mas agora você vê no noticiário – quero cantar sobre isso. As pessoas parecem ter emburrecido com a música que chega pelo rádio e pela grande mídia. Nos anos 90, tínhamos o movimento riot grrrl e outras épocas contaram com outros movimentos. Sinto que agora as pessoas passaram boa parte dos anos 2000 preguiçosas, e é hora de mudar”.

O EP de estreia do Dohrn 'End of Days' EP será lançado em breve; enquanto isso, fique de olho no Bandcamp e página no Facebook para mais informações.

Kim Kelly está recrutando integrantes para a máfia metálica feminista no Twitter: @grimkim

Tradução: Thiago “Índio” Silva