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Todas as fotos por Matias Maxx/VICE Brasil

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Drogas

Por dentro da principal feira de negócios da indústria de cannabis legal no Brasil

Ainda na clandestinagem, a sexta edição da Pot in Rio levou à cidade maravilhosa turistas e empresários que estão investindo a sério na cultura canábica.

Conteúdo possibilitado pela parceria com a Bem Bolado.

O mercado legal da cannabis já é uma realidade em muitos países do mundo, e no Brasil não é diferente. Enquanto o uso medicinal vem sendo regulado pela Anvisa a passos de formiga, empresários, ativistas e canabistas em geral se movimentam criando marcas, eventos e muito conteúdo. Como era de se esperar, São Paulo reúne o maior volume, no entanto o Rio de Janeiro ainda norteia esse movimento com “coffee-shops”, lojas aonde a erva não é vendida mas seu uso tolerado, pipocando por toda cidade desde 2006. Pode ter a ver com a personalidade escrachada e desafiadora da ordem do carioca, ou talvez tenha a ver com as latas que chegaram ao litoral da cidade em 1987, mas definitivamente não é a toa que na mesma cidade tenha surgido o Planet Hemp em 1994, o Growroom e a Marcha da Maconha em 2002 e o Pot in Rio em 2012.

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A feira clandestina que começou reunindo 250 pessoas num sítio na Zona Oeste carioca, chegou este ano à sua sexta edição com 42 expositores e 29 apoiadores. No primeiro fim de semana de julho, 12 mil pessoas entraram num porão escuro e enfumaçado no centro da cidade para saírem de lá totalmente chapadas.

Foto: Matias Maxx/VICE Brasil

O encontro, que já provocou processo por parte do empresário Roberto Medina do Rock in Rio, é hoje o principal evento brasileiro de negócios da indústria de cannabis legal e atrai muita gente de fora da cidade exclusivamente para viver essa experiência canábica, não só dentre expositores (mais de 60% de fora do Rio) como visitantes.

O professor Thiago Pereira, coordenador do Núcleo de Estudos sobre Turismo de Drogas da UERJ, submeteu formulários a 298 visitantes do Pot in Rio com várias perguntas, dentre elas de onde vinham, se tinham ido a cidade só para o evento, e se já tinham visitado outros lugares somente atrás de um turismo canábico. "Ainda não concluímos a apuração, mas ouso dizer que pelo menos 10% dos visitantes vieram ao Rio somente para esse evento". A VICE trocou ideia com alguns desses visitantes tentando entender suas motivações para visitar o Pot in Rio.

Foto: Matias Maxx/VICE Brasil

Thálita Galutti, empresária, São Paulo

VICE: O que você veio fazer no Pot in Rio?
Thálita: Eu vim apresentar a Jonha ao Rio de Janeiro, uma marca voltada pra minas e público LGBTQ, e a gente acha que a Jonha é a cara do Rio. A primeira coleção vem com uma pegada muito colorida, muito divertida, muito animada e a gente estava louca para mostrar nossos produtos para a galera do Rio.

O que a cena do Rio tem de diferente da cena de SP?
Eu acho que tem um pouco a ver com a cultura do próprio carioca, se bobear. Em termos de negócios, eu vejo que tem lugares, tabacarias mega bacanas e fortes. Eu tenho uma sensação que aqui tem uma cena mais antiga, mas eu acho que os cariocas são mais soltos, mais leves, mais tranquilos em como lidar com tudo e isso tem a ver como é a cena carioca aqui.

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E por que você escolheu esse público LGBTQ canábico em especial?
Eu fui para a Expocannabis no Uruguai em 2016, como pesquisadora do mercado para colher insights, ideias e referências, e procurando uma roupa pra mim, uma legging, encontrei na feira inteira apenas uma peça, de numeração P que não me serve, bem naquela estampa clássica, base preta com folha de cannabis verde que você encontra na China. Então eu pensei: "Meu, aí tem uma lacuna no mercado, não tem um produto que seja pensado para as minas maconheiras". Eu vi lá por exemplo um pipe que era um salto alto com umas bolinhas amarelas, tipo escroto, aquilo não me representa. Então a Jonha nasceu pra isso, representar um pouco mais os gostos femininos, gays e afins nesse mercado em que a gente não se sentia, e ainda não se sente tão representadas.

Foto: Matias Maxx/VICE Brasil

Gilberto Castro, designer, São Paulo

VICE: Por que você veio ao Pot in Rio?
Gilberto: Pô, mano, finalmente consegui chegar aqui. Teve vários anos que eu queria vir, mas sempre tava meio calor. Dessa vez calhou de ser no meio do inverno e eu falei “não posso perder”. Tá quente, mas a intenção foi boa. Eu tenho esclerose múltipla e temperatura acima de 26º já me deixa meio esquisito. Mas o Pot in Rio tá muito legal, muito top, mó festa boa.

O que que você viu de interessante até agora?
As artes do Zanon, os fertilizantes, encontrar a galera aqui do Rio, muita gente que eu já conversava há muito tempo pela internet e estou vendo agora pela primeira vez.

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Existem outros eventos totalmente voltados pra causa medicinal, aqui já é um evento mais voltado a cultura e experiência canábica. Você acha que esses dois mundos podiam caminhar mais juntos?
Na verdade, o medicinal eu acho que já é tudo isso. A maioria das pessoas aqui faz uso medicinal, não é medicinal gravíssimo que é o pessoal que normalmente eu tô junto, e são pessoas que ficam a maior parte do tempo em casa, noutra pegada. Mas acho que é tudo meio medicinal, tudo meio terapêutico, ninguém procura o bem estar para diversão, as pessoas procuram o bem estar para ficar bem, né?

Foto: Matias Maxx/VICE Brasil

El Caslu, pixador, São Paulo.

VICE: O que que você veio fazer no Pot in Rio!?
El Caslu: Vim aqui no corre de fazer um dinheiro, e pelo ativismo medicinal. Tenho um problema raro neurológico e o único remédio que tem pra mim é a cannabis. Aí eu fiz essa arte misturando a pixação com um protesto pela saúde que é precária aqui no país. O que tá salvando minha vida é esse óleo aí, fiquei um mês sem tomar e parou a movimentação do meu braço e da minha perna, ficar sem o remédio foi muito violento para o meu organismo.

É sua primeira vez no Rio? O que que você está achando?
Já conhecia o Rio, eu trabalho com hip hop e vim aqui uma vez conta de um evento que teve, e a outra fui pro Complexo do Alemão, aonde conheci o Raull Santiago, foi uma das melhores experiências que eu já tive. Subimos lá o morro, e eu fiz um grafite ao lado de uma das casas que os policiais da UPP invadem, roubam os eletrodomésticos, estupram e expulsam seus moradores. Essa imersão fez parte do Movimentos, um trampo de política de drogas pra favela. E eu vim falar do uso medicinal da cannabis e aprender com o pessoal estratégias de combate, pois quem sofre mais com isso é a favela e se nóis que é periférico e favelado não se organizar, vai só piorar…

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Foto: Matias Maxx/VICE Brasil

Henrique Santos, tatuador e designer, Cidade Tiradentes – SP

VICE: Qual sua relação com a cultura canábica?
Henrique: Então, eu sou tatuador, e trabalho com CGI e arte digital lá em Cidade Tiradentes, onde eu tenho a tabacaria Gato Preto, uma parceria que eu fiz. Então, junto o estúdio de tatuagem com tabacaria. Eu e esse meu brother a gente sempre gostou de ganja, mas depois que fizemos essa parceria que a gente começou a ver mais sobre a ganja… Porra, a gente é do extremo leste de São Paulo, lá é muita treta, tudo que é informação é difícil pra chegar, e a gente foi levando coisas diferentes do que a galera estava acostumada na quebrada, aí comecei a ver sobre essa ideia não só em relação ao lance da ganja recreativa como medicinal.

E como você veio parar aqui no Pot in Rio?
Me convidaram para expor caricaturas de algumas pessoas aqui pro evento, e a erva tem muito a ver com criação e arte. Eu mesmo curti muito a Tarja Preta, onde tinham os caras pirando com esse conteúdo aqui no Braza em várias épocas. Por isso que eu tô fazendo isso, me deram uma sugestão de algumas pessoas, infelizmente não consegui fazer mais pois deu muito trabalho fazer cada um deles, mas passar isso e sensibilizar, dar um gás, é sempre muito válido. A sociedade vê a galera que usa cannabis da maneira que a mídia põe, você vê na TV as notícias relacionadas ao assunto são sempre ruins.

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