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Música

Os graus e "vraus" do funk ostentação

Entre meiotas, bololos e páginas com milhões de curtidas, as motos são um dos assuntos preferidos do funk paulista.
MC Neguin da BRC. Foto do Facebook.

"Mãozinha para a frente, bundinha empinada/Vou dar o meu rolê na minha moto envenenada". Em 2000, em meio a uma terceira onda de popularização do funk e ápice de clássicos do Furacão 2000 como "Jonathan da Nova Geração" e "Já É Sensação",  a carioca MC Beth cantava em "Dança da Motinha" versos que previam a tendência que tomaria o funk ostentação anos mais tarde: as motos.

Vivemos em tempos de "Meiota", mas o gosto dos MCs de São Paulo pelo veículo começou a se consolidar por volta de 2010, com hits exaustivamente tocados como "Rolê de Hayabusa", do MC Dedê de São Vicente (2012) e "Megane" do paulistano Boy do Charmes (2011). "Hoje em dia, a gente tá falando das motos caras, mas se você for ver uma das coisas que teve com o surgimento dessa nova classe C foi a expansão [desses veículos]", conta Renato Barreiros; jornalista, entusiasta dos fluxos e colaborador aqui do THUMP. "No Nordeste, galera falava que antigamente o sonho era ter um cavalo, um burrinho, coisa e tal. Hoje é ter uma moto, tanto que a moto é até chamada de 'bode'."

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Do puro fetiche, a obsessão pelas motos se tornou quase esporte com o surgimento da "cultura do grau", ou seja, de empiná-las em ângulos de 90 graus em relação ao chão. Páginas do Facebook como a CaboEnrolado.com.br, com mais de duas milhões de curtidas, e a Grau e Corte, com quase um milhão, postam fotos e vídeos de empinadas que beiram o impossível. "Não basta ter a moto, tem que aparecer com ela", diz Renato.

Para o jornalista, a ligação entre a cultura do grau e o funk se torna clara principalmente nos bailes. "Se você vai no Heliópolis, Paraisópolis, eles ficam andando de moto na frente da galera nos fluxos. Isso não dá pra fazer com um carro, e é um negócio que chama muito a atenção", completa. No canal do Youtube Família do Grau, equipe de wheeling da Zona Norte de São Paulo que conta com quase 300 mil de inscritos e 700 mil curtidas no Facebook, os vídeos de grau têm trilhas dos principais MCs que cantam sobre a prática em São Paulo.

As grandes quantidades de visualizações renderam ao canal parcerias com MCs, como é o caso do MC Dê. Dênis dos Santos, de Várzea Paulista, conta que começou no "funk consciente" antes de se enveredar pelo caminho dos graus e motos. "Aí, como meus amigos todos gostam de moto e empinam, eu decidi fazer funk sobre motos e representar eles também", diz. Dênis lança suas novas faixas pelo canal da FDG – a mais recente é "Sonhador Demais".

Mc Dê. Foto: Arquivo Pessoal

Outros MCs, como o Neguin da BRC, cedem suas faixas para que a Família coloque nos vídeos. Neguin, ou David Caetano, 21, que já teve clipes lançados por canais grandes como Fonte do Funk e Detona Funk, é dono do hit "Vral", que já passa de um milhão de visualizações. "Qualquer um que curte grau sabe quem é o menino do vral", diz.

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David é natural de Osasco e diz que começou a cantar funk aos 17 anos, inspirado por MCs de sua cidade que já falavam sobre a cultura do grau. "O público de moto, hoje em dia, é muito grande. Por isso eu consegui um reconhecimento rápido", diz o MC. "Ainda não chegou a estourar esse ritmo do funk, mas estou na luta pra que isso aconteça."

Embora não tenha "estourado" segundo Neguin, os graus e vraus contaram com alguns adeptos que proporcionaram hits recente do funk, como "Meiota" do MC Kekel, de Guaianases, e o famoso "Bololo Haha", do MC Bin Laden. O hit absoluto do paulistano é símbolo de outra tendência que as motos ditaram no ritmo: a incorporação dos próprios barulhos das motos na estrutura musical das faixas, sendo o próprio "bololo" uma referência ao ronco do motor dos veículos. "Vários DJs soltam o barulho da moto como vinheta", diz Barreiros.

Na vida real, fora dos funks, os MCs se esforçam pra conseguir e manter suas motos. Dênis fala da dificuldade de manter a carreira no funk, e Neguin comenta da sua Honda 125 que foi "parada pelos polícia" recentemente. Mas segue o jogo, pois, segundo MC Dê, "é o que a gente gosta e o que nos faz feliz."

Nesta sexta, fique ligado no página da VICE Brasil para o lançamento de mais um episódio do Vice Brasil 360º sobre a cultura do grau. 

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