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Mesmo vitorioso, Temer sai enfraquecido

Deputados votaram hoje contra a denúncia da PGR que acusa o presidente de corrupção passiva.
Parlamentares bateram boca e se empurram antes da votação na Câmara. Foto: Agência Brasil.

Desde a votação do impeachment de Dilma Rousseff em 2016 o brasileiro sabe que precisa de muita energia e força de vontade para acompanhar ao vivo uma votação no plenário na Câmara dos Deputados. Nesta quarta-feira (02) os trabalhos começaram cedo na Casa: os parlamentares teriam que decidir se iriam rejeitar ou receber a denúncia da Procuradoria-Geral da República contra Michel Temer pelo crime de corrupção passiva. Um marco histórico na política brasileira, afinal Temer é o primeiro presidente em atividade a ser denunciado por um crime comum.

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Foi um longo e cansativo cabo-de-guerra até a votação começar de fato. Durante todo o recesso parlamentar Temer já se articulava com parlamentares para garantir minimamente o quórum de 342 parlamentares para a votação do relatório contra a denúncia de Rodrigo Janot, elaborado pelo deputado Paulo Abi-Ackel (PMDB-MG) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). A oposição pediu a obstrução por parte da minoria, sabendo que sem o quórum suficiente a votação seria adiada e com isso sangraria ainda mais Temer, que já sofre com a maior impopularidade da história. Outro plano da oposição foi tentar constranger o máximo possível a base aliada para mostrar a votação no horário nobre na televisão. "Os que rejeitarem a denúncia vão ser cúmplices da mala de dinheiro", afirmou Glauber Braga (PSOL-RJ) durante a orientação da bancada.

Wladimir Costa (SD-PA) tumultuou mais do que a oposição durante a segunda sessão. Ao pedir a palavra a favor do relatório, o parlamentar berrou aos quatro ventos que PT é uma "organização criminosa". A colocação foi tão descabida e gerou tanta reclamação que Maia teve que dar uma puxada de orelha no parlamentar. "Quem é Temer mostra a cara e até tatua o nome aqui no ombro", berrou mais uma vez Costa.

"Até a tatuagem é superfaturada" ironizou a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ). Infelizmente, Wlad não ostentou a polêmica tattoo conforme ele tinha prometido em uma entrevista. Para não decepcionar o público, o político continuou tumultuando antes da votação com um pixuleco inflável.

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A oposição não poupou cédulas de dinheiro personalizado com o rosto estampado de Temer para jogar durante a sessão. Deu tanto bate-boca, gente gritando sem se ouvir, que começou um empurra-empurra no plenário, fazendo o deputado Bohn Gass (PT-RS) tropeçar e cair no plenário. Em comparação à votação do impeachment, a Câmara chegou até parecer amadora.

O deputado Pompeo de Mattos (PT-RS) também brilhou nos bate-bocas. Discutiu sobre o uso da bombacha com o Mauro Pereira (PMDB-RS) e ainda mandou o aviso antes do começo da votação: "Cuidado. Não vendam a alma para o diabo, porque o diabo vem buscar", disse em alusão aos parlamentares que fizeram acordo para apoiar Temer no poder Executivo.

Às 18h21 Rodrigo Maia iniciou a votação nominal, começando pelo estado de Roraima. Reincidentes no comportamento sexista em um parlamento com pouquíssima participação feminina, deputados chamaram Shéridan (PSDB-RR) de "gostosa" quando foi chamada ao microfone. Shéridan, no entanto, estava ausente.

Em comparação à votação de impeachment, que seguiu os mesmos moldes da de hoje, os parlamentares a favor de Temer foram, diga-se de passagem, bastante contidos. O que confirma o medo de ficarem marcados para a próxima eleição. Além da estabilidade da economia, muitos parlamentares disseram defender que apoiam uma investigação a Temer no fim do mandato. Uns chegaram a invocar o perigo do comunismo e até a ideologia de gênero. Um deputado do PTB de São Paulo votou "não" e justificou: "praga de aposentado pega".

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Silvio Costa (PTdoB-PE) votou contra o relatório e criticou parlamentares que votaram "não" mas registraram a presença na casa, garantindo a continuidade da votação. "Eles estão fazendo o jogo do governo", apontou o deputado.

A sessão foi encerrada oficialmente às 21h55 - a tempo de Maia conseguir assistir a partida do Botafogo pelo Campeonato Brasileiro, como havia prometido a si mesmo mais cedo. A vitória de Temer foi relativamente folgada, de 263 a 227 (com 2 abstenções e 19 faltas), um pouco aquém dos 280 votos que gostariam os articuladores governistas, mas além dos 250 contados como cativos pelo Planalto.

No rearranjo partidário da pós votação vai ser interessante. O PSDB praticamente rachou ao meio, com 21 votos "não" e 22 "sim", além de quatro faltas estratégicas. Partidos que costumavam pender ao lado de Temer, como o PSD do ministro da Fazenda Henrique Meirelles, também não foram tão fieis (14 "não" contra 22 "sim"). Das legendas maiores, apenas o PT votou homogeneamente, com todos os seus 58 deputados declarando "não" - além dele, Rede, PSOL e PCdoB também votaram em bloco pelo "não", enquanto o PDT e o PHS computaram uma defecção cada. Do lado de Temer, além do próprio PMDB, o presidente pode contabilizar amigos no PP e PR, que registraram grande maioria a favor do Planalto. Apenas dois partidos votaram em bloco a favor de Temer: o partido-disfarçado-de-movimento-contra-a-corrupção Podemos (antigo PTN) e o PEN, que foi anunciado como futura casa do deputado e presidenciável Jair Bolsonaro (PSC-RJ).

Apesar da vitória do Planalto, os próximos capítulos seguem em suspenso. Temer vai ter que recontar os votos para entender se consegue seguir com as reformas, enquanto Rodrigo Janot avalia se vai encaminhar mais uma denúncia contra o presidente (ele havia prometido até três denúncias diferentes). Com a casa armada na CCJ, é possível que Temer siga se desvencilhando das "flechas" de Janot, mas seu desgaste - e o desgaste dos deputados que o apoiaram, que pode ser atestado pela velocidade que alguns parlamentares votavam "sim", evitando aparecer nas câmeras da TV Câmara - pode colocar ainda seu governo em risco.

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