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Jesus Queer: Uma Cartilha da Teologia LGBT

Apoiada por caras como Slavoj Zizek e Terry Eagleton, a teologia queer dá uma chance aos LGBT.

Foto via Flickr daameriva.

O Cristianismo é geralmente considerado, por quem não é cristão, como uma coleção imutável e estática de histórias usadas por instituições para tentar ganhar poder. Não é segredo que lésbicas, gays, bissexuais e pessoas trans têm que suportar o peso do lado negro do cristianismo nos Estados Unidos e em muitos outros lugares. Quando as pessoas queer se referem a Jesus, geralmente é como piada (“Se Jesus odeia os gays, por que os fez tão fabulosos?”). Agora, as pessoas LGBT estão tendo outra chance na Paixão de Cristo por meio da teologia queer.

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Juntamente com o apoio de críticos culturais respeitados como Slavoj Zizek e Terry Eagleton, e a influência cada vez maior da igreja emergente (um movimento teológico radicalmente aberto e não conservador), a teologia queer apresenta uma nova “leitura” da escritura clássica. É um movimento que reconhece e explora as bases sexualizadas e de gênero do cristianismo, assim como as oportunidades para examinar a cultura através do pensamento religioso queer.

Confinada anteriormente à teorização acadêmica seca e adornada com a prosa ruim típica das grandes ideias, a teologia gay agora é uma abordagem praticável e devocional. Essa nova abordagem foi fundada pelo Pastor “Shay” Shannon T.L. Kearns e Brian Murphy, e seus muitos projetos incluem um acampamento teológico queer, missas na Casa da Transfiguração e grupos de estudos bíblicos.

A teologia queer não busca analisar se as pessoas LGBT podem ou não se encaixar nas comunidades cristãs. Isso visa criar ativamente uma nova teologia, na qual a Bíblia é interpretada através das lentes da experiência queer, trans, gay e lésbica. Então, quando surgem questões como “Jesus amava as pessoas gays?”, Kearns me disse: “Francamente, estamos além disso. Quando as pessoas nos forçam a ter sempre a mesma conversa, não conseguimos abraçar nossa identidade completamente”.

O padre Shay nasceu num corpo feminino e foi criado como uma garota numa casa evangélica, chegando por fim ao entendimento de que sua vida seria enriquecida se ele assumisse o gênero masculino. “Se eu tivesse nascido um homem cisgênero (ou seja, nascido num corpo masculino que se identifica como masculino), eu teria sido um babaca”, disse, mencionando a tendência dos evangélicos em criar homens jovens brancos para serem missionários conservadores.

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As experiências de Brian Murphy como um homem que se identifica como queer têm um tom similar. Sua história é familiar para as pessoas queer – primeiro se debatendo com sua educação religiosa e, depois, com grupos cristãos universitários dos quais ele tentou participar. Tanto Kearns como Murphy viram que eram diferentes dos outros cristãos, e trabalharam para tentar entender onde seu mundo queer e o impulso religioso se encontravam. Em vez de se afastar da religião, como muita gente LGBT faz, eles decidiram recriá-la.

No entanto, isso levanta a questão: Por que não se afastar e largar o Espírito Santo de uma vez? Por que se voltar para Deus e a Bíblia, depois de toda a fricção que isso causa em tantas pessoas queer?

“O cristianismo é a tradição de onde venho, e como isso geralmente costuma oprimir as pessoas LGBT, acho esse um lugar importante no qual trabalhar”, me disse Murphy. “O cristianismo tem uma longa história sendo usada para o mal, mas também pode ser fonte de inspiração e libertação. Há um chamado profético pela justiça, libertação de escravos, cancelamento de débitos… Jesus era anti-imperialista.” Esse é o mesmo aspecto revolucionário do cristianismo que os filósofos pós-modernos queriam salvar.

Diferente de muitos ateus que sentem uma pontada de dúvida e largam completamente a religião, o questionamento e a incerteza levaram o padre Shay a fundar sua paróquia. “A dúvida me levou de um lugar para o outro”, ele disse. Seja de dentro de seu corpo, renovando sua fé, ou quando ele percebeu que, diferente do que os cartazes diziam, Deus não odeia os gays. Para ele, a dúvida é um componente crucial da experiência religiosa, não um esquema simplista à la Dawkins que acaba com a fé.

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Então, não é surpresa que a história de São Tomé seja uma das narrativas bíblicas favoritas de Kearn e que sirva como um grande exemplo de “leitura queer”. Tomé, que tocou as chagas de Cristo, ecoa as cicatrizes de cirurgia que muitas pessoas trans têm. “Tomé tocou as chagas, e a resposta de Jesus foi gentil e compreensiva. É uma lição para que eu seja paciente e gentil com as pessoas que não entendem a experiência trans.”

É o tipo de entendimento que eles explicam no grupo de estudos bíblicos queer e em seu retiro, o Acampamento Osíris. Todos os acampamentos de verão são um pouco homoeróticos, mas o propósito do Acampamento Osíris é trabalhar com ativismo, guiar pessoas queer por meio de oficinas e discussões sobre as histórias pessoais dos participantes com a religião. Ser queer e religioso pode significar isolamento, então o acampamento fornece uma comunidade também. “Às vezes”, Padre Shay me disse, “sinto que tentar fundir crença evangélica e liberalismo me deixou de mal com todo mundo”.

É exatamente isso que torna a teologia queer tão importante. Unir forças aparentemente incomensuráveis possibilita mudanças grandes e poderosas. Geralmente, esse tipo de ponte cultural é feita com humor, então, não é de se surpreender que muitos temas da teologia queer também sejam encontrados em cutucadas bíblicas. Rimos do fato de o Novo Testamento ser sobre um cara que andava com doze caras e uma prostituta, ou que o Velho Testamento termine com uma mulher comendo uma fruta. Com a plena consciência da teologia queer do sexo, do corpo, da abertura, tudo isso se torna não apenas engraçado, mas ganha um novo significado.

“Quando vi que minha fé não tinha que ser uma reação”, me disse Murphy, “percebi que a questão para os cristãos gays não estava em como eles poderiam se encaixar no cristianismo, mas o que eles têm a oferecer ao cristianismo e ao mundo”.

@ConnerHabib