As vozes femininas que trazem ânimo à cena musical de SP
Anelis Assumpção. Foto: Mel Coelho/VICE

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Radiografia Urbana

As vozes femininas que trazem ânimo à cena musical de SP

Mulheres que traduzem sonoramente a diversidade cultural da cidade. Anelis Assumpção, Drik Barbosa, Iara Rennó e Luísa Maita falam sobre os seus novos álbuns a caminho.

Este conteúdo é um oferecimento Natura Musical.

A revitalização da MPB atualmente em São Paulo deve muito à atuação das mulheres. Entre os artistas moradores locais mais criativos dos últimos anos, muitas vozes femininas surgiram entre os destaques. Basta pensar em nomes como Alessandra Leão, Anelis Assumpção, Ava Rocha, Bárbara Eugênia, Claudia Dorei, Drik Barbosa, Iara Rennó, Luisa Maita, Xênia França e outras. Isso é muito revigorante. É como se São Paulo estivesse seguindo o exemplo do Rio de Janeiro, que durante um bom tempo foi residência predileta das cantoras, onde eram maiores as oportunidades de deslanchar na carreira. Uma das poucas exceções estelares talvez tenha sido Elis Regina, que viveu e morreu na capital paulista.

Mas esse “monopólio” artístico carioca acabou de uns anos para cá. A cidade que não para, também não cessa de produzir música boa. Perto do lançamento de seu terceiro álbum, Taurina, via Natura Musical, Anelis Assumpção é um exemplo disso. Sua rica bagagem artística, filha que é do mestre Itamar, reflete o conteúdo plural da metrópole em sua obra. “São Paulo sempre teve um papel de diversidade na música justamente porque tem uma criação cheia de acentos e sotaques trazidos por todos os filhos de nordestinos, mineiros, gaúchos, cariocas e tudo mais”, comenta ela. “E tem público pra consumir todo tipo de arte. Isso faz bem pra autoestima do artista.”

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Seu novo trabalho na agulha, segundo ela, nasceu sob um turbilhão de emoções, e virá com uma sonoridade mais firme. “Ele começou a ser feito pouco depois do falecimento da minha irmã Serena”, compartilha. "Um momento de aleijo. Então ele tem pra mim esse tom que talvez não tivesse se a circunstância emocional fosse outra. Não é um disco sobre isso, mas certamente eterniza um momento em mim. Tem ela, música dela e música pra ela.”

A cantora Anelis Assumpção no palco da Funarte. Foto: Mel Coelho/VICE

Recentemente, Anelis regravou “Receita Rápida”, primeiro single da referida obra, que também absorve uma memória afetiva. Música composta por seu pai em parceria com Vera Lúcia Motta, ganhou interpretação na voz de Alzira Espíndola, hoje Alzira E. “Desde sempre a Alzira foi uma das cantoras que mais me afetou e mais me fez ter vontade de cantar. A voz grave e rouca, um resquício de algo estranho que faz bem”, diz a cantora. "Tenho uma memória muito importante com esse disco inteiro [Peça-me, de 1996]. Acho que foi quando me despertou de forma natural e lenta o desejo de escrever, cantar e interpretar meu próprio mundo de ideias sobre a vida.”

Quem também anunciou álbum para o ano que vem foi a Drik Barbosa, selecionada pelo novo edital Natura Musical. Revelada na Batalha do Santa Cruz, Drik Barbosa é promessa do rap feminino e ganhou destaque por conta de sua parceria com Emicida na faixa “Mandume”, em 2015. Em 2018, depois de emprestar voz para inúmeras faixas de parceiros do hip hop, conheceremos o seu primeiro trabalho solo. Ela não tem certeza sobre o nome do disco, mas por enquanto considera a ideia de “Herança”, e sonda participações de Karol Conká, Negra Li, Mahmundi e Anna Tréa. No freestyle das rimas que mandava na conhecida batalha do bairro paulistano, Drik desenvolveu suas melodias vocais, acrescidas da influência da black music em geral, e em especial, vertentes como a soulful house e o R&B.

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“Sempre fui muito ligada a música, então, quando conheci a batalha, em 2006, me apaixonei. Comecei a fazer freestyle lá, aprendi a improvisar e tal, e conheci mais sobre o hip hop”, relembra ela. “Eu já escrevia. Ninguém sabia, mas eu já escrevia [risos]. Eu pegava músicas de gringos, assim, do Usher, da Ciara, e escrevia a versão brasileira. Já gostava de compor. Não sabia tocar nenhum instrumento, então fazia em cima dessas músicas.” O primeiro som que a Drik lançou foi em 2010. A música se chamava “Vem de Mim”, mas a artista removeu o conteúdo da internet porque não gostou da gravação. Depois, vieram as faixas “Pra Eternizar” e “Não é Mais Você”. Ao lado de uma galera como o coletivo Rimas & Melodias, do qual faz parte, Lívia Cruz, Cris SNJ, Tati Botelho e MC Sofia, Drik Barbosa fala por uma geração de mulheres.

Drik Barbosa. Foto: Daryan Dornelles

“As minas chegam em mim e falam que eu as represento dessa forma, que a minha música faz bem pra elas, dá motivação pra elas, e eu fico muito feliz porque o primeiro intuito é realmente falar o que eu sinto, penso”, confessa. “É que porta-voz é uma coisa muito forte. Mas sinto, sim, que é um momento super importante, principalmente para nós, mulheres pretas. É uma responsa muito grande, porque eu sinto isso. Sinto nos olhos delas, nos shows, que minha música está chegando ali no coração, isso é maravilhoso.”

E podemos esperar coisas boas da Iara Rennó, que depois de se superar lançando dois álbuns com conceitos diferentes, simultaneamente, em 2016 — Arco e Flecha —, prepara um projeto infantil e uma colaboração com DJ Dolores para breve. “No momento tenho tantos projetos que nem sei o que fazer [risos]. Estou cheia de música nova, e aí tem as coisas que surgem”, conta ela. "Sinto que a cada disco vou conquistando um espaço, um público a mais. Já tenho muitas músicas em álbuns que o público nem conseguiu absorver ainda, sabe? São 86 músicas gravadas em álbuns físicos, entre os meus e trabalhos coletivos.”

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No caso de Arco e Flecha, o primeiro foi gravado com uma banda feminina e, o segundo, com uma banda masculina. Arco nasceu a partir de versões musicadas de seus poemas eróticos publicados no livro Língua Brasa Carne Flor. “Já o Flecha tem um outro caminho”, diz Iara. “Ele vem do encontro com os meninos em estúdio, em 2009, um projeto que permanece inédito, e aí já gravei com essa cozinha, que passou a ser a cozinha do Flecha: Curumim, Lucas Martins e Maurício Badé. Ele vem da tradição das cantigas afro-brasileiras, essa coisa da música pequena que fica repetindo. Músicas que remetem ao universo dos Orixás, que têm um tipo de balanço próprio. É um olhar pra fora. Enquanto o Arco é um olhar pra dentro. Por isso que eu acabei separando.”

Iara Rennó durante show no Sesc Pompeia. Foto: Mel Coelho/VICE

Iara Rennó não estudou música, mas letras. Com passagem pelo teatro amador, aprendeu sobre música com a sua família. “Eu achava que o estudo da música poderia enrijecer, por isso que não quis”, dispara. "Contudo, dizer que não estudei nada de música é uma inverdade. Porque não estudei formalmente, academicamente, mas tem essa bagagem que vem de casa”, observa a artista. “A minha família é de músicos. Família Espíndola, que tem a Alzira [Mãe. O pai dela é o compositor Carlos Rennó], Tetê [Tia], vários irmãos que são músicos e tocam, cantam, compõem. Mais o pessoal ainda da geração que vem depois de mim”, orgulha-se.

Com tanta música em seu entorno, foi na adolescência que Iara Rennó se rebelou e quis fazer teatro, sem vislumbrar que, mais tarde, esse legado do corpo presente seria absorvido em sua performance de palco. “Quando voltei pra música, na banda Dona Zica, a coisa já era bastante performática, tinha cinco mulheres e cinco homens. Em paralelo, eu cantava com Itamar Assumpção, e ele tinha isso. Ele havia feito teatro em Curitiba e também tinha a teatralidade muito forte no palco. Todo esse caminho me trouxe pra isso”, reflete.

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É reconfortante saber que Luísa Maita, dona de uma das vozes mais bonitas dos últimos tempos, por sua vez anda às voltas com futuras canções. Ela deixou os fãs durante seis anos sem nada novo – o hiato entre seu primeiro disco, Lero-Lero (2010), e Fio da Memória (2016) – e quem a segue torce para que os intervalos daqui por diante não sejam longos. “Na real, não foi um projeto demorar seis anos pra lançar o segundo”, pondera ela, “acho que foi acontecendo, aí passei por coisas pessoais também, minha gravadora queria que eu fizesse um disco diferente do que eu queria… Aí realmente só depois parei pra compor mais, porque não estava tão feliz. E espero que não seja esse o meu jeito de compor!”, brinca.

Luísa Maita antes de sua apresentação no SIM São Paulo. Foto: Mel Coelho/VICE

Para Luísa, o tempo importa menos do que a satisfação com a obra realizada. “Prezo muito pelo que faço musicalmente, é a principal coisa, então faço com muito cuidado”, frisa. “Mas agora já estou pensando no terceiro disco justamente porque não quero repetir esse tempo que fiquei entre um e outro. Fico muito preocupada, focada em fazer o melhor trabalho possível.” A base da Luísa vem da música brasileira e do jazz, a música que vem de casa, mas ela também traz na bagagem a influência da música pop dos anos 90. “Eu escutava na escola e adorava os dois, umas coisas tipo TLC… Em paralelo a isso eu fui descobrindo o samba, porque meu pai [Amado Maita], apesar de ser sambista e vir do Bexiga, não era um cara que ouvia muito samba tradicional em casa, como Cartola, Roberto Ribeiro… Foram caras que fui buscar depois. E também os sons eletrônicos, Bjork, músicas que ouvia por intermédio de amigos e me hipnotizavam.”

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O som da Luísa transmite o refinamento de cantoras como Alessandra Leão, Xênia França, Céu e Mariana Aydar. E quem já gostou do que ouviu dela até aqui, pode aguardar por algo na mesma linha, segundo ela própria. “Acho que vai ser uma mistura, um meio-termo entre o Lero-Lero e o Fio da Memória”, garante. “Eu já tenho músicas para um disco e algumas coisas produzidas, umas três faixas. Já encontrei um caminho básico pra elas, mas nada fechado. Estou na pré-produção. Não sei se o álbum novo sai ano que vem, mas com certeza vou produzir em 2018.”

Resta aguardar. Se os anos recentes foram delas, os próximos igualmente serão.

Anelis Assumpção. Foto: Mel Coelho/VICE

Anelis Assumpção. Foto: Mel Coelho/VICE

Drik Barbosa. Foto: Daryan Dornelles

Drik Barbosa (Divulgação)

Iara Rennó. Foto: Mel Coelho/VICE

Iara Rennó. Foto: Mel Coelho/VICE

Luísa Maita em show no SIM São Paulo. Foto: Mel Coelho/VICE