A velocista grávida que espera competir nas Olímpiadas do Rio

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VICE Sports

A velocista grávida que espera competir nas Olímpiadas do Rio

Sarah Brown descobriu sua gravidez enquanto se preparava para os Jogos Olímpicos. O plano? Ter o bebê e, um mês depois, se classificar para a competição.

Foto: Kirby Lee-USA TODAY Sports

Em julho do ano passado, a americana Sarah Brown, de 28 anos, chegava à reta final dos 1.500 metros da Diamond League, em Mônaco, quando sentiu algo errado. "De repente, eu estava lutando pra ficar em último", recorda. "Sentia que minhas pernas eram feitas de areia e que não tinha mais oxigênio no meu corpo." Suas arrancadas fortes não engrenavam. Parecia que seu organismo havia desmoronado. Arrasada e sem fôlego, Sarah finalizou a prova em último lugar com o tempo de 4:09.17. Semanas antes, a atleta havia quebrado recordes pessoais tanto nos 800 quanto nos 1500 metros. Estava tudo desenhadinho. Sua temporada de 2015 deveria ser uma ascensão suave rumo aos Jogos Olímpicos de 2016 no Rio. Um mês antes de Mônaco, porém, seus tempos começaram a desmoronar.

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No U.S.A. Track & Field Outdoor Championships em Eugene, Oregon, ela teve uma série de dores de cabeça que julgou como azar. Fruto de ansiedade, quem sabe? Naquela ocasião, ela chegou em 6º, com o tempo de 4:14:52. Darren Brown, marido de Sarah há três anos e também seu treinador, disse que também foi pego de surpresa ao ver sua esposa sofrendo nos treinos da época. "Ela veio com tudo no começo da temporada", diz. "Retroceder dessa forma a essa altura não fazia sentido algum". Incerto do que poderia estar errado, ele diminuiu a intensidade de alguns dos treinos e tentou apoiá-la, mas o mistério continuava. Seria uma baixa de ferro? Será que ela deveria fazer exames de sangue? Ou seria algo psicológico, uma ansiedade diante de seu desempenho? Depois de voltar da Europa, a atleta foi ao médico onde, dentre outros exames, fez um de urina. No dia 27 de julho, o médico ligou e avisou: "Sarah, você está grávida há seis semanas". "Lembro de ficar aterrorizada e feliz por um momento", disse Sarah. "Eu pensava: 'tenho um DIU. Como pode."

Sarah Brown correndo (e vencendo) uma prova de 1.500 metros no começo do ano passado. Foto: Kirby Lee-USA TODAY Sports

Sarah disse que sempre se viu tendo filhos, mas não até se aposentar das pistas. Ela tinha um DIU de cobre, uma das formais mais eficazes de controle de natalidade reversíveis – menos que uma a cada 100 mulheres engravidam com o uso. Que ela poderia ser aquele menos de 1% nem passava pela mente do casal. (Sarah revela ter feito um exame de gravidez desses de farmácia, sem mais nem menos, mas deu negativo: "Nunca tinha feito um antes", disse. "Agora lembrando, devo ter tido alguma intuição do que estava acontecendo, mas nunca encarei como possibilidade.")

"Quando penso nos treinos que deram errado, jurava que era estresse", diz Darren. "Sério mesmo, é a pior sensação que se pode ter como treinador e marido." "Não o culpo", disse Sarah. "Achei que eu tinha que ser forte. Não tinha nenhum daqueles enjoos matinais, mas estava cansada. Agora sei que durante o primeiro trimestre, muito da minha força se voltava para o bebê." Assim que a gravidez de Sarah se confirmou, os médicos se preocuparam em remover o DIU para que o parto ocorresse bem. Ela parou de correr até a realização do procedimento. "O corpo dela estava frágil", disse Darren. Agora Sarah voltou aos treinos com o objetivo de se qualificar para o Rio de Janeiro em 2016. Não será nada fácil: a data do parto, 21 de março, ocorre cerca de 12 semanas antes das qualificatórias. Muitas mulheres voltam aos exercícios leves após o parto, mas evitam cargas mais intensas até o exame pós-parto em seis semanas.

Note a distância entre Sarah Brown e o resto das competidoras. Foto: Kirby Lee – USA TODAY Sports

Muitas das melhores do atletismo lidaram de forma bem sucedida com gravidez, maternidade e competições: a maratonista olímpica Kara Goucher deu à luz a um menino dois anos antes de competir nos Jogos Olímpicos de Londres de 2012; Paula Radcliffe venceu a Maratona de Nova York nove meses após o parto; a queniana Edna Kiplagat teve dois filhos e então venceu duas maratonas de nível mundial. Mesmo assim, é muito raro ver atletas de ponta treinando para qualificatórias olímpicas em meio à gravidez. "Para as mulheres, é um equilíbrio complicado", disse. "Enquanto atleta, você pode ser egoísta. Ter uma família é uma das coisas mais desprezadas. Não sei o que esperar." "Ambos temos familiares e amigos que treinam e tentaram ter filhos e acabaram perdendo o bebê", disse Darren. "É difícil ver isso. E sabíamos que queríamos ter filhos, mas, por causa da intensidade do treino de Sarah, ficava no ar a questão de quando e se teríamos." No geral, médicos afirmam que correr e fazer exercícios durante a gravidez pode ser positivo e até mesmo útil para mulheres. Contanto que Sarah e Darren monitorem como ela se sente ao longo do treino e façam os ajustes necessários, ela poderá manter uma forma razoável. "O mais importante é a condição basal da mulher", afirmou a Dra. Joanne Stone, diretora de Medicina Fetal Maternal do Mount Sinai. "Se elas estão acostumadas a correr, elas podem correr. E claro, temos que nos certificar de que segue hidratada, alimentando-se o bastante e que é uma gravidez sem complicações. Pode haver diversos benefícios." Os Browns dizem que estão levando os treinos na base do "um dia de cada vez". Afirmam manter o nível alto, mas não de forma extenuante. Muitos dos ajustes ao treino de Sarah são semelhantes aos ocorridos em 2010, quando se recuperava de uma lesão: as corridas foram substituídas por treinos de baixo impacto no elíptico, e suas corridas pela tarde foram reduzidas. A natação e o cross training desempenharão grande papel também. "Estamos fazendo tudo com base em como ela se sente, não com tempo", disse Darren. Desde que os Browns anunciaram que teriam um filho, as reações têm sido as mais positivas. Houve uma comoção geral: uma série de telefonemas, e-mails e tuítes de amigos e familiares de dentro e fora do mundo das corridas. Sarah disse que está seguindo a rotina de treinos com cuidado, e é a primeira a admitir trilhar um novo caminho rumo às Olímpiadas – um nunca antes visto. "Algumas coisas não seguem um calendário", disse. "E algumas das melhores coisas da vida não são planejadas." Tradução: Thiago "Índio" Silva