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Música

Forró em Praga

Brasileiro é brasileiro em qualquer lugar do mundo. Muitos vão morar no exterior por necessidade, outros porque foram transferidos, mas a verdade universal entre os imigrantes é que eles podem deixar o Brasil, mas o Brasil não os deixa de forma alguma.

Brasileiro é brasileiro em qualquer lugar do mundo. Muitos vão morar no exterior por necessidade, outros porque foram transferidos, mas a verdade universal entre os imigrantes é que eles podem deixar o Brasil, mas o Brasil não os deixa de forma alguma. Esse é o espírito do Braza Party que rola em Praga. Como não existe melhor maneira de mostrar música brasileira pra gringo a não ser o levando em uma festa onde bomba forró e samba, minha amiga Rafaela Becker, que morou um ano na cidade, foi conversar com a Flávia Torga, organizadora do esquemão, pra ver o que ela acha sobre drag queens, esteriótipos brasileiros e se os tchecos mandam bem no rala-coxa.

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Vice: Conta um pouco do que você faz em Praga e quanto tempo você está aqui.
Flávia Torga: Eu moro aqui há 4 anos, sou percussionista e já tocava no Brasil. Eu vim pra Praga pra estudar e pra tocar com uma banda com dois outros brasileiros, a Lalt Samba. Eu cheguei aqui tocando com eles e a partir daí, e depois de um tempo, criei o Batukatum que é uma espécie de escola de samba aqui na República Tcheca.

Foi a partir do sucesso do Batukatum que você resolveu organizar festas brasileiras?
Além do Batukatum, nós fazemos um workshop de percussão semanal e foi a partir desses pequenos eventos que surgiu a ideia de fazer uma festa brasileira. E não uma festa brasileira somente para brasileiros, mas uma festa brasileira para todo mundo.

Qual o público que frequenta essas festas? Não é só brasileiro. Eu vi bastante tcheco e outros estrangeiros.
Então, essa era a ideia. Tanto que não tocamos somente música brasileira, apesar de ser o foco. Mesmo porque pra quem nunca ouviu, ficar ouvindo só samba ou forró numa noite inteira deixa um pouco perdido. A ideia na verdade é fazer um encontro das pessoas que estão fazendo arte aqui de alguma maneira. Sendo eles brasileiros ou não.

Interessante. E tcheco sabe dançar forró?
Nós tivemos também nessa ultima edição um workshop de dança. E foi super legal porque apareceram umas 30 pessoas. Foi inesperado porque era forró, e não é muita gente que conhece forró por esses lados . Pode ser uma nova tendência por aqui.

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Pensando bem, eu mesma tenho um amigo tcheco que faz aulas de forró numa academia aqui em Praga. E a festa em si é bem diversa, né?
Sim, tem sempre música ao vivo, um DJ – e eu sempre procuro alguém que toque música brasileira ou que tenha uma identificação com o Brasil; a comida típica brasileira é sempre alguma coisa nova.

Que tipo de coisa nova?
Na realidade essa festa começou no U Bukanyra [um barco/balada alternativa da cidade] no verão de 2009. A ideia era de fazer um churrasco como esses que temos no Brasil, carne, cerveja e música legal. E lá eles tinham um terraço que era ideal. Acabou que a segunda versão também foi lá, dessa vez com feijoada e forró. Mas o Bukanyra ficou pequeno. E também por conta do inverno chegando, decidimos mudar o espaço, mas a ideia da festa permaneceu. Tentamos sempre inovar.

Como nessa edição, que vocês contaram com a ajuda do cenógrafo Gil Conti e o teatro de marionetes.
Sim, o Gil sempre esteve com a gente fazendo os cenários e nessa edição ele sugeriu os bonecos e o teatro. E essa é nossa intenção. Sempre buscar quem estiver produzindo coisas novas pra mostrar.

De onde vêm todos esses brasileiros que você conhece em Praga? Qual você acha que é o perfil do brasileiro que vive aqui? Eles curtem um forró?
Na realidade eu vejo três tipos de brasileiros em Praga. Os que conheceram tchecos pelo mundo e estabeleceram um relacionamento aqui, os que trabalham em empresas multinacionais e foram transferidos, e outros que são artistas. Esses artistas são aqueles que acabam participando mais em projetos como esse.

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Nesse momento eu estou te entrevistando num restaurante brasileiro recém inaugurado…
Pois é, o segundo da cidade. Temos também outro restaurante brasileiro mas que é de dono tcheco. Aqui é o primeiro restaurante de brasileiro para brasileiros.

Praga tá ficando bem mais familiar pros brasileiros. E me conta qual foi a repercussão dessas festas na comunidade tcheca e na brasileira?
Sucesso! Todo mundo comentando. Principalmente no Facebook – as pessoas me mandam mensagem, agradecendo a iniciativa e me perguntando sobre as próximas edições.

Por que você acha que faz tanto sucesso?
Porque é diferente. A energia é diferente. Até os brasileiros que estão acostumados com festa se animam com a gente.

Quantas edições vocês organizaram já? Três ao todo?
Sim, foram três. A primeira no U Bukanyra, no verão de 2009. A segunda também no U Bukanyra, mas verão de 2010. E essa terceira em novembro de 2010, no Druhe Patro. E a ideia é continuar organizando pra ter opção. Aqui falta opção de diversão. O pessoal acaba indo mais em bar.

E a escolha dos lugares, como que aconteceu? Porque as duas locações onde já fizeram a Braza Party foram bastante alternativas [os 2 clubes escolhidos são conhecidos redutos underground da cidade].
Aconteceu por contatos. O primeiro lugar foi indicação do Lukas Chocholous, que é gerente do lugar e amigo. O segundo também foi por indicação, mas também porque eu gosto muito do espaço. Eles tem um palco grande que era ideal pras nossas apresentações e o ambiente descontraído. Eu propus o projeto e eles aceitaram.

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Ah, entendi. Eu também gosto do Druhe Patro, onde as festas são feitas agora, mas às vezes eu acho lá um pouco blasé.
Exatamente. Todo mundo comentou que nunca viu o lugar tão animado. E tava cheio também. E dessa vez também trouxemos uma drag queen DJ que foi o máximo. O povo jamais tinha visto isso antes.

Eu vi! Fui a loucura. Quem era a drag queen?
A Diva Noxx. Brasileira, inclusive. Ela trabalha há muito tempo com dança por aqui, acho que até o mesmo tempo que eu com música. Ela teve essa ideia há pouco tempo de se travestir de drag queen, e tá fazendo o maior sucesso. É novidade por aqui.

OK, mas vocês não tem medo de cair num estereótipo brasileiro? Do tipo mulata e agora drag queen? Eu lembro que teve um festival brasileiro ano passado por aqui e eu achei totalmente de mau gosto.
É por isso que eu não estou colocando mulata pra sambar [risos]. E o feedback que a gente recebe é do tipo "Nossa me senti no Rio de Janeiro, ou em São Paulo, numa festa que eu frequentava quando tava lá". É legal porque não estamos fazendo festa pra exportar o Brasil, pra gringo ver. Mas uma festa normal, pra gente normal curtir e ser feliz. Atinge brasileiros e não brasileiros. Isso que é importante.

Quais os planos pras próximas edições?
Se conseguirmos o patrocínio, queria trazer gente de fora. Brasileiros que moram fora, pela Europa, e que fazem um trabalho legal por aí. Conheço um grupo de percursão em Berlim que trabalha só com meninas e tocam maracatú. Acho que essa linha diferente seria sucesso por aqui.

E sua vida de artista em Praga? Você vive só de musica?
Só música. Mas tenho que estar sempre inovando. Trabalhar com arte é complicado em qualquer lugar do mundo.

TEXTO POR PEDRO FALCÃO
FOTOS POR RAFAELA BECKER