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Heroína, Homicídio e o Novo Front da Guerra às Drogas nos EUA

As promotorias estão levando adiante acusações de homicídio contra traficantes e usuários que fossem colegas ou amigos das vítimas que morreram de overdose de heroína. A sentença pode chegar à prisão perpétua.

Sean Harrington é acusado de homicídio por supostamente fornecer as drogas que mataram Elisif Bruun. Foto cortesia do Tryon Daily Bulletin.

Sean Harrington está preso há mais de 16 meses. Ele foi extraditado da Filadélfia para Polk County, Carolina do Norte, EUA, onde encara uma acusação de homicídio culposo. Mas ele não atirou nem esfaqueou ninguém. Ele supostamente enviou heroína e cocaína para uma amiga chamada Elisif Bruun. Ela ingeriu a droga, provavelmente no formato de speedball, e foi encontrada morta em 11 de fevereiro de 2014, caída em seu quarto na comunidade de saúde Cooper Riis na Carolina do Norte.

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Ela tinha 24 anos, e essa não era sua primeira internação. Como Bruun, Harrington, agora com 26 anos, é um garoto branco de família de classe média. Ele pode pegar 15 anos de prisão, segundo o promotor local.

"Minha filosofia é que, se você vende drogas, você tem de ser responsabilizado pelo que acontecer com quem consumir esses narcóticos", diz Greg Newman, o promotor distrital da Carolina do Norte cuidando do caso. "Se você dá narcóticos para alguém, ou vende, e a pessoa acaba morta… bom, você tem de ser responsabilizado por isso também."

Só que o pai da vítima, Peter Bruun, discorda.

"Eles é que são os predadores e estão atrás de vítimas como Sean", Bruun, um artista de Towson, Maryland, disse à VICE. "Sean é vítima de uma doença… ele não é um predador. É uma vítima."

É difícil achar um verdadeiro vilão entre as legiões usando e vendendo opiáceos nos EUA, dois grupos que frequentemente se sobrepõem. Isso é especialmente verdade dado que, para muitos, o uso de heroína começa com o abuso da droga legal amplamente prescrita OxyContin, que, em 2013, foi responsável por mais mortes que a heroína. Isso inclui Bruun que, segundo o pai, começou a usar opiáceos através de um amigo que vendia OxyContin roubado da avó.

No entanto, promotorias dos EUA estão tirando a poeira de estatutos antigos para levar adiante acusações de homicídio contra traficantes e, inclusive, usuários que fossem colegas ou amigos das vítimas que morreram de overdose após eles lhes passarem ou venderem heroína. A sentença pode chegar à prisão perpétua. Isso está acontecendo num momento em que figuras proeminentes dos grandes partidos norte-americanos estão, pela primeira vez em décadas, considerando seriamente reduzir a população carcerária do país, que cresceu muito além dos atuais 2 milhões de pessoas, e conter uma guerra às drogas que se mostrou um fracasso para diminuir o apetite pelos entorpecentes.

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O caso Bruun é um lembrete triste de que, mesmo que a reforma esteja no ar, punição continua sendo o antídoto favorito dos EUA.

"Essa é uma reflexão da tendência maior dos promotores de identificar o que entendem como um crime sério e pensar em maneiras criativas de ir além de sua abordagem básica", define Douglas A. Berman, especialista em lei criminal do Moritz Collegeof Law, Ohio. Até agora, vários processos do tipo foram levados adiante, embora os critérios usados pelos promotores continuem obscuros. O fenômeno tem recebido pouca atenção dos estudiosos e ativistas legais, enquanto as acusações têm surpreendido os advogados de defesa desses casos.

"Isso se tornou uma nova ferramenta que eles vão usar toda vez que puderem ligar uma morte a um traficante em particular?", pergunta Berman. "Ou isso é algo que os promotores vão calibrar para alguma métrica de culpabilidade de um traficante numa morte? Isso vai valer quando estivermos encarando um pequeno traficante?"

Até agora, parece que várias negociações pequenas foram pegas no radar. Em setembro de 2013, Joseph L. Robinson, um morador de Illinois, foi sentenciado a 20 anos numa prisão federal por vender 20 gramas de heroína, no valor de US$ 30, para uma pessoa que depois morreu. Jim Porter, um porta-voz do promotor de Illinois, Stephen Wigginton, afirmou que não havia nada de hediondo nesse crime em particular. Se houvesse, ele disse, a sentença seria ainda mais longa.

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Esses casos também batem de frente com a adoção de políticas de redução de danos, como equipar paramédicos com a droga naloxona, que reverte a overdose, e as chamadas leis do "bom samaritano", as quais oferecem proteção legal limitada para pessoas que ligam para o 911 a fim de relatar emergências relacionadas ao uso de drogas. Essas leis geralmente oferecem imunidade para a posse de pequenas quantidades, não para tráfico de drogas, segundo a National Conference of States Legislatures – e tampouco para outras acusações de tráfico relacionadas a mortes. Promotores esperam que penas mais duras detenham os traficantes e mantenham as drogas longe dos usuários, porém isso também pode fazer os viciados fugirem da cena e deixarem um amigo morrendo no chão.

As penas podem até encorajar violência por parte dos traficantes para garantir o silêncio de testemunhas.

"Trazer a punição criminal nessas situações não vai evitar o problema, provavelmente só [vai] piorar a situação, porque os envolvidos não vão falar com a polícia ou o pessoal de emergência – ou [eles] até podem usar de violência para evitar tais acusações", escreveu por e-mail Art Wat, diretor da Drug Policy Alliance do Colorado, uma organização crítica à guerra às drogas. "Muito da violência do comércio de drogas envolve intimidação e morte de informantes ou aqueles considerados informantes."

Em fevereiro de 2014, o ator Philip Seymour Hoffman se tornou a face pública da crise da heroína depois de morrer de overdose ao ingerir uma mistura envolvendo a droga, cocaína, anfetaminas e benzodiazepinas. O Departamento de Polícia de Nova York, que estava ansioso para achar outro culpado que não o vício de longa data do ator, logo encontrou Robert Aaron (nome legal de Robert Aaron Vineber), um músico e viciado que admitiu, às vezes, vender heroína para amigos. Mas o envolvimento de Aaron na morte de Hoffman nunca ficou provado; assim, as acusações contra ele foram diminuídas para distribuição e posse, das quais ele se declarou culpado.

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"Em certo nível, isso é como os tribunais das bruxas de Salém", Aaron falou ao New York Times no ano passado. "Você não tem uma caça às bruxas sem uma bruxa. Só tive o azar de ser esse cara. Você precisa de um sacrifício humano, e é isso que sou."

Já vimos esse filme antes.

No final dos anos 80, alguns governos estaduais e o federal promulgaram leis específicas visando a punir traficantes por mortes relacionadas a drogas. A morte do astro do basquete Len Bias de uma overdose de cocaína em 1986 ajudou a mobilizar o sentimento político a favor da ofensiva assim que a epidemia de crack começou a dominar as manchetes. Hoje, confrontado com uma nova crise de drogas, colocar as pessoas atrás das grades continua sendo a abordagem padrão do governo dos EUA.

Na área de Toledo, em Cleveland, Steven Settelbach, um promotor federal de Ohio, está acusando traficantes de infringir uma lei federal que carrega uma pena mínima de 20 anos para crimes ligados a drogas resultando em morte ou danos sérios – e prisão perpétua para pessoas com condenações anteriores por porte de drogas. Em Cuyahonga County, foram 198 mortes relacionadas à heroína em 2014, de acordo com o Northeast Ohio Media Group.

"Penas federais são extremamente sérias, e as pessoas que estão lidando com essa quantidade de veneno precisam entender a mensagem de que isso será tratado como homicídio", Dettelbach declarou para a VICE.

Apesar de o ex-promotor geral Eric Holder ter instruído promotores federais a tratar sentenças mínimas obrigatórias mais criteriosamente em 2013, isso não significa que eles não estejam buscando sentenças mais longas por crimes de drogas, segundo Dettelbach. Em vez disso, ele diz que seu escritório está focado em penas maiores, particularmente em mortes relacionadas com heroína misturada ao poderoso opiáceo sintético fentanil, o que causou overdoses.

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"O uso de fentanil está se tornando mais agudo junto com o uso de heroína", contou Dettelbach. "Na minha cabeça, vou dizer que é difícil ser um traficante de fentanil e dizer que não sabia que isso ia matar algumas pessoas."

Promotores federais de estados como Oregon, Texas, Pensilvânia e Virgínia Ocidental estão levando adiante esse tipo de acusação em reposta a mortes por opiáceos. No sul de Illinois, Porter frisa que seu escritório começou a se encher de casos assim depois da nomeação de Wigginton em 2010 e que, até agora, ele já conseguiu 11 condenações. Em julho, um juiz federal do Kentucky sentenciou um homem à prisão perpétua sem direito a condicional por vender oxicodona a um usuário que morreu. O escritório da promotoria do distrito atestou que essa foi "a primeira vez no Kentucky que uma sentença de prisão perpétua foi imposta num caso de overdose envolvendo drogas legais". (Não há condicional no sistema federal por crimes cometidos depois de 1º de novembro de 1987.)

E algumas autoridades apoiam essa abordagem indiscriminada – em julho, David J. Hickton, promotor federal da Pensilvânia, anunciou que "é a política desse escritório de que, se pudermos estabelecer um vendedor de heroína como causa da morte, vamos fazer a acusação. A crise de heroína exige essa resposta".

Isso acabou acumulando várias acusações federais de homicídio. A heroína contribuiu com pelo menos 799 mortes por overdose em Allegheny County, Pensilvânia, entre 2008 e 1º de julho deste ano, de acordo com o Overdose Free PA.

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Elisif Bruun por volta dos 22 anos. Foto cortesia da família.

Promotores estaduais também parecem querer acusações mais pesadas. Em Winsconsin, os promotores acusaram 71 pessoas de homicídio por fornecimento de drogas em 2013; em 2012, foram 47, segundo o USA Today.

Em Nova Jersey, o promotor de Ocean County Joseph Coronato tornou esse tipo de acusação uma prioridade: seu escritório está treinando a polícia do Estado para investigar mortes relacionadas à heroína.

"Chamamos isso de nossa acusação xeque-mate", resumiu Al Della Fave, um porta-voz do escritório.

O escritório de Coronato conseguiu a primeira condenação por morte induzida por drogas logo depois de sua nomeação em 2013, segundo Della Fave. Até agora, eles garantiram mais de 20 condenações do tipo, e cada um dos acusados se declarou culpado e recebeu sentenças de cerca de oito anos.

Leis estaduais e federais dos EUA não limitam essas acusações a grandes traficantes ou aqueles que agem com intenção maliciosa. Em Nova Orleans, Chelcie Schleben e o ex-namorado Joshua Lore encaram atualmente a possibilidade de prisão perpétua sem direito a condicional pelo "assassinato" de Kody Woods, 23 anos, em fevereiro de 2014.

As acusações são severas "mesmo para os padrões da Louisiana", apontou Stephen Singer, professor da Loyola Law School e advogado de Schleben.

A Louisiana já tem o maior número de infratores não violentos cumprindo prisão perpétua, segundo um relatório de 2013 da União Americana de Liberdades Civis, e as sentenças de condenações por drogas tendem a ser extraordinariamente duras. No ano passado, o governador Bobby Jindal assinou uma legislação prolongando a possível sentença para traficantes de heroína reincidentes para 99 anos.

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Schleben está na reabilitação desde antes de as acusações serem feitas – e está indo bem, de acordo com seu advogado.

"Isso é exagerado para alguém sem ofensas anteriores e sem intenção de matar", me disse Singer. "Eram só três amigos compartilhando heroína."

Em Charleston, Virgínia Ocidental, os promotores acusaram Steven Craig Coleman de homicídio por ligação com uma morte por overdose em fevereiro. Rico Moore, advogado de Coleman, está chocado com as acusações.

"Ele é um usuário de drogas", destacou Moore. "Ele não é o que eles alegam – ele não é um traficante… não faz o menor sentido punir alguém por ser viciado."

Para Moore, o vício em opiáceos de Coleman vem do uso de drogas legais prescritas por médicos. Coleman é pobre, sua mãe morreu por abuso de drogas e seu pai é viciado. Enquanto a epidemia do crack atacou os bairros urbanos pobres de negros nos EUA, a crise de opiáceos está afetando principalmente as comunidades brancas desde a área rural de Appalachia até os subúrbios de Staten Island. O fato de que os viciados geralmente são brancos pode estar encorajando uma reação menos punitiva aos usuários de heroína, algo diferente do que aconteceu com os viciados em crack. Porém, por esse mesmo motivo, a pressão para colocar os traficantes atrás das grades pode ser até maior.

Em Ohio, os promotores ainda não conseguiram aplicar as penalidades mais pesadas disponíveis pela lei estadual para essas mortes – mas eles estão tentando. Em setembro passado, o procurador de Hamilton County, Joseph T. Deters, anunciou acusações de homicídio culposo para envolvimentos em intoxicação fatais. E essa é a primeira vez, segundo seu escritório, que essas acusações são feitas na história do condado. Deters usou a oportunidade para reclamar que a lei deveria "ser estendida para permitir acusações de homicídio… se a lei mudar, os traficantes vão encarar prisão perpétua por vender as drogas que tiram tantas vidas".

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No ano passado, uma lei assim foi aprovada pela câmara estadual de Ohio, com o apoio entusiasmado do promotor geral Mike DeWine. Jim Butler, o representante republicano estadual que introduziu a lei, planeja reintroduzir outra legislação alterada para garantir que meros usuários não sejam processados por mortes. Só que ele também quer acompanhar a tendência de penas maiores para tráfico de drogas.

"Acho que devemos ser mais duros com os traficantes de drogas e ter mais compaixão com os usuários", ele apontou. Mas nem sempre é fácil saber a diferença.

Durante o verão de 2013, Elisif Brunn morava em Bar Harbon, Maine, com um jovem chamado Gordon Falt, que ela conheceu na Comunidade Terapêutica Spring Lake Ranch, um centro de tratamento em Vermont.

Segundo Falt, Brunn tinha um traficante em Maryland que lhe enviava heroína enquanto ela estava na reabilitação, droga que os dois usavam juntos. Eles logo saíram de lá e se mudaram para o Maine, onde conheceram Sean Harrington. Harrington, um músico de rock que cresceu no sul da Filadélfia, vendia pequenas quantidades de heroína para sustentar o próprio vício, informou Falt. Harrington foi ao Maine, segundo seu pai, numa tentativa de se afastar do próspero mercado de drogas da Filadélfia.

Mas os viciados têm seus meios. Hoje, a heroína pode ser encontrada em quase todo o país.

"Eles compartilhavam tendências artísticas e, infelizmente, problemas com drogas", me contou Michael Harrington, pai de Sean, se referindo à amizade do filho com Bruun. "Sean teve um verão difícil: ele ficou sem teto e desempregado por um tempo. Elisif foi um dos poucos bons momentos para ele. Ele sempre falava bem dela, acho que ele a tinha em alta conta."

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No entanto, o verão descambou rapidamente. Bruun começou a ser demitida de um emprego atrás do outro e expulsa de vários apartamentos, enquanto Falt foi preso por roubo de residência. Bruun concordou em dar outra chance à reabilitação. Quando chegou a Carolina do Norte, Bruun teria pedido que Harrington enviasse heroína para ela. Peter Bruun, Michael Harrington e Falt concordam que Sean não sabia que Elisif estava fazendo reabilitação na época. "Viciados ajudam uns aos outros fornecendo drogas", comentou o pai dela. "Se um viciado não usa drogas e não está em tratamento, a pessoa passa mal. Ela se sente literalmente doente."

Em fevereiro, Elisif Bruun foi encontrada morta em seu quarto.

"Sean ficou péssimo, chorando, com pensamentos suicidas, mas não conseguia largar as drogas", escreveu seu pai num e-mail.

Em maio, Michael Harrington encontrou o filho na rua e tentou convencê-lo a voltar para casa e se tratar. Sean se recusou a ir para a reabilitação. Só que seu pai ficou surpreso quando ele concordou em passar por uma avaliação psiquiátrica no Friends Hospital, uma instalação psiquiátrica da Filadélfia não muito longe das esquinas mais movimentadas do tráfico. Sean logo deixou o hospital, atravessou a rua e foi preso roubando uma loja da Home Depot, disse o pai. Quando a polícia colocou o nome dele no sistema, o mandado de prisão dele da Carolina do Norte apareceu.

"Quando um detetive de homicídios de Filadélfia ligou na manhã seguinte, pensei que Sean estava morto", escreveu Harrington. "O que ele me disse foi mais chocante."

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A mídia local recebeu a extradição de Sean Harrington para a Carolina do Norte, em agosto de 2014, como um triunfo. Segundo a detetive de Polk County B.J. Baynes falou aos repórteres, aquilo foi justiça para a família de Elisif.

"Eles não querem que isso aconteça com a filha de outra pessoa", frisou a detetive Bayne, segundo uma matéria de setembro do Tryon Daily Bulletin.

O que não era verdade. Em maio de 2014, Peter Bruun escreveu para Bayne informando que não queria ver Sean Harrington processado, de acordo com um e-mail que ele forneceu à VICE.

"Não culpo esse jovem pela morte de Elisif: nos dois casos, há uma doença terrível; nos dois casos, um jovem é mais vítima que perpetrador", escreveu Bruun, que desde então se tornou próximo da família Harrington. "Sinto apenas compaixão por esse homem na prisão e pessoalmente o considero inocente da morte de Elisif. Não quero que ele seja punido – quero que ele receba tratamento ou, pelo menos, a opção de tratamento. Ele merece uma chance de melhorar."

Bayne nunca respondeu, diz Bruun.

Sean Harrington. Foto cortesia da família.

"Quando vejo essas histórias, sinceramente, fico horrorizado, com raiva e chocado. Tudo está errado. Tudo", ele lamenta.

Quando perguntamos por que ela distorceu a visão da família do caso, a detetive Bayne disse à VICE que a família a tinha apoiado "na época… e mais tarde disse que não".

Difícil de acreditar, já que Peter Bruun lhe escreveu meses antes. Bayne hesitou, insistindo que não conseguira lembrar "as datas"; depois, acrescentou que não podia discutir mais nada enquanto o caso estivesse sendo julgado.

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Newman, o promotor local, nem mesmo chegou a falar com a família Bruun. Mas não vai deixar a oposição deles detê-lo.

"Bom, meu trabalho não se baseia na decisão das pessoas, incluindo a opinião das vítimas", ele comentou. "Recebi correspondência deles. E vou falar com eles quando estiver pronto para apresentar o caso. Vou mesmo."

O advogado de Sean Harrington não quis comentar o caso em benefício do acusado.

Não está claro de onde a cocaína veio. Peter Bruun contou que a filha deve ter conseguido isso na Carolina do Norte. Gordon Falt concorda, já que Harrington admitiu ter enviado a heroína, embora tenha negado saber sobre a cocaína.

"Falamos sobre isso", apontou Falt, lembrando-se de uma conversa depois da morte de Bruun. "Ele se sentia horrível. Ele estava fora de si."

O fato de Bruun ter consumido cocaína pode apresentar uma chance de inocentar Harrington. Em 2014, no caso pouco discutido Burrage vs. EUA, a Suprema Corte determinou que, sob a lei federal, um promotor deve provar que uma droga decisivamente causou a morte do usuário em vez de apenas ter contribuído para isso. A preferência de Elisif por speedballs pode ter sido o que a condenou, mas isso pode salvar Sean.

Apesar de o caso Burrage decidir uma questão de lei federal, isso pode ter impacto na interpretação de um tribunal local, frisou a advogada Angela Campbell, que defendeu o caso diante da Suprema Corte. Na Carolina do Norte, o estatuto de homicídio exige a comprovação de que não apenas a droga fornecida definitivamente causou a morte como também que o traficante agiu com malícia. Infelizmente para Harrington, a Suprema Corte já interpretou o mero fornecimento de drogas como malícia em potencial.

Peter Bruun acredita que acabar com a estigmatização dos usuários de drogas é a melhor maneira de combater o vício, e não a punição; por isso, ele lançou a New Day Campaign para espalhar essa mensagem. No entanto, parece que a reforma da justiça criminal continua uma crise de drogas ou um tiroteio urbano de distância de um grande retrocesso nas mãos das promotorias, um martelo que vê qualquer problema social como um prego.

Quando perguntei a Newman, o promotor do caso, se ele conhecia alguma evidência de cunho científico sugerindo que processar fornecedores de droga por assassinato diminuiria o abuso de substâncias, ele foi curto e grosso.

"Não sei dizer. Só sei que nossa comunidade é considerada uma das melhores para se viver. E isso não é por acaso. Isso significa que temos uma baixa taxa de criminalidade – e isso não é um acidente."

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Tradução: Marina Schnoor

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