O mundo quase teve um RPG sobre maconha

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O mundo quase teve um RPG sobre maconha

Em um universo justo, ‘Weedopia' existiria e teríamos um jogo tipo Final Fantasy sobre maconha pra chamar de nosso.

Imagine, só um pouquinho, que você decide criar um jogo tipo Chrono Trigger ou Final Fantasy VI pro mercado de games contemporâneo. Como desenvolvedor, é do seu interesse criar um jogo especial, um game que tenha personagens memoráveis, ambientes lindos e pixelados, e histórias que conseguem te envolver emocionalmente e são intrigantes o bastante pra te levar até o seu final dramático. Ao mesmo tempo, não adianta nada simplesmente copiar esses jogos de mais de 20 anos atrás. A melhor solução é juntar com algum elemento que seja interessante pro mundo dos games de hoje. Talvez você até pense em uma temática baseada em guerra de drones ou aquecimento global no seu jogo nostálgico moderno.

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Ou, talvez, você tenha uma ideia especial e chegue a conclusão que seria genial bolar um companheiro pro jogador. Um companheiro, Tokachu, uma criatura que parece com o filhote de uma preguiça com uma folha de maconha. E com esses elementos básicos, você acaba criando um universo cheio dessas criaturas que, basicamente, funcionam a base de maconha e de assuntos sobre maconha. Se Chrono Trigger é meio steampunk, então esse jogo seria "weedpunk", uma história cheia de clichês narrativos amarrados pela cultura da maconha.

Tokachu existiu, só por um tempinho, e o jogo que descrevi pra vocês poderia ter sido lançado. O jogo se chamava Weedopia. É tudo o que eu sempre quis num jogo só. E assim como alguns games que mostramos aqui, ele é feito para agradar a um público específico.

Só quero deixar claro que eu não curto as ideias de 'Weedopia' ironicamente.

Fiquei sabendo de Weedopia durante a sua rápida campanha no Kickstarter em outubro de 2014. Num post que escrevi na época, disse que a parte que mais me emocionava em Weedopia era o total comprometimento com a sua temática. Se o vídeo no Kickstarter for um bom exemplo da ideia dos seus criadores, esse seria um desses jogos em que tudo o que você faz tem a ver com maconha.

O jogo tinha toques de Harvest Moon, mas em vez de plantar cenouras ou trigo, a ideia era criar várias cepas diferentes de maconha. Era possível aumentar as estatísticas dos personagens, mas a forma como você fazia isso (por bong, cachimbo ou baseado) poderia alterar o resultado. Não havia cristais pra colecionar, mas maconheiros lendários tinham que ser recrutados pra matar o grande vilão Lord Nohemp [Lorde Foraganja, na tradução local] cujo objetivo era bem resumido no próprio nome. Tudo que podia ser relacionado a maconha era relacionado a maconha, o que me fez ficar apaixonado pelo jogo a primeira vista. Até tuitei obsessivamente sobre o assunto na época.

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Só quero deixar claro que eu não curto as ideias de Weedopia ironicamente. Eu verdadeiramente acho incrível a ideia de misturar qualquer tipo de jogo com humor de maconheiro.

Videogames, seja lá por qual razão, nunca teve uma relação temática tão forte com maconha como outras mídias. Falo com toda a honestidade do mundo que pelo menos 50% de todos os filmes que eu curtia na adolescência eram basicamente piadas longas demais sobre maconha. Pra Lá de Bagdá foi uma experiência inesquecível, Império do Besteirol Contra-ataca, do Kevin Smith, era puro ouro da comédia e assisti uma cópia em fita VHS de How High, com o Method Man e o Redman, mais vezes do que gostaria de admitir.

Todos esses filmes sobre ficar chapado eram comédias, e todos queriam mostrar como situações típicas de outros filmes de comédia ficavam mais engraçadas quando os personagens estavam muito chapados. Esses filmes eram sobre como as pessoas ficam ridículos quando estão chapadas e como essa atmosfera ridícula toda se espalhava pro resto do mundo. Em How High, os personagens crescem uma planta mágica que, quando é fumada, chamava o fantasma do seu amigo morto, o Marfim. O fantasma da maconha ajudava os dois a se formarem em Harvard. Isso é – nem preciso dizer – completamente ridículo.

Os vasos de maconha são bem "comuns" no universo do filme, tendo em vista que todas as coisas são possíveis em um mundo onde fumar maconha é sempre muito engraçado. As piadas em si não são piadas de maconheiro; são piadas em um filme que tem certeza que a maconha faz parte de como a comédia vai funcionar.

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Sinto que os games tragicamente perderam o bonde do gênero de comédia de maconheiro, e se me pedissem uma explicação do por quê, eu diria que os memes já cumprem esse papel nos jogos. A maconha é um catalisador narrativo nesses filmes, além de ser uma maneira de explicar o comportamento bizarro dos personagens. Essas pessoas fazem coisas absurdas só porque elas estão chapadas. Nos jogos, não rola pegar um atalho pra explicar o jeito como os personagens se comportam, porque 90% do tempo a explicação é que eles são malvados ou sofrem porque procuram eternamente por uma figura paterna. Se precisar encaixar uma piada, é só soltar um meme no lugar de algo engraçado de verdade (oi, Borderlands 2).

Ahhh, o mestre da ganja. Imagem: reprodução

A intenção Weedopia era trazer esse humor de maconha pros games. Se desse certo, teríamos um jogo clássico sobre os as piadas estranhas feitas pra maconheiros e sobre as pessoas que riem dessas piadas. Era uma ideia tão firme, forte e convicta que era quase inacreditável.

Infelizmente, não rolou. Weedopia não encontrou apoiadores que o entendessem e os videogames perderam uma chance de ingressar no gênero de comédia que o cinema conhece há anos. Pior ainda: o criador tentou eliminar qualquer vestígio de Weedopia da internet (mas achei uns vídeos de uns moleques malas zoando o jogo, o que me deixo meio chateado como fã).

No fim, Weedopia não existe, mas talvez nós não o merecêssemos. O mundo ainda está aí, esperando pelo Grande Game de Maconha. Se você for o desenvolvedor que está dando a luz a esse projeto, mande um salve.

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