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O que aprendemos com o primeiro turno das eleições municipais de 2016

Votos inválidos são recorde em capitais, Doria surpreendeu todo mundo em SP e PT perdeu prefeituras ao lançar metade dos candidatos em relação a 2012.

Foto: Agência Brasil.

Num ano em que o impeachment de Dilma Rousseff abalou a fé no processo democrático brasileiro, é quase um alívio constatar que as eleições municipais efetivamente ocorreram. O que não dá para negar é que, mais até do que em 2014, o pleito atual foi marcado pela desconfiança da população em relação às instituições políticas. Em nove capitais o número de votos em branco e nulos, junto com as abstenções, somaram mais que o candidato em primeiro lugar nas urnas. Nas duas maiores cidades do país, São Paulo e Rio de Janeiro, a soma seria suficiente para ganhar a eleição no primeiro turno – no Rio, houveram mais votos inválidos do que os votos somados dos três primeiros colocados, enquanto na capital paulista, eles superam o número de votos de João Doria (PSDB), que venceu um inédito primeiro turno. Para se ter uma ideia do tamanho dessa rejeição, em São Paulo, por exemplo, o quociente eleitoral (número de votos que um partido precisa ter para conseguir uma cadeira na Câmara de Vereadores, calculado a partir dos votos válidos) diminuiu em relação à 2012.

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Nas mudanças entre a proporção de representatividade partidária no país, obviamente a que mais se destaca é a queda vertiginosa do PT no número de cidades que comanda e no número de vereadores eleitos. O partido perdeu 59,4% de prefeitos e 44,8% de vereadores. A queda é expressiva, mas resultou de uma estratégia petista de não se expor nos pleitos municipais: o partido lançou quase metade dos candidatos a prefeito e vereador que havia lançado em 2012, prevendo as dificuldades que teria ao longo da eleição. E não foram poucas, afinal, a reboque do impeachment de Dilma, Lula foi indiciado pela Lava Jato e os ex-ministros Guido Mantega e Antônio Palocci foram presos nas semanas próximas à eleição, reforçando o clima antipetista.

"Em nove capitais o número de votos em branco e nulos, junto com as abstenções, somaram mais que o candidato em primeiro lugar nas urnas."

O PSDB, por sua vez, comemora ligeiro aumento nas câmaras de vereadores (4,1%) e um número expressivo de prefeituras: 791, 15,3% a mais do que em 2012, ficando apenas atrás do PMDB, que subiu de 1.015 para 1.027. PSD, PP, PDT, PR, PRB e PCdoB todos cresceram em números de prefeitos eleitos, dividindo o espólio petista, enquanto PSB, PTB e DEM tiveram queda expressiva.

Nas capitais e grandes cidades do país, 37 prefeitos foram eleitos no primeiro turno, enquanto outras 55 terão disputa de segundo turno. Nas capitais, cinco dos prefeitos que se candidataram à reeleição não passaram nem para o segundo turno — caso de Gustavo Fruet (PDT) de Curitiba — o que pode deixar como incerto o futuro da "Prefs", a página antenada que a prefeitura da capital paranaense mantém no Facebook, que havia suspendido as atividades em respeito à lei eleitoral. Além disso, Alcides Bernal (PP) em Campo Grande, Dr. Mauro (PSB) em Porto Velho, João Alves (DEM) em Aracaju e Fernando Haddad (PT) em São Paulo também ficaram de fora. No Rio, derrota pesada para o PMDB, que perdeu o comando da cidade e é rejeitado, em termos de apoio, pelos dois candidatos do segundo turno, Marcelo Crivella (PRB) e Marcelo Freixo (PSOL).

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DORIA EM SP

A vitória de Doria em São Paulo surpreendeu até mesmo a sua própria equipe. O apresentador de TV e dono da revista Caviar Lifestyle começou a corrida nas últimas colocações nas pesquisas, mas ganhou forte tração a partir do momento em que começou a campanha — especialmente na televisão. Doria conquistou a vaga da disputa no PSDB apadrinhado pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB), que jogou pesado para garantir seu candidato, levando Andrea Matarazzo (PSD) a se desligar do partido e tentar concorrer por fora — Matarazzo, tucano tradicional, acabou numa bizarra chapa como vice de Marta (que saiu do PT para o PMDB). Antes do início da campanha, Alckmin costurou uma forte rede de apoios a Doria, motivo pelo qual a campanha tucana foi inclusive indiciada pelo Ministério Público Eleitoral na reta final.

Doria se beneficiou da sua rejeição baixa e tacou-lhe pau no discurso de que não seria um "político", mas sim um "gestor". Como estava atrás, viu Celso Russomanno (PRB) e Marta Suplicy (PT) digladiarem-se sozinhos, enquanto o tucano da cashmere avançava com seu populismo automotivo — sua principal promessa de campanha, sob o logo "Acelera SP", é de aumentar as velocidades máximas das vias expressas de São Paulo. Com muito tempo na TV, foi deixando os adversários para trás, enquanto Haddad se esforçava para aparecer como candidato viável. A vitória de Doria é inédita: São Paulo não gosta de reeleger prefeito, mas nunca havia eleito um postulante no primeiro turno desde que a regra de dois turnos existe. A grana também fez muita diferença: milionário, Dória não precisou se virar com as minguadas doações de pessoas físicas que a nova lei eleitoral permite, custeando a própria campanha e se tornando o segundo maior doador eleitoral do país.

Haddad sofreu com, em parte o anti-petismo, mas, em outra, a falta de vocação para a disputa eleitoral. Em 2012, não ganhou a eleição — foi Serra quem perdeu, grudado na impopular gestão de Kassab e na sua mania de desistir de cargos para se lançar na corrida presidencial. Com a crise econômica, recebeu menos dinheiro do Governo Federal (apesar de ter deixado as contas muito em dia com a renegociação da dívida). Suas obras e alterações no centro expandido eram inteligentes e baratas, mas o cofre minguado acabou afetando a abertura de creches e hospitais, infraestruturas muito importantes na periferia e que custam bem mais caro que as ciclovias.

Na Câmara Municipal de São Paulo, o PT conseguiu se salvar ao colocar Eduardo Suplicy como "puxador de voto" (ele foi o vereador mais votado do país) para a coligação, e só perdeu uma cadeira, apesar de ter tido significativamente menos votos do que em 2012. O PSOL se deu bem com a Bancada Ativista — somados, seus candidatos garantiram mais de meia cadeira, e além de Toninho Vespolli, agora conta com Sâmia Bonfim na casa. Além do retorno de Soninha (PPS) à Câmara, destacam-se também figuras folclóricas recém eleitas, como o "apaixonado por carros" Camilo Cristófaro (PSB) e sua campanha contra a "indústria da multa" e o ex-apartidário Fernado Holiday (DEM), candidato do MBL.

O segundo turno acontece no próximo dia 30 de outubro.

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