Mossless in America: Lara Shipley

FYI.

This story is over 5 years old.

Fotos

Mossless in America: Lara Shipley

Nessa semana na nossa coluna Mossless, a fotógrafa Lara Shipley fala sobre sua misteriosa “luz assustadora”, a natureza da documentação e como ela se revela na ambiguidade entre o tangível e o fantástico.

A Mossless in America é uma nova coluna que apresenta entrevistas com fotógrafos documentais. A série é produzida em parceria com a revista Mossless, uma publicação fotográfica experimental comandada por Romke Hoogwaerts e Grace Leigh. Romke começou a Mossless em 2009 como um blog em que ele entrevistava um fotógrafo diferente a cada dois dias. Desde 2012, a Mossless já teve duas edições impressas, cada uma lidando com um tipo diferente de fotografia. A Mossless foi destaque na exposição Millennium Magazine, de 2012, no Museu de Arte Moderna de Nova York e conta com o apoio da Printed Matter, Inc. A terceira edição, um volume dedicado à foto documental norte-americana dos últimos dez anos, é intitulada The United States (2003 – 2013) e será lançada em breve.

Publicidade

Lara Shipley é uma fotógrafa que mora em Lawrence, Kansas, e que segue uma orbe de luz mítica por estradas rurais do Missouri com seu colaborador Antone Dolezal. As fotos estão disponíveis numa série ainda em andamento de publicações de artistas da Search Party Press, intitulada The Spook Light Chronicles. Para sua outra série, Coming, Going and Staying, Lara empresta sua visão a um material mais concreto, formado por pessoas e objetos nas cidades da fronteira ao sul do Arizona. Claramente, essa fotógrafa está interessada em objetos etéreos que não ficam estáticos por muito tempo. Conversamos com ela sobre a misteriosa “luz assustadora”, a natureza da documentação e como ela se revela na ambiguidade entre o tangível e o fantástico.

Mossless: Onde você cresceu?
Lara Shipley: Sou de uma pequena cidade na região de Ozark, Missouri.

Você fotografou a série Devil's Promenade juntamente com Antone Dolezal. O tema da série é a “luz assustadora” de Missouri Ozarks. O que é essa “luz assustadora” e há quanto tempo ela existe?
A “luz assustadora” é uma orbe de luz que, supostamente, aparece numa estrada rural no sul do Missouri. Avistamentos disso vêm de cem anos atrás e a foto mais antiga que vi dela data da virada do século XX. Há muitas histórias para tentar explicar a “luz assustadora”, que revelam muito sobre a história da região e a mistura das culturas europeia e nativa americana que aconteceu aqui. Simbolicamente, como uma luz na escuridão, isso tem uma força redentora para uma comunidade localizada no Cinturão Bíblico. Mas também dizem que o diabo mora ali, e que está pronto para roubar almas desavisadas. Como uma mariposa é atraída pela chama, o fenômeno tem atraído vários excêntricos ao longo dos anos, muitos dos quais também se tornaram parte da mitologia local. O folclore, passado de geração para geração, molda a vida da comunidade que vive no meio da luz. Acredito que essa mitologia compartilhada é mais importante para a comunidade local do que a luz em si ou se ela existe realmente ou não.

Publicidade

Você abordou Devil's Promenade de maneira similar à da outra série, Coming, Going and Staying?
Para Coming, Going and Staying e Devil's Promenade, meu foco estava somente nas pequenas comunidades rurais, os prazeres e as dores do isolamento hoje, e como lugares contidos desenvolvem suas próprias identidades culturais. Nos dois projetos, eu me interessei em como as pessoas do local respondiam ao invisível e inexplicável em suas comunidade.

Coming, Going and Staying

acontece numa cidade de fronteira no sul do Arizona. Há uma migração em larga escala acontecendo no deserto que cerca a cidade, visível principalmente por causa dos detritos deixados para trás, como sacos de dormir e jarros de água. Minha abordagem foi misturar retratos dos moradores com essa paisagem difícil e os sinais desse movimento invisível dentro dela. Com

Devil's Promenade

, trabalhamos com um material mais abstrato. Vejo a busca pela luz assustadora como um desejo da experiência transcendental como uma anedota para a banalidade da vida. Para esse tema, fez sentido incluir imagens feitas tanto em estilo direto como montado. Nosso projeto não está preocupado em documentar esse fenômeno, mas revelar a ambiguidade entre o tangível e o fantástico, e a inserção do mítico dentro de um mundo familiar.

Você diz que gosta de ajustar o ambiente de seus temas, o que não é típico de trabalhos documentais. Que efeito isso tem?
Não me considero uma fotógrafa documental. Sou uma narradora tentando encontrar os melhores visuais para descrever minha perspectiva das experiências. O retrato feito por mim tem a ver com usar o corpo e o ambiente para convidar a uma narrativa, não para descrever uma situação como ela realmente é. Acho que como estrangeira, seria arrogante de minha parte sugerir que isso é possível. O efeito é que o retrato é uma mistura do tema e de mim. Sou uma narradora, a presença invisível em todas as minhas imagens. Acho que é esse o caso com todos os retratistas e estou num diálogo com uma longa linhagem de artistas que posicionam seus temas e alteram seus ambientes (como Dorothea Lange e Alec Soth), mas gosto que meu papel seja explícito.

Publicidade

Você sente que isso tira os temas de suas realidades pessoais?
O simples fato de fazer um retrato já vai tirar um tema de sua realidade. Todos os retratos são uma performance para a câmera. Quero que meus temas tenham controle sobre como eles são percebidos (nunca fantasio), e luto para fazer uma imagem que reflita a versão deles que eles oferecem a mim. Mas as pessoas são extremamente complexas, mais complexas do que um retrato pode conter. Uso maquiagem todo dia. Uma imagem “real” minha seria com ou sem essa máscara? Não sei, mas, para mim, é mais interessante essa fantasia maleável que criamos sobre nós mesmos e outras pessoas do que o material cru que são nossos corpos ou a bagunça do nosso ambiente descuidado.

Você pode contar mais histórias sobre as pessoas que conheceu e fotografou pelo caminho?
Um dos retratos da série Coming, Going and Staying é o de Angel, uma mulher no final da adolescência que vive numa pequena cidade perto da fronteira. Passei uma tarde com ela conversando sobre sua vida e tirando fotos. Ela ficou surpresa por eu achar o lar dela interessante, porque tudo era muito pequeno e, para ela, notícia velha. Ela tinha se formado no colegial um ano antes e trabalhado em vários empregos desde então, saindo com um grupo que também estava preso ali e que em geral não tinha trabalho. Naquela manhã, ela tinha largado seu emprego na Dollar General, onde ela tinha desenvolvido síndrome do túnel carpal por trabalhar como caixa. Ela falou muito sobre sair da cidade, mas falou ainda mais sobre um jovem veterano e peão de rodeio por quem ela estava apaixonada. Decidi fotografá-la em seu carro; o assento era coberto de corações que pareciam estar flutuando ao redor dela. Além disso, um carro é um meio de escapar se você escolher usá-lo.

Publicidade

Como é a vida tão perto da fronteira?
Pela minha experiência, os lugares onde fiquei enquanto trabalhava nesse projeto não eram muito diferentes da cidadezinha onde cresci no Meio-Oeste. O esforço para manter um senso de comunidade diante de oportunidades econômicas tão limitadas parece caracterizar a vida rural dos Estados Unidos hoje, e isso não se sujeita a diferenças geográficas. Conheci pessoas que estariam perdidas sem a rede de segurança de uma comunidade próxima, aqueles cuja tendência em se isolar exige grandes espaços abertos, e outros que se sufocam na mesmice e na falta de recursos, mas que não conseguem ir embora. Todas essas pessoas me pareciam muito familiares, apesar de viverem numa paisagem que, inicialmente, para mim era muito exótica. Quando comecei o projeto, eu me surpreendi com essa familiaridade, pois, de muitas maneiras, a fronteira também é única. Mas descobri que para os moradores, a presença de postos de controle na saída da cidade, patrulhas temporariamente estacionadas em cafés, helicópteros circulando e artigos nos jornais detalhando as grandes quantidades de droga ou de imigrantes encontrados vivos ou mortos nos arredores do deserto tinha se tornado o ruído de fundo em sua vida de cidade pequena.

Lara Shipley estudou jornalismo na Universidade de Missouri e fotografia na Universidade Estadual do Arizona. Atualmente, ela trabalha como professora na Universidade do Kansas e é coeditora do Search Party Press.

Publicidade

Siga a

Mossless

no Twitter.

Da série Devil's Promenade.

Da série Coming, Going and Staying.

Da série Coming, Going and Staying.

Da série Devil's Promenade.

Da série Coming, Going and Staying.

Da série Devil's Promenade.

Da série Coming, Going and Staying.

Da série Coming, Going and Staying.

Da série Devil's Promenade.

Da série Coming, Going and Staying.

Da série Coming, Going and Staying.

Da série Coming, Going and Staying.

Da série Devil's Promenade.

Da série Devil's Promenade.

Da série Coming, Going and Staying.

Da série Devil's Promenade.

Da série Devil's Promenade.

Da série Coming, Going and Staying.