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Milhões de Festa

Barcelos é uma cidade pequena com personagens enormes

Gente como o Mendes, o Fernando Picasso ou o Quim Ricocas.

O Mendes (fotografia por Pedro Luís Silva,

Jornal Barcelos

).

Tal como qualquer outra normal pequena-média cidade portuguesa, também Barcelos está dotado de verdadeiras personagens felinianas. Não será, por isso, difícil que os festivaleiros, os que extravasam os portões do recinto e do parque de campismo, dêem de caras com algumas dessas figuras — até porque não são poucas. Difícil mesmo foi escolher apenas três. As gentes de Barcelos são, por norma, exaltadas e, como tal, não se limitam exclusivamente aos clichés do velhote sentado no banco de jardim ou da senhora que todos os dias pergunta “que horas são?” para saber se a missa das seis da tarde já começou.

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O MENDES

A prova viva dessa irreverência colectiva é o Mendes. Rosadinho e careca, de camisa e calças de vinco, e às vezes de chapéu redondo, quase diariamente atravessa a Rua Direita numa correria desenfreada, fazendo-se acompanhar de grunhidos dignos de uma invasão bárbara. Apesar de intimidante, este comportamento não deverá ultrapassar um simples barafustar, ainda que haja uma voz provocadora a sussurrar-lhe aos ouvidos. Quem não se deixa intimidar é o próprio Mendes que, em dia de concerto gratuito no centro da cidade, salta para a primeira fila e dança, não raras vezes tornando-se no centro das atenções. A travessia da ponte que liga Barcelos a Barcelinhos poderá também constituir uma aventura para quem por lá passar, dado que é um dos seus percursos habituais — a pé ou de vespa.

FERNANDO PICASSO

Menos extrovertido e mais conversador, de boina e barba, eis o Fernando Picasso. Ou Picasso, apenas. Barcelos não é Guernica, mas consta que esta versão minhota também pinta (daí a alcunha?). Há também o rumor de que serão seus alguns dos desenhos de figuras literárias espalhados pelas paredes da cidade. Apesar do dote para as artes plásticas, o mais provável é encontrarem-no a tocar guitarra ou cavaquinho na rua do Círculo Católico dos Operários de Barcelos. É frequente deixar a própria porta de casa aberta. Se vos convidar a entrar, não hesitem. Tudo pode acontecer.

QUIM RICOCAS

Do outro lado da ponte, em Barcelinhos, há uma janela que raramente se abre para fazer ouvir os acordes do mais recente êxito do Paulo Gonzo. Lá dentro, a tocar guitarra, estará Quim Ricocas, o Bob Dylan de Barcelos — como já devem ter reparado, ninguém se inibe na atribuição de alcunhas maiores do que a vida nesta cidade. Das gerações recentes são poucos os que ouviram falar nele e menos ainda os que o viram, mas nos idos anos 70 alcançou alguma fama, tendo chegado a actuar na televisão. Pela excentricidade visual há quem diga que ele parou no tempo: trança comprida, calças à boca de sino, botas com salto, óculos de sol, camisas floreais, lenços e chapéus à mexicana com rolhas penduradas a toda à volta. Tem um discurso um tanto ou quanto surreal (“vou comer uma sande de inox”, por exemplo) e gosta de dormir sentado, entre outras curiosidades que fazem do Ricocas uma espécie de lenda urbana. Isso e ter-se enclausurado em casa nestes últimos anos, saindo à rua apenas ocasionalmente. Oxalá o encontrem. Não tenho fotos nem vídeo para vos mostrar, mas experimentem pesquisar no arquivo de Vilar de Mouros de 1971.