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Um brasileiro deu o primeiro passo para imprimir um coração bioartificial

Os planos de Gabriel Liguori é imprimir um órgão e mudar a história (e a fila) de transplantes no mundo até 2030.
Foto: Pixabay

Gabriel nasceu sem uma das principais artérias do coração e passou um grande tempo entre idas e vindas nas alas do Instituto do Coração, em São Paulo. Isso fez com que desde pequeno ele se interessasse pelo ambiente do hospital e, mais tarde, fizesse medicina e trabalhasse na mesma instituição que salvara sua vida. Hoje, com 28 anos e dois PhDs especializados na engenharia de tecidos e cirurgia cardiovascular, o cara resolveu ir além e começou sua jornada para construir um coração em uma impressora 3D até 2030.

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O primeiro passo dado para a realização desse projeto é o hidrogel, uma matéria que consegue construir novos órgãos e funciona como uma tinta para a impressora poder imprimir qualquer coisa que tenha tecido. Ele está em processo de patente, mas já pode ser considerado confirmado e de sucesso, já que, nesse ano, recebeu o Prêmio Nacional de Cirurgia Cardíaca no principal congresso da Sociedade Brasileira Cardiovascular.

Segundo Gabriel, a teoria é simples. "O nosso plano é construir o coração utilizando uma técnica de engenharia de tecidos conhecida como bioimpressão, que nada mais é do que a impressão 3D de tecidos humanos", contou ao Motherboard. "Diferentemente da impressão 3D tradicional, entretanto, em vez de utilizar materiais plásticos como matéria-prima, a bioimpressão utiliza algo chamado de biotinta." A composição dessa biotinta, explica, consiste em um hidrogel com células-tronco, que acaba originando o tecido de interesse.

Esse projeto nasceu, no entanto, de uma necessidade. Hoje em dia a medicina e o mercado de pesquisas tem dois tipos de géis: os naturais e sintéticos. E eles carregam em si a deficiência de não interagir com as células e o risco de não serem bem aceitos pelo organismo. Já este novo pensado pelo cientista brasileiro foi desenvolvido para "oferecer às células todas as informações bioquímicas e biomecânicas às quais elas estariam expostas no tecido nativo", já que ele é fabricado a partir das células do próprio tecido de interesse.

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Gabriel Liguori. Foto: Divulgação

Isso faz com que ele se torne um grande aliado na cultura 3D e bioimpressão porque influencia diretamente na proliferação de células-tronco e permite a formação de redes microvasculares, aqueles pequenos vasos internos dos órgãos em que o sangue passa para chegar até os tecidos. Isso significa que, no futuro, será possível criar órgãos para tratar doenças que hoje precisam exclusivamente de transplante.

"O uso do gel em pacientes, entretanto, ainda deverá levar algum tempo, não por causa do gel em si, mas pelos diversos outros processos que ainda são necessários otimizar para conseguirmos fabricar órgãos e tecidos em laboratório", salienta Gabriel. Ele calcula que demorará mais ou menos 5 anos para que tudo esteja certinho e os testes clínicos para tecidos mais simples sejam fabricados.

Tretas burocráticas impedem avanço mais rápido

O inimigo que o impede, segundo ele, é toda a papelada que se precisa para patentear ou conseguir lançar algo novo no mercado. "Qualquer avanço tecnológico exige liberdade de mercado e desburocratização. Por ser um país extremamente restritivo e burocrático, o Brasil não consegue ficar a par com o resto do mundo nas áreas de ciência e tecnologia", diz. Ele gostaria que houvesse maior liberdade para importar materiais de pesquisa sem valores exorbitantes em formato de taxas e fosse mais simples abrir uma empresa para a comercialização de uma tecnologia.

Abrir uma empresa na área de biotecnologia, afirma, é extremamente difícil, burocrático e desestimulante. É preciso que o cientista em questão tenha uma considerável experiência em processos jurídicos e empreendedorismo. "Assim, o mundo perde a possibilidade de ter sua tecnologia aplicada em produtos que de fato vão melhorar a vida das pessoas e tudo o que foi desenvolvido morre em artigos científicos que nunca se transformarão em algo concreto", completa Gabriel.

Por esse mesmo motivo, todo o caminho a se percorrer até termos o coração em mãos é longo. Com esse primeiro passo dado, o foco é começar a testar o hidrogel nas impressoras 3D para que seja comprovado que temos a capacidade de possuirmos um coração bioartificial batendo em alguns anos.

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