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A hot yoga é uma mentira

Você está eliminando água e sal, não toxinas.
Crédito: Matt Cardy / Getty.

Mesmo que essa tendência tenha surgido anos atrás, a modalidade hot yoga está no seu auge. Numa visita recente ao sul da Califórnia, nos EUA, fui pressionada a encontrar uma aula de ioga abaixo dos 37 graus. Sou professora de ioga há mais de uma década e fiquei curiosa: qual é a dessa moda e por que ela está se destacando?

A hot yoga é amplamente divulgada como “destoxificante”, acontece que “destoxificar” é uma palavra sem qualquer sentido nesse contexto. “Muitas pessoas dizem que ela é boa para eliminar as toxinas do corpo, o que não é verdade”, afirma Daria Long Gillespie, professora-assistente e clínica na Universidade do Tennessee e vice-presidente sênior de estratégia clínica na ShareCare, um banco de dados de perfis de saúde nos EUA. “Metabolizamos as toxinas de nosso corpo por meio do fígado, dos rins e dos intestinos, não pela sudorese”. A verdade é que nosso corpo remove as toxinas por si só e o que eliminamos em nosso suor é água e sal.

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A sudorese intensa da hot yoga é outro problema. Pode funcionar contra o trabalho natural do corpo de controlar a temperatura. Seu corpo costuma ser bastante esperto para garantir que você não fique muito quente nem muito frio. Mas a hot yoga funciona contra você. “Em geral, seu copo [regula o calor] por meio do suor, e quando o ar frio chega, seu corpo resfria, mas como a sala da hot yoga fica muito quente, você não consegue ‘desligar’ esse calor”, afirma Noah Greenspan, terapeuta cardiovascular e pulmonar da cidade de Nova York. “Basicamente, você sua para resfriar seu corpo, mas como a sala está quente demais, o corpo não resfria.”

E aí você sua mais ainda. E mais e mais. E você corre o risco de ficar desidratado. Loren Fishman, professora-assistente e clínica no Hospital Presbiteriano de Nova York, da Universidade de Columbia, me contou que 50% dos praticantes de hot yoga estão desidratados. A desidratação pode parecer inofensiva, mas a verdade é que ela pode ser muito perigosa.

Não vamos dramatizar ainda mais a situação, mas pense nisso: se você estiver praticando hot yoga seis vezes por semana e começar a ficar cronicamente desidratado, existem riscos em potencial. Fishman afirma que você poderá sofrer um derrame cerebral e segue com uma lista de danos em potencial da desidratação crônica: “Embolia pulmonar, todos os tipos de coagulopatias, em que seu sangue coagula, quando não se espera que ele faça isso”.

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Minha própria experiência praticando hot yoga não foi tão dramática, mas foi bastante patética. Fui a várias aulas de Bikram no início da moda. Mas aí fui embora de Miami e me mudei para NYC no meio do inverno e, mesmo tendo muitas dúvidas sobre o Bikram, eu realmente precisava me aquecer. As aulas me aqueceram bastante, mas também senti que, mesmo sendo uma pessoa consciente de meu corpo, eu sentia que as aulas iam longe demais, e acabava me sentindo uma merda nos dias seguintes.

Acontece que essa sensação ruim era provavelmente por causa da desidratação. Gillespie me contou que também sentiu efeitos semelhantes. “Testei a hot yoga”, disse. “Saí de lá me sentindo desidratada e com um desequilíbrio de eletrólitos — pela falta deles — durante dois ou três dias.” Ela recomenda se hidratar antes e depois da aula, não somente com água, mas com líquidos que reponham os eletrólitos, como Gatorade. A questão é, por quanto tempo é necessário se preparar para, ou se recuperar, da hot yoga? Pratico seis vezes por semana e, pessoalmente, não quero pensar muito nisso.

Nenhum dos médicos ficou particularmente preocupado com os danos da hot yoga com pessoas saudáveis e em boa forma. Greenspan, que é uma ávida praticante de ioga, estava mais preocupada com as pessoas com fatores de risco, como doenças cardiovasculares ou problemas respiratórios, e com pessoas que não prestam atenção aos sinais fisiológicos que seu corpo envia quando as coisas estão indo longe demais. “A dor”, ele afirma, “não é somente algo de que gostamos, ela também tem um objetivo. A dor é um sinal de aviso.”

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Um perigo em potencial da hot yoga é que o calor poderá reduzir nossa capacidade de sentir os sinais de dor que nosso corpo envia. “O que faz a hot yoga ser tão boa são as coisas que a tornam um pouco mais arriscada”, Greenspan afirma. “Como está quente, seus músculos ficarão naturalmente mais relaxados, e com capacidade de distensão um pouco maior do que o normal se não estivesse tão quente e você não tivesse o mesmo nível de dor ou desconforto do que se sala estivesse em temperatura ambiente.”

Greenspan também observa que as pessoas que praticam regularmente a hot yoga têm mais risco de ficarem doentes do que de se machucarem — todos os médicos com quem conversei concordaram. Ele prosseguiu descrevendo como o calor em demasia e os ambientes fechados de muitas aulas podem criar o cenário perfeito para a propagação de doenças. “Eu estava na fila, esperando para entrar em uma aula e um homem perto de mim contou que estava com uma gripe horrível, e esperava que a aula o ajudasse a limpar seus pulmões. Fui embora, porque não queria que aquilo que saísse do pulmão dele fosse parar no meu.”

Em outras palavras, as aulas de hot yoga podem ser bem nojentas. A combinação de calor com suor pode criar um terreno fértil para as bactérias. E uma prática regular de sudorese pesada por ser perigosa se você tiver outros fatores de risco ou se não der ouvidos aos sinais do seu corpo.

A hot yoga pode não ser mais perigosa do que quaisquer outros tipos de ioga, ou mesmo de outras atividades físicas — acontece que ela pode não ter nenhum benefício, Fishman afirma: “A ioga é praticada nas florestas úmidas do Ceilão, mas também no gelado Himalaia. A ioga é praticada em todos os tipos de clima. Não se pode chegar à conclusão de que a hot yoga não passa de mais uma invenção.”

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