Q&A: LIVIA FIRTH

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Sustainability Week

Q&A: LIVIA FIRTH

Livia Firth é o fundadora e diretora criativa da Eco Age Ltd. Mandamos algumas perguntas para ela, que nos respondeu todas duma só vez com um texto que é praticamente um manifesto.

Livia Firth é o fundadora e diretora criativa da Eco Age Ltd. Mandamos algumas perguntas para ela, que nos respondeu todas duma só vez com um texto que é praticamente um manifesto.

Pense no seguinte:

Todo dia, todos nós temos que nos vestir – então a moda é uma indústria com a qual estamos engajados todos os dias, sem exceção. A moda é uma indústria abrangente – inclui desde a agricultura até a comunicação.

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É uma indústria de 3 trilhões de dólares com o maior impacto sobre as pessoas e o planeta, mas, ainda assim, nunca pensamos no esgotamento dos recursos do planeta, na poluição (é o segundo setor mais poluente do mundo, perdendo apenas para a indústria do petróleo e da mineração) e, mais importante, nas pessoas na base da cadeia produtiva.

Em todo o planeta, entre 60 e 75 milhões de pessoas são empregadas no setor têxtil, de roupas e calçados, muitas vezes submetidas a longas jornadas de trabalho em condições precárias e em fábricas sem segurança e higiene, recebendo salários de miséria em troca de uma atividade extenuante.

Para piorar ainda mais, muitas vezes elas enfrentam um cotidiano de discriminação e abuso físico e sexual. Mas no Ocidente, é raro fazermos a ligação com a forma como nossas roupas são feitas ao comprá-las.

O fast fashion mudou completamente o panorama da indústria da moda. Pode ser difícil lembrar de um tempo em que não era possível comprar uma camiseta por US$ 5, mas o fast fashion não existia 20 anos atrás. Antes, nosso consumo era completamente diferente – economizávamos para comprar roupas de qualidade que amávamos, cuidávamos e guardávamos as peças por muito tempo. Há 20 anos, nosso desejo era por roupas de melhor qualidade, não em maior quantidade. Mas hoje o mundo compra 80 bilhões de peças de roupa por ano! É um aumento de 400% em relação a duas décadas atrás. E para onde vai tudo isso?

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Fast fashion é como um vício em açúcar que leva à obesidade. Só que não é tão fácil enxergar imediatamente o dano causado pelas roupas descartáveis. As catástrofes ambientais. A imprudência empresarial. As injustiças sociais. Como meu amigo e economista Guido Brera sempre diz – oje

hoje podemos não ter dinheiro para pagar por educação, plano de saúde ou casa, mas ainda assim nos sentimos ricos e felizes porque podemos comprar um monte de roupa por ano a preços muito baixos.

No outro lado do mundo, enquanto isso, para satisfazer nossos hábitos vorazes de consumo, milhões de pessoas – a maioria, mulheres – são escravizadas em um ciclo de pobreza, produzindo roupas baratas e rápidas para atender a demanda. Ou será que a demanda hoje é alimentada por ciclos de produção velozes e furiosos? Os limites são nebulosos e isso é fast fashion em ação.

A única forma de mudar isso é fazendo com que as marcas de fast fashion mudem seus modelos de negócios. Não é possível ser sustentável produzindo 40/50 coleções por ano, não importa quantos esquemas de reciclagem e circuito fechado sejam implementados. Uma marca de fast fashion alardeia como grande sucesso a produção de 1,3 milhões de peças com materiais em circuito fechado, mas isso não é tão impressionante assim quando você percebe que isso representa apenas 2% de toda a produção anual dela.

É hora de ouvir para além do barulho de alegações de sustentabilidade infligido sobre nós pelas marcas de fast fashion. É hora da indústria parar de se esconder atrás de relatórios e estatísticas bem elaborados que só mostram parte do contexto – mitos que rapidamente se transformam em truísmos.

E todos nós, da sociedade civil, cidadãos ativos, devemos nos tornar consumidores ativos. Retome a ideia de que "nos vestimos todos os dias" e você vai perceber na hora o imenso poder que temos. Se parássemos de consumir no nível que as marcas de fast fashion nos viciaram, não precisaríamos de uma conferência dedicada a encontrar soluções para a confusão ambiental e social que a moda criou.