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Israel Está Tentando Desencadear uma Intifada?

O governo israelense insiste que quer paz, mas mandar provocadores atirarem prontamente no joelho de palestinos é um jeito estranho de alcançar isso.

Foto por Eloïse Bollack.

É um medo estranho para um governo que se cerca de muros de concreto, baterias de mísseis e aço blindado, mas o Estado Israelense parece ter uma fobia patológica de pedras.

Palestinos encarando soldados armados em equipamento completo de combate geralmente não têm outras armas que não as pedras embaixo de seus pés; em grande parte dos territórios ocupados, jogar pedras é considerado uma forma de protesto não violento. (Na história da ocupação, 14 israelenses morreram por pedradas. Em comparação, quase o dobro de norte-americanos morrem a cada ano por ferimentos causados por skate.)

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E essa ameaça é tão grande que uma nova lei aprovada pelo Knesset israelense introduziu sentenças obrigatórias de quatro anos de prisão para quem jogar pedras, com possibilidade de penas de até 20 anos. Os palestinos são proibidos de colocar qualquer objeto em movimento aéreo; nos territórios ocupados, a lei da gravidade é aplicada pela polícia.

No entanto, se jogar pedras é uma atividade tão perigosa, por que soldados israelenses estão fazendo isso? Num vídeo dramático que emergiu na internet na semana passada, soldados israelenses usando camisetas e keffiyehs são vistos jogando pedras como parte de um grupo de jovens palestinos, aparentemente para incitar o confronto; depois, eles sacam suas armas e atiram na multidão. O vídeo também mostra um soldado à paisana disparando diretamente contra a perna de um manifestante, que tentava escapar de chutes e socos de um grupo de israelenses furiosos.

O governo israelense insiste que quer paz, mas mandar provocadores atirarem prontamente no joelho de palestinos é um jeito estranho de alcançar isso. Não parece que Israel esteja tentando evitar uma intifada – parece que ele quer desencadear uma.

Israelenses disfarçados de palestinos atacam palestinos.

A Primeira Intifada, que, no geral, foi um levante palestino pacífico diante da repressão militar, só começou a utilizar táticas violentas em 1990, quando um grupo israelense colocou, em Jerusalém, uma pedra angular de um templo judeu reconstruído ao lado da Mesquita de Al-Aqsa.

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A Segunda Intifada, brutal desde o início, começou em 2000, quando o líder israelense Ariel Sharon, então de oposição, fez uma visita provocadora ao Monte do Templo acompanhado de centenas de policiais da tropa de choque. É uma simplificação idiota reduzir essas lutas a divergências por causa da arquitetura (muitos palestinos seriam mais indulgentes com visitas políticas não programadas pela Cidade Velha se tivessem autonomia nacional e plenos direitos políticos); no entanto, se Israel fala sério sobre a paz, então um primeiro passo importante seria se abster de aparecer no Monte do Templo.

Ainda assim, os rumores nos últimos meses têm sido de que o governo israelense tem planos de relaxar as regras sobre o número de judeus permitidos na montanha sagrada – muitos dos quais fazem a peregrinação para demonstrar soberania sob uma Jerusalém não dividida – numa tentativa de fortalecer os direitos judeus sob o complexo. Israel negou repetidamente essas alegações, só que o resultado disso tem sido um aumento da violência aleatória e mortal entre as duas comunidades.

Esfaqueamentos, tiroteios e perseguições se seguiram – incluindo um caso irônico em que um judeu israelense esfaqueou outro judeu por achar que ele parecia árabe demais. Confrontos violentos entre os dois lados continuaram no último final de semana, quando quatro palestinos foram baleados e mortos por tentarem, supostamente, matar israelenses em ataques separados pela região.

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Entretanto, se elementos do Estado Israelense querem deliberadamente inflamar as tensões, ainda não está claro o motivo – afinal de contas, os israelenses têm tanto a perder com uma Terceira Intifada quanto os palestinos, certo?

Pode ser possível encontrar alguma resposta na escalada de violência que precedeu a última guerra em Gaza, um ano atrás. Em junho de 2014, três adolescentes colonos israelenses foram sequestrados na Cisjordânia; um deles conseguiu ligar para o serviço de emergência, mas a fita foi colocada sob sigilo judicial e a mídia israelense supostamente foi proibida de mencionar o som de disparos de armas automáticas no final da gravação, o que poderia indicar que os garotos já estavam mortos.

Sendo assim, o público israelense pode ter sido encorajado a acreditar que os adolescentes estavam sendo mantidos em algum lugar da Cisjordânia; assim, os militares realizaram uma operação de busca intrusiva na qual centenas de pessoas foram presas, inclusive dezenas de líderes do Hamas, e cinco palestinos foram mortos.

Se a operação de busca foi uma tentativa calculada de provocar o Hamas, isso funcionou: dez semanas depois, 2 mil moradores de Gaza estavam mortos nos escombros do que antes era sua cidade. O contexto político é importante aqui – logo antes do sequestro, o Hamas e seu rival Fatah tinham formado um governo unido palestino, o que levou o Hamas reconhecer oficialmente o Estado de Israel.

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Tudo que Israel afirmava querer estava acontecendo: eles finalmente tinham um parceiro de negociações que podia representar todo o povo palestino – e que estava disposto a reconhecer a legitimidade de Israel como precondição para o diálogo. De repente, o fim do conflito entre Palestina e Israel parecia quase ao alcance, o que poderia acabar num Estado Palestino inteiramente independente. Em vez disso, houve uma guerra, e a unidade do governo palestino se desintegrou.

Para Israel, esses surtos brutais de violência não atrapalham o status quo – eles são uma maneira de preservá-lo. Algo parecido está acontecendo agora: a bandeira palestina foi levantada nas Nações Unidas, e o país se juntou oficialmente à Corte Penal Internacional. Netanyahu encara a perspectiva de um processo de paz que realmente pode levar a algum lugar, em vez de procrastinar enquanto o concreto dos novos assentamentos na Cisjordânia seca. E, no mundo bizarro e abismal da política israelense, isso pode significar que é hora de uma nova guerra.

@sam-kriss

Tradução: Marina Schnoor.

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