A disputa virtual entre a ROCAM e os pilotos do grau em SP
Foto: Divulgação/ROCAM 22M

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A disputa virtual entre a ROCAM e os pilotos do grau em SP

Pequenas provocações pautam o universo virtual do grau e a polícia montada em motos.

*Essa reportagem foi atualizada com novas informações às 13:53 do dia 01/09.

O grau e a raspação de placa são modalidades constantes nas periferias de São Paulo — como já vimos na crew Vila do Grau na zona norte da cidade, apesar da proibição no Código de Trânsito Brasileiro. Só que nem tudo são flores, empinadas e GoPro. Praticantes do "chama no grau" comentam que tiveram de fugir da Ronda Ostensiva Com Apoio de Motocicletas (ROCAM) da Polícia Militar de São Paulo ao praticarem suas manobras pelas ruas. Mas com a ajuda de câmeras, o jogo de gato e rato também foi parar nas redes.

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De um lado, os pilotos de rua usam a internet para exibirem suas habilidades e conquistarem fãs. Do outro é a polícia de São Paulo (que já possui uma presença virtual bastante expressiva) usando as facilidades virtuais para se comunicar com os seus espectadores sem a interferência da assessoria de imprensa da Secretaria de Segurança Pública. Dá pra ver a atuação de membros da ROCAM em seus canais no YouTube e em páginas no Facebook dedicadas diretamente à mostrar seus feitos nas ruas.

Um dos canais mais populares da cultura do grau publica diversos vídeos de fugas, das que deram certo até as que acabaram em abordagens.

Em uma pesquisa superficial no YouTube, já é possível mapear mais de 20 canais oficiais de autointitulados membros da ROCAM, que costumam nomeá-los de acordo com o número do batalhão. São inúmeros vídeos de perseguições de motos e carros, além de abordagens a motociclistas pegos correndo nas ruas ou suspeitos de roubo. Vários desses canais contabilizam mais de 100 mil inscrições e são altamente elogiados pelos espectadores. Neles, é possível ver abordagens sem rostos borrados (típicos elementos de programas policiais) e PMs que se dizem caçadores de bandidos ou infratores.

O canal ROCAM 22M é um dos mais famosos do tipo com quase 300 mil inscritos. Nele o administrador Soldado Alcântara sobe vídeos com o trabalho diário no batalhão, situado na zona sul de São Paulo. Por e-mail, o PM avisa que pediu autorização para seu comandante para responder nossas perguntas (e publicar seus vídeos) e nega haver qualquer tipo de provocação por parte dos policiais. "Apenas cumprimos com o nosso trabalho", respondeu o soldado, sucinto. "O intuito é mostrar o nosso dia a dia e ocorrências que nos deparamos. "

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O apreço pela velocidade, emoção e abordagens fazem dos vídeos dos canais oficiais da ROCAM parecerem filmes de ação amadores. PMs usam linguagem parecida com civis que dão fuga.

Ainda que em lados opostos, ROCAM e e pilotos do grau usam técnicas de divulgação muito parecidas. Ambos postam vídeos de fugas editados como verdadeiros filme de ação ou gameplays de GTA com trilhas sonoras temáticas. No caso do grau, imperam os funks que retratam a cultura moto ciclística de rua. Já no caso da PM existem raps feitos exclusivamente para exaltar a ROCAM ou o trabalho da polícia em geral. As provocações são parecidas também. Enquanto alguns fãs dos pilotos caçoam de ver policiais da ROCAM sendo despistados, os admiradores dos PMs zombam quando assistem uma abordagem bem-sucedida da polícia nas vielas da cidade. A imagem que fica é como assistir um filme de ação desmembrado em duas partes: a visão dos "mocinhos" e a visão dos "bandidos".

Para o empresário e motociclista Rod*, a perseguição da ROCAM começa com uma "fuga" bem-sucedida de um piloto de grau. Ele, no entanto, diz que grande parte das "provocações" dos canais de pilotos do grau não são obra dos próprios protagonistas das perseguições. "Quem deu a fuga jamais vai querer se expor, senão dá problema, né? Esses vídeos acabam sendo postados pelos caras que administram as páginas. "

Rod diz estar em todos os grupos das páginas famosas de motociclismo e admite que exista uma "guerra" constante de postagens. O maior motivo de irritação dos PMs, segundo o motociclista, é que uma fuga bem-sucedida libera o piloto do grau de desembolsar quase R$ 2.500 em uma multa por malabarismo em via pública.

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O soldado Alcântara, por sua vez, diz não haver provocação. "Somos profissionais no que fazemos. Eles fogem porque não querem ser responsabilizados pelo crime ou contravenção que estão cometendo."

Páginas de Facebook contrárias à ROCAM e, supostamente, moderada por ladrões de motocicletas fazem postagens "zoando" os policiais.

Nesse universo de provocações mútuas, surgiram também páginas de Facebook que compartilham imagens e selfies de pessoas que, supostamente, roubam motos. Embora essas páginas não terem nada a ver com a cultura do grau (que repudiam, inclusive, por mancharem a reputação do rolê), o elo em comum acaba sendo o ranço pela ROCAM. Com isso, os próprios PMs acabam tratando os pilotos do grau no mesmo balaio de ladrões de moto.

Rod também explica que muitas vezes as provocações da página acontecem porque os próprios policiais os tratam com preconceito. "Os ROCAM tratam a gente como bandido e a gente não é assim. Sou empresário e muito do pessoal di grau é trabalhador. Eles tratam como se a gente fosse matar alguém. Essa é a realidade."

Junto aos canais da ROCAM e as páginas anti-polícia como a "Os menó problemático" parecem ter criado, juntos, um novo nicho automobilístico nas redes. Mesmo a denúncia da existência dessas páginas pelo SBT não pareceu inibir as provocações que alguns internautas fazem nas redes contra os policiais motociclistas, incentivando os PMs da ROCAM a usarem a mesma linguagem em resposta, tornando tudo um clico sem fim.

Entramos em contato com a SSP sobre as provocações mútuas. Segundo o Capitão da PM, Rodrigo Fernandes Cabral, a divulgação de filmagem de acompanhamentos e ocorrências policial-militares, quando produzida pelos policiais, devem ser autorizadas pelo Centro de Comunicação Social/PMESP. "Nos casos apontados pela reportagem, a Instituição irá verificar se elas estão dentro das normas estipuladas pela Diretriz de Comunicação Social, " conclui.

*O nome foi modificado a pedido do entrevistado.

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