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Dez aspectos fascinantes sobre o meu fim-de-semana louco no Algarve

Se tivesse ligado para a minha bisavó, ela não teria acreditado.

O Algarve sempre foi para mim um saco onde cabiam as mais agradáveis memórias, assim como uma angústia infantil em tudo ligada à saudade de estar em casa a brincar com o que me apetecesse. O Algarve, tal como o conhecia até aos 15 anos, era aquele lugar cheio de praias e parques aquáticos para onde nem sempre era possível levar o ZX Spectrum ou o Commodore 64. Um espaço de alegria condicionada, vá lá. Mas tudo isso mudou no fim-de-semana prolongado do 25 de Abril. Posso garantir que vivi alguns dos dias mais felizes da minha vida em passeio por paragens algarvias (em redor de Portimão). O tempo estava óptimo, ainda não se verificavam as enchentes insuportáveis do verão e o sul do país deixou-nos a todos (fomos quatro amigos para baixo) com uma enorme vontade de aventura e avacalhanço. Tantos dias depois do regresso a casa, confesso que ainda estou cansado, embora muito satisfeito. É também por estar cansado que vou descrever os mais marcantes pontos desse fim-de-semana através de tópicos.

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O AUTÓDROMO DOS MITOS

Suspeito que o cosmos tenha decidido, em determinado momento, que o Autódromo Internacional do Algarve (AIA) receberia a cada cinco anos um evento absolutamente mítico: assim foi, em 2009, quando os My Bloody Valentine deram por si em confronto com milhares de fãs de Offspring, num acontecimento que agora mesmo passarei a designar como a Batalha Alva de Portimão (de um lado o ruído branco e do outro os lenços brancos acenados pelos putos). Desta vez coube a David Hasselhoff a tarefa de fazer história, enquanto encabeçou um espectáculo com o muito esclarecedor título de

Celebrate the 80’s & 90’s with the Hoff

 (festa inserida numa digressão de corridas motorizadas chamada Acceleration). Se, no passado dia 25 de Abril, tivesse ligado para a minha bisavó, que está no céu, e lhe contasse que estava no Algarve a ver o Hasselhoff a cantar os seus principais êxitos, ela não acreditaria certamente.

VISITA GUIADA PELAS FANTASIAS SEXUAIS (1986-1993)

Caso tivesse aproveitado o telefonema para contar à minha bisavó que nesse mesmo dia vi em carne e osso alguns dos ícones do meu despertar sexual, então é bem provável que ela acreditasse (pelos mesmos motivos que alguém acredita que o golo é mais fácil numa baliza de alargada dimensão). E de facto lá estavam, no palco do evento nostálgico, Samantha Fox e Anita Doth, dos 2 Unlimited. A primeira ainda mantinha alguma da chama que fez dela a rainha dos posters de oficina, durante a segunda metade da década de oitenta. A Anita, por sua vez, não correspondia muito à imagem que eu guardava da chavala sexy que por acaso até canta techno. Aliás a Anita até parecia mais uma viúva cigana que passa os dias a ouvir

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Baléle

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AUSÊNCIAS E PIADAS DE MAU GOSTO

Quando até já estávamos um pouco atrasados para o evento, começámos a falar sobre as grandes ausências desta data portuguesa da digressão (que inclui outras estrelas da pop mais VH-1). Lamentávamos que não fosse possível ver Rick Astley e a sua eterna juventude, o carnaval non-stop dos Vengaboys e os mais espectaculares seios que alguma vez saltaram de uma piscina, num teledisco (os da Sabrina, claro). Ocorreu-me nesse momento que, de modo a colmatar essas lacunas, podia ter sido contratado um artista que desse pelo nome de Mongolloyd Cole.

PROJECTO DA BRUXA MARAFADA

Saímos do Autódromo Internacional do Algarve por uma estrada impossivelmente secundária que o meu amigo Ricardo encontrou no seu duvidoso GPS. Acontece que essa estrada mais parecia um caminho de cabras que um realizador utilizaria para filmar a enésima cópia do

Blair Witch Project

. O mais incrível é que encontrámos, nessa estrada sem qualquer iluminação, um bravo senhor que pedalava numa bicicleta sem faróis, a caminho da casa de um lobisomem ou de um ritual macabro. Só pode.

THE SPECIAL HOUSE

Aproveitámos o segundo dia de estadia para tentar encontrar a casa de férias do Mourinho, nas imediações de Ferragudo. Sentia uma vontade enorme de tirar umas fotos de chico-esperto à porta do casarão (com os dedos em “V” e essas merdas). A missão estava a decorrer normalmente até que o Ricardo disse no seu tom mais rezingão: “Será que é mesmo necessário ir ver a casa do Mourinho?!…” Pronto, boy, acabou-se a brincadeira.

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DISNEYLÂNDIA PSICÓTICA

Para um puto que cresceu a ver

Os Goonies

 muito regularmente, o Algarve também é especial por parecer aquela zona do país onde os piratas enterraram os tesouros. A região mais a sul de Portugal tem qualquer coisa de Disneylândia sem o Castelo da Bela Adormecida no meio. É esse o feeling que paira no ar, quando chegamos à Praia do Pintadinho e mesmo junto ao areal avistamos uma espécie de Castelo do Rei Ghob com influências da arquitectura árabe. Para que nada falte ao Rei Al-Ghob, a praia até inclui um barquinho com as palavras “Psicose” e “Prozac” pintadas na sua madeira. E assim será possível resistir à imagem do homem a fugir da PJ num barco chamado “Psicose”?

‘TÁ FIXE O CENTRO URBANO DE PORTIMÃO

O centro urbano de Portimão tem muito mais pinta do que algumas pessoas possam achar: está cheio de impressionantes graffitis, esculturas modernas nas rotundas e tabuletas a apontar para um qualquer estabelecimento chamado “O Holandês dos Caracóis”. Mas o auge do mobiliário urbano portimonense são mesmo os pilaretes (que impedem a passagem ou estacionamento de viaturas) pintados como se fossem cabeças de Playmobil. Obrigado, Portimão.

UM MAR DE LANAS DEL REY

Há muito estilo também por descobrir nas centenas de jovens que inundam a Avenida Tomás Cabreira, transversal à Praia da Rocha, para jantar e beber uns copos na noite de sábado. As referências da moda são mais que evidentes: elas fixam-se na Lana del Rey (calções perigosamente curtos e cabelo comprido), eles parecem quase todos clones do David Carreira. Mas até entre as mil Lanas del Rey há sempre uma que sobressai e não podia concluir esta lista sem saudar uma jovem que estava a abafar todas as outras, na Pizzaria La Dolce Vita (que, surpresa das surpresa, até passou duas de Boards of Canada no seu sistema de som). Só não criei no Facebook uma página de “Vi-te na Pizzaria La Dolce Vita”, porque esse é o tipo de merdas que são feitas por rapazes que vacilam na hora H (além disso, a miúda ainda devia ser menor de idade).

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GREMLINS NO CARVOEIRO

Os britânicos que passam férias no Algarve, tal com os Gremlins, são criaturas muito fofinhas, desde que sejam respeitadas algumas regras ao lidar com eles: 1) devemos evitar lugares fechados onde se encontrem às dezenas a celebrar a sua saloíce; 2) a partir da meia-noite há que mantê-los afastados do fatal 10.º pint de cerveja; 3) nunca podemos mostrar que estamos mais alegres que eles. Todas essas regras foram mais ou menos quebradas quando entrámos num bar do Carvoeiro chamado Round Up Saloon, onde decorria uma noite de karaoke. Aquilo parecia o

Titty Twister

, do

Aberto até de Madrugada

, mas com cotas ingleses em vez de vampiros mexicanos. A maioria dos homens cantava

crooners

 que qualquer outro cidadão europeu desconhece por completo. Depois os

beefs

 ainda tiveram que gramar com uma senhora que, talvez influenciada pelo ambiente de Saloon, achou boa ideia trazer Quinta do Bill para o karaoke. Mesmo antes de entrarmos em cena, uma cota britânica interpretou “Human”, dos Killers, com uma boa disposição que fez com que esse tema parecesse suportável. No final de todo esse calvário, chegou a nossa vez de dropar “Fight for your right”, dos Beastie Boys, em formação de trio (como se quer). Obtivemos reacções de desagradado, troça e até houve um bacano que me deu um empurrãozinho nas costas. A anfitriã do karaoke disse em inglês: “Eles soaram tal e qual a Beastie Boys: ruidosos, não?”. Missão cumprida.

ESTOU NA LUA

A cereja no topo do chantilly algarvio acabou por ser a breve visita a um estabelecimento recôndito, de Ferragudo, chamado Lunatic. Foi lá que nos serviram Cerveja Cristal (a opção do verdadeiro pedreiro) por cinco euros cada garrafa. O preço é mais que justificado já que, no Lunatic, há sempre a oportunidade de falar sobre arte, filosofia e turismo com algumas das interessantíssimas empregadas. Deixou muitas saudades e eu até deixei o meu cartão-de-visita VICE para ficarmos em contacto.