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BD

O Rudolfo não nos desperta o desejo lascivo

O puto que acabou de ilustrar uma banda desenhada do gajo de Wavves.

Este é o Diogo Jesus, o nome próprio do Rudolfo. Rudolfo da Silva, o primeiro gajo a ser expulso do Milhões de Festa por andar à porrada, não prescinde do seu Gameboy, de música 8bit ou de mangas. Desenha largo e acabou de ilustrar uma banda desenhada co-escrita pelo Matt Barajas e Nathan Williams, dos Wavves, o que lhe valeu um artigo na Pitchfork em que o seu nome até há bem pouco tempo não aparecia (procurem o link). Quis falar com ele para saber como é que lhe tem corrido a vida e para tentar saber um bocadinho mais sobre o panorama nacional da BD. VICE: Olá Rudolfo. Como é que surgiu essa fixação por banda desenhada?
Rudolfo: Nem sei, só me lembro de, com quatro ou cinco anos, o meu pai me oferecer livros da Marvel e da DC. Como eu ainda não sabia ler, ele lia-me os diálogos antes de dormir. Aprendi a ler com um número qualquer do Homem-Aranha 2099, que tem o pior fato de sempre. Aos oito ou nove, fiquei colado a ler uns volumes do AKIRA num supermercado. Os meus pais até se perderam de mim e tiveram de chamar a segurança. Aquela merda bateu. Depois, durante uns anos, caguei na BD, até ter colado em cenas de manga, por volta dos 12. Passei por uma fase dos 15-17 em que só lia cenas góticas do Jhonen Vasquez ou autobiográficas do Jeffrey Brown. Por essa altura, tinha voltado a fazer tiras com mais frequência, principalmente com meu amigo Chuaga. Participámos os dois no 18.º concurso da Amadora com uma BD cada um. Ele ficou em primeiro, eu em oitavo. Fiquei todo triste a pensar: "Se eu não me editar, quem o irá fazer?" Foi assim que comecei a editar fanzines de BD e afins. Acho que a obsessão só começou a tomar proporções doentias nessa altura. E perdura até aos dias de hoje. A capa de uma zine que talvez já tenham visto pela net. Passaste, então, uns anos valentes no mundo das zines e das edições de autor da banda desenhada portuguesa. Para quem está de fora, como é que descreverias esse meio?
Quando comecei a fazer as coisas em 2007, nem sabia que havia uma "cena" de auto-edição. Foi em 2009 que tive o meu primeiro contacto com a Chili Com Carne, para participar numa antologia chamada Destruição. A partir daí comecei a conhecer a cena que, no fundo, eram sempre os mesmos há já uns anos. Eu era o puto novo, mas desde os finais de 2011 que tem havido mais gente a editar coisas, na sua grande maioria fanzines de ilustração. A BD em Portugal é meia-dúzia de gatos pingados. Não há muita gente na cena independente. Tens a Chili Com Carne, da qual sou membro, tens a MMMNNNRRRG, editora do co-fundador da CCC, o Marcos Farrajota. Depois, nas edições mais pequenas, tens o Clube Inferno (André Pereira, Hetamoé, Astromanta, entre outros), a Daniela Viçoso, o Tiago Araújo e a malta da MULA, que editava umas coisas, mas parou. Tens o BURACO, o Bruno Borges, algumas coisas da Oficina do Cego ou da Plana Press. Fora isto, há editoras uns bocadinho maiores, tipo a POLVO, ZONA BD e a Kingpin, ou então a malta do mainstream, mas no fundo são sempre os mesmos. E se há malta nova, não querem saber, porque não é nem franco-belga, nem uma homo-erotiquice de super-heróis, ou manga. Bem, a BD nunca teve grande público em Portugal, sempre foi um bocado desastroso, sempre foi uma merda nesse aspecto. Eu trabalho que nem um cão, porque queria mudar isso, e já me posso sentir satisfeito por projectos como as edições do Clube Inferno. Fico contente com isso. E como é que surgiu o contacto com o Nathan Williams de Wavves para fazerem juntos uma banda desenhada?
Há uma história engraçada por trás disso. Fui ao Primavera Sound [Porto, em 2012] com a minha miúda ver Wavves e, no fim do concerto, ela agarra-me a mão e diz: “Anda, quero levar-te a um sítio.” Levou-me a um local de onde se viam as bandas a ir do palco para o backstage. Já estavam lá alguns putos, o Nathan e companhia. Conheci-o e dei-lhe uns zines. O gajo, na altura, curtiu logo, mas nem liguei muito. Chego a casa às quatro da manhã e a minha namorada liga-me, toda histérica, a dizer: "VAI AO TWITTER DO NATHAN!” O gajo tinha feito uns tweets sobre mim, mas ya, fixe, nem liguei. Dois dias depois, tenho a proposta para desenhar o Negative Dad e o resto é história, como se costuma dizer. Foi isso, basicamente. Isto é capaz de vir a valer dinheiro no futuro. Aqui entre nós, quando ela te disse "quero levar-te a um sítio" e acabaste noutro onde podias ver bandas a ir para o backstage não ficaste muito satisfeito, pois não?
Pá, eu queria dar ao Nate as minhas cenas e a miúda tinha ido ver onde era esse sítio de propósito, para isso se tornar possível. Se não tivesse acontecido nada disto, não teria ficado muito satisfeito, é certo]. Também tens um projecto musical, Rudolfo, que mistura mil géneros com chiptune. Como tem andado isso?
Bem, de momento, a música tem andado um bocado parada. Lancei um disco, em Outubro do ano passado. Dei uns concertos e depois disso não toquei durante uns meses. O último concerto que dei foi uma actuação surpresa numa festa da Coronado. Plano meu e do Zézé [Cordeiro, de Equations]. Nem a malta da Coronado sabia que eu ia tocar. Foi engraçado. Nem tenho composto músicas novas. Tenho umas ideias do que quero fazer a seguir, mas preciso de arranjar tempo e mais um compincha para me ajudar a meter a música como quero. E sim, falo com muito innuendo. O nome deste ficheiro era "Rudolfo tem sentimentos.jpg". Soube que tens algumas coisas a sair em breve. O que é que nos podes contar?
Para além de continuar a desenhar o Negative Dad, estou a desenhar neste momento uma BD escrita pelo Álvaro Silveira, dos dois desenhos a conversar. Enquanto isso vai andando lentamente, vou desenhando bonecada, ora ilustrações, ora BD para a VICE (fiquem à espera). Entretanto tenho mais uma série de projectos que vou desenvolvendo ou cenas que vou desenhando para zines, bandas e isso. O futuro é um bocado incerto naquilo que vou fazer ou lançar, porque estou sempre a trabalhar em mil coisas ao mesmo tempo e há algumas que acabam por ficar esquecidas. Fixe. Boa sorte, Rudolfo!