Usar robô para matar suspeito é uma mudança sem precedentes na ação policial
Quando, como e por que usar um robô em operação? Em que situações o uso de força letal pode ser usado remotamente?Crédito: Ron Jenkins/Getty

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Usar robô para matar suspeito é uma mudança sem precedentes na ação policial

Quando, como e por que usar um robô em operação? Em que situações o uso de força letal pode ser usado remotamente? Quais os protocolos?

Na última semana, autoridades em Dallas, nos Estados Unidos, utilizaram um robô do esquadrão antibombas para matar um de vários suspeitos envolvidos em uma série de atentados com rifles que deixou cinco policiais mortos. O ato é, até onde se sabe, inédito na história da polícia americana e levanta sérias questões sobre o uso de força letal remota pelas autoridades.

O robô foi utilizado após horas de impasse para alvejar Micah Johson, homem que a polícia acredita ter "disparado alguns dos tiros", de acordo com o chefe de polícia de Dallas, David Brown. O policial disse a jornalistas na sexta que, antes de usar o robô, seus comandados trocaram tiros com Johnson no segundo andar de um edifício-garagem. "Não vimos outra opção além de usar o robô e colocar nele um dispositivo que detonasse onde o suspeito estivesse", disse Brown. "Outras opções teriam exposto oficiais ao perigo."

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O chefe de polícia levantou aí uma questão séria com qual o exército americano já lidou antes: se um atirador está enfurnado em um prédio, devemos enviar uma pessoa ou um robô?

O tipo de robô utilizado nessas situações – e o utilizado em Dallas – não é autônomo; é usado geralmente para o descarte de bombas. Estes aparelhos foram transformados em armas, como já vimos no caso dos robôs do exército americano que receberam metralhadoras. (O exército afirma que as armas são usadas para atirar em dispositivos suspeitos de serem explosivos.). Nos EUA, robôs de descarte de bombas Remotec usado pelas autoridades receberam armas projetadas para detonarem bombas de forma controlada.

Para ter melhor ideia de como funcionam estes robôs (detalhe: não se sabe qual o modelo utilizado pela polícia de Dallas), assista a este vídeo do Motherboard. Legendas em português.

Peter W. Singer, especialista em tecnologia militar e guerrilha robótica da New America Foundation, comentou no Twitter que este é o primeiro incidente conhecido envolvendo a polícia local usando um robô para matar um suspeito. Singer contou que, nas guerras no Iraque e Afeganistão, soldados colocaram minas claymore a MARCbots de 8.000 dólares usando fita adesiva para transformá-los em máquinas de matar. Ele afirma que tudo indica que a Polícia de Dallas fez algo semelhante neste caso – improvisou ao transformar um robô em algo bem mais letal.

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Improviso ou não, as preocupações em torno do ocorrido refletem um debate que já ocorre há alguns anos: as autoridades deveriam ter acesso a drones armados ou a robôs armados? Em 2013, o senador do Kentucky Rand Paul fez um discurso de 13 horas voltado inteiramente para o uso de drones armados em território americano. No ano passado, Dakota do Norte se tornou o primeiro estado a legalizar o uso de drones não-letais para sua polícia.

"Quando as autoridades domésticas podem usar força à distância, talvez isso facilite demais para eles, e o resultado inevitável será o uso exagerado destas armas", disse Jay Stanley, analista de políticas sênior da American Civil Liberties Union em uma postagem enquanto Dakota do Norte considerava a aprovação da lei. "Quando os oficiais não estão fisicamente presentes, sua percepção da situação e seu julgamento sobre quando usar força é passível de erro e há maior possibilidade de outras pessoas serem feridas, bem como do uso excessivo de força."

Stanley também comentou que drones e outras armas remotas "aumentariam a militarização da polícia".

A habilidade da polícia em matar suspeitos remotamente também levanta questões sobre processos. Se um atirador está escondido em algum lugar sozinho, pode ser considerado uma ameaça iminente à vida? Há protocolos claros que definam quando um robô pode ser utilizado para lidar com um suspeito no lugar de uma pessoa? Quando o uso de letal força pode ser usado remotamente?

Brian Castner, colaborador do Motherboard e ex-técnico de descarte de explosivos do exército norte-americano, disse que o incidente em Dallas o deixa meio "incomodado". Castner, que participou de duas campanhas militares no Iraque desarmando bombas nas estradas, disse ter passado por situação semelhante lá, quando um robô foi utilizado para levar um explosivo e matar alguém. "Fizemos aquilo e ainda não sei se foi o certo."

Tradução: Thiago "Índio" Silva