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Fora de escala

Um espectáculo desproporcionado.

Quando pensares em anões, não penses pequeno. Podes enganar-te. É esta a lição que aprendemos com el chino torero na digressão que anualmente fazem em terras lusas. Se já sabíamos que os homens não se medem aos palmos, ficámos a saber que os toureiros muito menos. Um espectáculo entre o circo e a tauromaquia — alto lá! Não queremos ferir sensibilidades de um lado ou de outro — embora aos nossos anões toureiros não falta coragem, o animal que defrontam é um adversário à medida. Mas um novilho zangado contra 120 centímetros de homem não pode ser considerado brincadeira. Ou pode? Porque, de facto, tudo isto é montado como uma festa de bizarria em que o objectivo é a gargalhada e tudo acaba, sempre e invariavelmente, na mais incrível galhofa. Afinal, estes toureiros de palmo e meio são palhaços de corpo e alma. Afastem-se os aficionados, isto é circo e circo a sério — reminiscente das trupes livres que circulavam entre as vilas medievais, com um toque que nunca nos deixou esquecer Freaks, o filme de culto produzido, em 1932, por Tod Browning. Mas não tenham medo, porque esta gente está mesmo aqui é para brincar — embora às vezes não pareça. Quando este grupo ergue a sua tenda — uma praça de touros verdadeiramente portátil — o espectáculo está pronto a começar. Na proximidade com os artistas que se vestem debaixo das bancadas, as crianças deliram – afinal, estes são adultos à sua medida. E não acaba por aqui, porque el chino torero não é apenas a caricatura de uma tourada, mas uma mistura insólita de pequenos programas que misturam referências pop que até então nós imaginávamos inconciliáveis. Entre desastres simulados e movimentos desengonçados, a pantomina prolonga-se durante horas, casando anões mascarados de Mickey e Minie com o Twitty e outras personagens irreconhecíveis, mas sempre, sempre próximas de um desequilíbrio que forçava o público à gargalhada. Não é um espectáculo urbano, a nós pareceu-nos um batido multicultural com um travo sado-medieval, mas talvez estejamos demasiado afastados, porque os pequenos actores defendem bem o seu trabalho, e nunca desarmam. Juram gostar serem vistos através do prisma da diferença, como se fossem outra espécie — seres humanos, iguais a nós, capazes como nós — mas diferentes, muito diferentes. E é desta esquizofrenia como das proezas cómicas que produzem em palco, que extraem o riso da multidão que, sazonalmente, lhes permite percorrer o país com a sua feira de excentricidades e, feito não menor, ter seguro de trabalho e a segurança social em dia. No final concedemos; todos teremos os nossos problemas, mas poucos têm a coragem de pegar assim no touro pelos cornos.