FYI.

This story is over 5 years old.

cenas

Andei a deambular pela baixa do Porto: buracos, arrumadores e Get Set Festival

Está-se melhor num festival eclético do que numa disco cheia de gandins.

Foi numa tentativa quase punk de contrariar a morte da cultura não institucional na cidade do Porto que um grupo de amigos resolveu criar o Get Set, um festival cujo objectivo é dar visibilidade a artistas nacionais e internacionais de diversas áreas e promover o contacto entre todos. De certa forma, pode considerar-se que este é o Steven Seagal dos festivais porque, apesar de ser independente e da abundância actual de recursos económicos para este tipo de iniciativas, já conseguiu chegar à sua terceira edição. De 1 a 7 de Outubro, o festival dividiu-se por três espaços distintos: no antigo Cinema Trindade ocorreram as conferências, os workshops no Opo'Lab e as exposições e concertos na The House — uma casa degradada cuja curadoria ficou a cargo da Design Factory —, que foi palco de muitas obras trash no âmbito do tema desta edição, a beleza decadente. Adorava poder mostrar imagens das conferências, dos concertos e do ambiente cheio de pessoal altamente, mas a verdade é que nesses dias o meu heterónimo jornalístico esteve a hibernar. E como forçar este tipo de situações é tão improfícuo como obrigar um gajo a fazer um minete quando o que ele realmente quer é continuar a jogar GTA, mais vale não forçar e deixar as coisas rolarem naturalmente. Que foi o que aconteceu quando conheci o Michal, um designer industrial da Eslováquia, cujo teor de Jack Daniels na corrente sanguínea era tão notável como as cirurgias plásticas na cara do Pete Burns, o que o tornou numa espécie de poppers para a minha actividade jornalística. Enquanto estava a autoflagelar-me por não ter tirado fotos no dia anterior quando a casa esteve à pinha, passei pela instalação do colectivo dele, que desenvolveu aquele que é, provavelmente, o projecto com mais utilidade para a humanidade dos últimos anos: uma máquina fotográfica que dispara quando o pessoal começa a berrar. Como estávamos ambos entediados e a casa praticamente vazia, resolvi pedir-lhe para ser curador por uma noite e dar-me o parecer dele sobre a arte que nos circundava. A certa altura, ele reparou que eu estava com calças de fato de treino e achou que isso era uma cena mesmo artística. Eu disse-lhe que a escolha devia-se menos à arte e mais ao facto do meu pipi não apreciar estar apertado. No entanto, ele achou que a escolha não era suficientemente irreverente e mostrou-me como é que um verdadeiro criativo se deve apresentar: Mal lhe disse que estava a fazer uma reportagem para a VICE, ele foi a correr buscar parte do logótipo da fanzine VHS#, que estava a expor na sala em que nos encontrávamos, e resolveu utilizá-lo da seguinte forma: Segundo ele, isto era muito VICE, o que nos deixou um pouco inquietados, pois não imaginávamos estar tão associados à sodomia executada por cardinais feitos de cartão. Ou a qualquer outra coisa que ele estivesse a imaginar no seu delírio alcoólico. Às tantas, o Michal apreciou bastante uma escultura realizada por dois membros da VHS e dirigiu-se à mesma com o intuito de lhe apalpar o rabo. Neste momento eu disse “FODASSEEE, NÃAAAO” e ele, apesar de não perceber português, topou que as gajas do Norte abrem bem a goela. E foi assim que fiquei com uma pista de quem tinham sido os “gunas” que andaram a grafitar piças nos trabalhos do pessoal na noite anterior. No momento em que captei esta imagem, estávamos entre a instalação dos Rising Giant, uns grafiters londrinos, e da Joana Oliveira, uma miúda que faz uns stencils porreiros, e, de repente, o Michal começou a sentir um grande down. Confessou-me que era um gajo superficial e que tinha uma capa cor-de-rosa para um telemóvel de terceira geração que nem sequer era um iPhone. Entretanto, disse-me que era melhor irmos ver “o vídeo”, ao que eu perguntei: “Ah, a instalação de vídeo no rés-do-chão também é tua?” E ele: “Não… vamos ver o Ovídeo, o meu amigo romeno que está lá em baixo e tem a garrafa de whisky.” (Em comum com o Ovídio da Roma clássica — poeta e tal —, só mesmo a romaria de neurónios que o bagaço lhe estava a devastar.) E foi assim que deixei o Michal na companhia do gajo com nome de plataforma audiovisual, mas com cara de um Boris e de quem era bem capaz de me sugar o sangue. Depois disto fui apanhar um bocado de ar e aproveitei para ver a instalação do colectivo depA, que interpretei como um apelo à importância da arquitectura e da reconstrução urbana, muito a par do estado actual do centro cidade, repleta de paralelos esburacados, bulldozers e de trolhas circundados por cartazes que pretendem avisar os turistas que, para o próximo ano, quando eles não voltarem cá, isto vai estar mesmo altamente. Estava a curtir largo olhar para tijolos até sentir uma súbita chamada da natureza, consequência de todas as cervejas que me vi obrigada a beber para aturar o Michal, por isso corri como um galgo francês em direcção à casa de banho na tentativa de evitar que a minha bexiga explodisse. E foi neste momento que me deparei com a única desvantagem de fazer festivais alternativos em casas abandonadas. O que vale é que o rooftop tinha um canto que, além de ser alto spot para o pessoal dar uns amassos, também tinha umas plantinhas bem simpáticas. Rabos ao relento, ervas daninhas, coisas artísticas, eslovacos psicóticos e cenas decadentes. Obrigada, Get Set. E espero que tenham guito para uma quarta edição.