FYI.

This story is over 5 years old.

Música

Canções que salvam vidas: Sallim

Não queremos acordar deste sonho. A música de Sallim vem de um sítio onde a consciência flutua sem amarras. Um respirar devagar. Uma ausência de esforço. Um eco que nos faz querer começar outra vez.
Foto por Sara Rafael

Foto por Sara Rafael. Via.

Está a chover que se desunha. Está um calor infernal. É sexta-feira e estás em pulgas para a rambóia logo à noite e para fritares a molécula. Por outro lado, é sexta-feira, estás em pulgas para a rambóia logo à noite e para fritares a molécula, mas não tens guito. Não te apetece ir trabalhar. Não te apetece estudar. Vais é dar uma volta pela cidade. Espera, está a chover. Pronto, vais ver o mar, que está um calor diabólico. Alto, que isto está cheio de turistas e não dá para ir a lado nenhum. Nunca mais chega a Primavera! Primavera é que não, que é só alergias.

Publicidade

Um gajo nunca está contente. Se não é do cu é das calças. O que vale é que, como toda a gente sabe, há canções que salvam vidas (os Smiths cravaram-no a letras de ouro no cancioneiro pop para toda a eternidade). Semanalmente, e para que a tua vida ganhe um novo sentido e encontres a salvação possível, deixamos por aqui um desses bocadinhos de lírica e melodia (ou ruído e grunhidos selvagens, conforme a disposição) que têm a capacidade de, em pouco mais de três minutos, te salvarem. Se não a vida, pelo menos o dia.

Vídeo realizado por Lourenço Crespo.

Às vezes não te apetece acordar. À vezes apetece-te ficar só parado, sentado à janela a olhar lá para fora. Não é tristeza. Longe disso. É vontade de, simplesmente, contemplar um mundo que parece demasiado acelerado. Sallim trasnformou esse sentimento em música e essa música está toda em Isula, disco editado em Março pela Cafetra Records. Um disco de outro tempo. Sem tempo.

Não é tristeza. Longe disso. É uma espécie de melancolia boa. De guitarras que ecoam num quarto em que cresceste e te fizeste gente. Uma reverberação entre quatro paredes que te salva a existência. Francisca Salema, 22 anos e um universo inteiro de beleza a sair-lhe do peito. Um espelho perfeito de uma geração, a sua, que tem tudo e tantas vezes parece não ter nada.

A inocência deste "Deserto", com as suas guitarras dolentes e o teclado a segurar a melodia, agarra-nos pelos colarinhos e agita-nos a memória. Queremos lá voltar. Àquele momento em que descobrimos que somos capazes de tudo. Àquela altura em que a vida ainda agora começou. Hope Sandoval a pairar sobre nós. E não é porque o timbre de voz seja parecido, ou a forma de cantar seja semelhante. Porque não é. É, isso sim, pelos arrepios que sentimos na espinha, pela atmosfera inebriante que nos envolve e nos faz querer ficar ali.

Não queremos acordar deste sonho. A música de Sallim vem de um sítio onde a consciência flutua sem amarras. Um respirar devagar. Uma ausência de esforço. Um eco que nos faz querer começar outra vez. Salvarmo-nos e recomeçarmos.