FYI.

This story is over 5 years old.

Entretenimento

O terror como propaganda: o macabro departamento de publicidade do Estado Islâmico

Até à data, o Daesh e as suas organizações afiliadas lançaram vários ciber-ataques contra empresas e instituições. Alguns especialmente aparatosos.

"Hoje em dia, o Estado Islâmico está em alta". É com estas palavras chocantes que se expressa Lourdes Vidal, responsável pela área do Mundo Árabe e Mediterrâneo do Instituto de Estudos do Mediterrâneo de Barcelona (IEMed). E explica: "O Daesh (acrónimo de al-Dawlal Islamiyya fi al-Iraq wash-Sharm, o verdadeiro nome do Estado Islâmico) tem uma grande cobertura mediática. É por isso que muitos grupos islamitas radicais pequenos tentam associar o seu nome ao Daesh", diz à VICE News. Nos últimos tempos, para além do atentado terrorista à revista francesa Charlie Hebdo, produziram-se vários ataques por parte dos seus presumíveis representantes por todo o mundo, e muito especificamente nessa nova plataforma da guerra global que é a Internet.

Publicidade

"O ciber-espaço transformou-se num novo campo de batalha, unindo-se aos tradicionais terra, mar, ar e espaço", conta Alberto Hernandéz, director de operações do Instituto Nacional de Ciber-segurança (INCIBE). Álvaro Ortigosa, professor da Universidade Autónoma de Madrid e director do Centro Nacional de Excelência em Segurança (CNEC), concorda: "assistimos a uma escalada de 'ciber-escaramuça' ou 'ciber-guerra fria' que nos permite imaginar conflictos onde as agressões estão confinadas ao ciber-espaço".

Que peso tem o terrorismo neste cenário de conflicto camuflado? "As organizações terroristas usam muitas vezes o ciber-espaço em busca de notoriedade, através de propaganda e recrutamento", explica Hernandéz à VICE News. Normalmente, os ataques cibernéticos deste tipo de organizações são, ainda assim, pouco comuns: "Manobras como a suplantação de identidade, por exemplo, em perfis de redes sociais bastante mediáticas, ou a alteração do aspecto visual de um website para mostrar uma mensagem concreta, os chamados 'defacements'", aponta Hernandéz.

No caso do Daesh, em concreto, podemos considerá-los uma ameaça real para Espanha?: "Espanha não é um objectivo prioritário do Daesh, mas devemos permanecer em alerta", argumenta Juan Carlos Estarellas, especialista em yihad e salafismo e colaborador do Instituto Espanhol de Estudos Estratégicos. Segundo Estarellas, o perigo do Estado Islâmico para Espanha reside, principalmente, "nos 'elementos' que vêm do Norte de África que demonstraram uma vontade clara de recuperar o antigo al-Andaluz". Para o analista, este perigo real, que começou entre Agosto e Setembro de 2014, conduz a um novo cenário onde existe a possibilidade de eventuais ataques. Lourdes Vidal, no entanto, salienta que o Daesh representa "um risco global, mas principalmente para a própria região: as principais víctimas são os habitantes do Iraque e da Síria". Mas isso não exclui por completo os outros países: "Até agora, o Daesh tinha uma visão bastante local, mas existem por todo o mundo grupos que lhe prestam fidelidade, e que podem vir a ser perigosos", remata Vidal.

"Espanha, assim como outros países, sofre ciber-ataques de forma contínua", conta Alberto Hernandéz à VICE News, e acrescenta que "no ano passado, o INCIBE contabilizou 17.888 incidentes de ciber-segurança". No início de 2015, um ciber-ataque, presumidamente yihadista, afectou mais de 20.000 servidores de websites institucionais de Navarra. Hernandéz sublinha: "estes ataques têm um impacto limitado: por um lado produzem perdas económicas reais, sejam directas ou indirectas, mas por outro, não põem em perigo a vida humana, nem a nossa economia".

Até à data, o Daesh e as suas organizações afiliadas lançaram vários ciber-ataques contra empresas e instituições. Alguns especialmente aparatosos. Mas de momento, o cidadão comum raramente foi afectado. Há que temer um potencial ciber-ataque do Daesh a uma grande escala? "Um sistema informático invulnerável não existe, e no mundo da tecnologia de informação é mais fácil atacar que defender", explica Álvaro Ortigosa, que esclarece que o yihadismo islâmico "tecnicamente não está em primeira linha". Juan Carlos Estarellas segue-lhe o raciocínio: "Há uns meses o Daesh dispunha de uma infraestrutura imponente, com especialistas em informática com certa capacidade para lançar ataques, mas nas últimas semanas tem sofrido várias perdas. A probabilidade de um ciber-ataque de grande escala, tipo os da China, Coreia do Norte, ou Rússia, é muito baixa". Estarellas vai mais longe: "no plano informativo, e relativamente à segurança nacional, esta opção pode ser um bocado exagerada".

Mas o que é que deveria preocupar-nos, realmente, como cidadãos ocidentais? Lourdes Vidal não hesita: "O objectivo dos ciber-ataques, tal como o do atentado ao Charlie Hebdo, é a propaganda. Estas acções não procuram matar alguém em concreto, mas sim matar alguém e ser notícia na televisão", explica. Segundo Vidal, a finalidade destas acções têm pouco que ver com a ideologia concreta e muito mais com a imagem que os terroristas querem projectar: "A ideia é gerar uma sensação de vulnerabilidade e medo, o mesmo medo que se utiliza para justificar déficits democráticos e falhas da liberdade. Isto ocorre especialmente no mundo muçulmano… Mas atenção: também no Ocidente", conclui.