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Comida

O fim das ressacas

Um cientista britânico inventou o medicamento que promete acabar com as ressacas.
Phoebe Hurst
London, GB
Via Flickr

Se tudo o que entra também sai, a ressaca que tens depois daquela sexta-feira à noite, é tão certa quanto este adágio. Como se fosse uma sucessão de eventos naturais e lógicos que se repete ad infinitum e castiga a humanidade desde tempos remotos. É o ciclo da vida, ou uma cena assim do género, sei lá…

A menos que David Nutt, catedrático de psico-farmacologia no Imperial College de Londres e ex-assessor do governo britânico em matéria de drogas, faça algo para o evitar. No início deste ano apresentou dois novos fármacos que simulam a sensação de bebedeira sem os lamentáveis efeitos que a acompanham e que reduzem o impacto do álcool. O eterno dilema de se deves ou não beber mais um copo de vinho num domingo à noite quando ainda tens que lavar aquela camisa que queres usar no dia seguinte, foi finalmente resolvido.

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O primeiro dos fármacos milagrosos é o "Alcosynth", uma substância embriagante não tóxica e que causa o mesmo tipo de bebedeira feliz – enorme-demonstração-de-carinho-pelos-teus-amigos incluída – que o álcool provoca, mas sem vir acompanhada de ressaca, perda de controle, agressividade ou qualquer outro efeito secundário indesejado que massacra o teu fígado com um composto tóxico.

"Actua nas partes do cérebro que produzem os efeitos secundários agradáveis e não nas partes associadas aos maus efeitos", explica Nutt, na esperança que este substituto do álcool seja comercializado como uma "bebida alcoólica normal" e seja relativamente barato.

No entanto, existe uma certa controvérsia sobre os riscos do Alcosynth, um derivado da benzodiazepina que pertence à família do Valium. Há até especialistas que consideram mais fácil largar a heroína que esta tal benzodiacepina.

Nutt assegura que o Alcosynth não gera o mesmo síndrome de abstinência que o Valium e argumenta que "não interage com os receptores que causam a dependência às benzodiazepinas".

Quando pergunáamos a um porta-voz da Real Sociedade Farmacêutica do Reino Unido acerca dos riscos do Alcosynth caso fosse comercializado, disse-nos que "não tem informação suficiente para poder falar dos prós e contras do fármaco".

Não é a primeira vez que o trabalho de Nutt é posto em causa. Em 2009, o psico-farmacologista foi criticado por sugerir que o ecstasy pode ser tão perigoso quanto montar a cavalo.

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O segundo fármaco de Nutt foi baptizado como "Chaperone" (carabina) e pode reduzir os efeitos do álcool no corpo. Se tomarmos um comprimido antes de começarmos a beber, é impossível ficarmos bêbedos "até a um ponto de inconsciência total": por exemplo, já não correrías o perigo de fazer a cena triste e embaraçosa de pedir a "Single Ladies" ao DJ ou algo assim do género.

Se for comercializado, o comprimido servir-te-á para que a bebedeira da noite anterior passe o mais rápido possível e isso inclui evitar que conduzas bêbedo. De qualquer forma, Nutt adverte que o preço deveria ser elevado para evitar excessos.

Os fármacos de Nutt não deveriam ser vistos apenas como uma tentadora incitação às festas de fim-de-semana, até porque o catedrático evidencia o potencial do Alconsyth como possível tratamento para a dependência do álcool. "Espero que o alcoolismo desapareça enquanto as pessoas deixam de beber álcool", afirma. "Mas, antes disso, os alcoólicos podem usar o Alcosynth para reduzir o seu consumo".

E mesmo que o Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido (NHS) aprove o uso de medicamentos como o acamprosato – uma droga que afecta os níveis de ácido gama-aminobutírico (GABA) no cérebro – para prevenir a recaída de pessoas que tenham superado a dependência do álcool, existe ainda uma grande polémica em torno do uso de medicamentos para o tratamento do alcoolismo.

"Os medicamentos cumprem uma função importante para ajudar os alcoólicos ou bêbedos compulsivos", afirma Jackye Ballard, presidente executivo do Alcohol Concern. "Contudo, o maior problema que o Reino Unido (e outros países) enfrentam é que a própria cultura britânica promove a bebedeira – a todas as horas e em qualquer lugar -, de maneira que é difícil resistir à pressão mediática que incita o consumo de álcool". Por isso, muitos acreditam que a única maneira de reduzir este consumo excessivo é através de leis mais estrictas na venda e publicidade do álcool e não através da medicação.

Fármaco milagroso ou não, a verdade é que ainda é cedo para determinar o futuro do Alcosynth e do Chaperone. Enquanto isso, Nutt pediu a patente para 85 novos compostos químicos da família do Alcosynth e do Chaperone que esperam a aprovação da DrugsScience e da Fundação Beckley. Estima-se que os gastos legais e os dos ensaios clínicos dos produtos alcancem o valor de um milhão de libras e Nutt ainda tem que encontrar patrocinadores.

Mas, no fundo, até pode ser algo positivo. A sério que queremos experimentar um estado de pseudobebedeira sintética? Será positivo podermos continuar com o nosso estilo de vida hedonista e alcoólico sem sofrer consequências?

Se assim fosse, era espectacular.