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Música

Fui roadie do Peixe na noite do clássico de sábado

Da música ao futebol, em 90 minutos de Porto-Benfica.

Neste sábado fui roadie do Peixe no primeiro concerto acústico do seu novo álbum a solo, Apneia. Ser roadie de uma guitarra é altamente porque nos sobra muito tempo para falar de um sem número de coisas — como, por exemplo, um Porto-Benfica na penúltima jornada do campeonato. Foi a melhor coisa que podia ter feito, considerando que não arranjei bilhete para o Dragão. VICE: Peixe, fala-nos sobre o teu projecto a solo. Que concerto vou ver hoje?
Peixe: Hoje vou tocar na Verde Rubro, uma associação nova aqui no Porto. São três amigas que estão ligadas às artes plásticas e não só. É uma associação cultural. Estão a remodelar uma casa antiga no Bonfim. É uma associação com pouco dinheiro e estão a fazer as coisas como podem. São elas que andam lá a chapar massa. Mas é fixe a força de vontade! Ontem toquei em Coimbra, no Salão Brazil. Estava pouca gente por causa da Queima, mas foi fixe — por acaso curti. Estou a começar a sentir mais desenvoltura nas performances a solo, o que é bom. Tocar a solo é muito diferente. Eu queria ter essa experiência, mas preciso de rodagem. Sinto que estou a começar a ter resultados. No outro dia, no Passos Manuel, destavas a tocar com quem? O Edu (de Zelig) e quem mais?
Isso foi o Edu (Pluto/ Zelig) e o Nico Tricot (Red Wings Mosquito Stings/Foge Foge Bandido) que foram músicos convidados só para dois ou três temas. O grosso do concerto fui eu a solo. Mas estou a curtir de carago o Apneia — gosto mesmo de tocar a solo. Naquele momento, a nossa conversa foi interrompida por uma discussão acesa no trânsito. Cheguei a pensar que ia ter o meu primeiro confronto clubístico na cidade do Porto, mas não. Qual é o significado desta nova linguagem? Lembra-te que o pessoal da VICE nunca te ouviu na primeira pessoa…
Nem o pessoal da VICE nem ninguém, ou quase ninguém [risos]. No fundo é tentar conciliar a minha componente de compositor, o meu gosto pela composição e a experiência que tenho adquirido no projectos por onde passei e a música que fiz com o meu instrumento, que é a guitarra. Tentar compor para o meu instrumento. Tentar fazer música sozinho. E como funciona esse acto solitário? Depois de tantos anos em banda? Descansa, não vou estar a falar sobre os Ornatos ou os Zelig.
Mas podes falar… Naaa, não quero falar do passado. Este disco a solo surge pela necessidade da experimentação, mas há mais factores que influenciem este modelo?
Acaba por ser uma vantagem logística. Por exemplo, ontem fui tocar a Coimbra, já sabia que era a Queima das Fitas, foi uma coisa marcada à última da hora, já sabia que não ia estar muito público, no entanto fui e gostei de ir, mas se fosse uma banda já não dava [risos]. Os custos iam ser outros e era complicado. A esse nível logístico é uma vantagem estar sozinho, mas não foi por isso que decidi começar a escrever para guitarra. É só uma feliz coincidência. Entretanto, mil polícias no Estádio do Dragão e mesmo assim estacionámos à má fila. Já vimos vários jogos juntos — no estádio, na televisão… Antes de um concerto sofres de ansiedade por um clássico como o Porto-Benfica?
Que grande jogo! Que grande clássico! Mas não, a ansiedade é no concerto. O jogo deixa-me pouco ansioso. Achas que o Porto vai ganhar aquilo na boa?
Não… Eu agora dou pouca importância ao futebol. Se não tivesse o concerto se calhar sentia uma certa ansiedade de chegar a hora e ver o jogo e não sei quê, mas para já estou é preocupado com o concerto. Pareço um treinador de futebol a falar, não [risos]? “Isto é jogo a jogo” e para já é o concerto, só depois é que nos vamos preocupar com o jogo. Se tivéssemos de cruzar geneticamente o teu talento com um jogador do FCP, que monstro nasceria? Se tivéssemos de fazer um paralelo entre a linguagem musical e a tua carreira qual seria o jogador do FCP? Vá, tu primeiro e eu depois digo-te a minha escolha.
João Moutinho! Podes escolher um jogador qualquer da história do clube. De todo o sempre.
Pá, não sei. De sempre é difícil, não sei. Um jogador que passou por muitos clubes, que passou por muita coisa, teve experiências diferentes. Sei lá, não faço ideia. Diz tu. A minha sugestão é o Jaime Magalhães.
Porque começou a ficar careca a meio da carreira [risos]? Era uma das dicas, mas vou justificar. Para mim foi um dos melhores extremos do futebol português.
Pois foi. Era um jogador do carago. Foi um jogador virtuoso, mas sempre low profile. Muito semelhante à tua carreira. Acho que encaixa perfeitamente no teu perfil.
Eu gostava do Jaime Magalhães. Olha e prognósticos para o jogo? Nenhuma das equipas perdeu esta época.
Estive a pensar no campo das probabilidades e acho que o empate é a melhor escolha. Há três resultados possíveis e dois deles interessam ao Benfica. Se o Benfica ganhar é campeão. O Porto tem 33 por cento de hipóteses. Mas depois há a cena da equipa. Acho que o Benfica está bocadinho melhor do que o Porto. Eles hoje vão morrer em campo. Mas o que é que tu achas? Eu acho que o Porto ganha 2-1. O Porto está em crescendo e a ansiedade joga a nosso favor.
Se o Benfica não ganha nada este ano é hilariante e é bem possível que aconteça: Na Liga Europa, o Chelsea é melhor equipa, a Taça não sei… Com quem vão jogar a final da Taça de Portugal? Como verdadeiros treinadores de bancada debatemos as várias tácticas possíveis: 4x3x3, autocarro, Cardoso no banco. A conversa decorria ao aquecer da guitarra e da acústica da sala. Pergunta de futeboleiro: quem está mais afinado, Jorge Jesus ou Vítor Pereira?
Jorge Jesus. O Jesus é melhor do que o Pereira. És mesmo portista?
Não detesto o Pereira, mas falta-lhe carisma. O Jorge Jesus é um gajo de garra, e no seu português errado, o que diz faz sentido. O gajo não é burro e percebe de bola. E consegue motivar os jogadores. É um líder. Essa é a parte mais difícil de ser treinador. Aquele cabelo impõe respeito! Ainda há a tradição da Playstation e jogos a bola no backstage? Há muito futebol nos bastidores dos concertos?
Não sei. Nós com os Ornatos andávamos sempre com uma bola, agora já não. Com os Zelig já não usávamos nada disso. Era mais comer uns petiscos. É o mal de tocares sozinho. Durante o concerto o Peixe parou três vezes para respirar e ondulou pelos temas do seu primeiro álbum a solo, introduzindo ainda uma versão da "Verdes Anos" do Carlos Paredes. Depois do apito final, liguei-lhe. Nunca o termo apneia fez tanto sentido. Noventa minutos sem respirar e no final o momento da explosão. Como é que está esse coração?
Fiquei mesmo contente. Foi demais. Mas estou com pena do Benfica, parece a cena das tragédias cómicas. A imagem do Jesus a ajoelhar-se é incrível, mas ainda não está nada ganho. Vai ser fodido com o Paços de Ferreira. Este ano o Benfica se calhar não mete a mão no prato.